Cena Política

As reações de Lula à Argentina e ao Peru mostram que só saberemos o que ele pensa de verdade em janeiro

Presidente eleito do Brasil reclamou da condenação da vice argentina, mas não encontrou meios para defender o colega peruano que tentou um autogolpe.

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Igor Maciel

Publicado em 08/12/2022 às 12:38 | Atualizado em 08/12/2022 às 12:42
Análise
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Quase no mesmo dia, crises na América do Sul, em países com presidentes de esquerda, obrigaram Lula (PT) a se pronunciar.

Na Argentina e no Peru, os acontecimentos vitimaram aliados dos petistas brasileiros. Mas, as reações diferentes do presidente eleito do Brasil comprovam que na história sobre o “copo estar meio cheio ou meio vazio”, tudo depende do tamanho da sede de quem o segura.

A vice-presidente Cristina Kirchner, da Argentina, foi condenada a seis anos de prisão por corrupção, num processo legal, que observou bem a legislação com todos os trâmites necessários.

Nesse caso o presidente eleito brasileiro teve a chance de se solidarizar com a amiga porque também foi condenado e preso por aqui e era uma forma de mostrar que há uma perseguição à esquerda. Lula até aprendeu uma palavra nova para usar nesses casos, ensinada provavelmente pelo seu advogado e futuro ministro do STF, Cristiano Zanin: Lawfare.

Lawfare é "usar o Direito como instrumento de guerra política". Law é lei, em inglês e Warfare significa guerra.

Depois que aprendeu esse termo, Lula resolveu que todo uso da lei com o qual não concorda é “Lawfare”.

Serviu para Kirchner, mas não serve para Castillo.

Não funciona por enquanto quando se trata de um autogolpe, como o que quase aconteceu no Peru. Porque a crise peruana foi, basicamente, uma realização de todas as ameaças que os petistas diziam que o Brasil vivia com Bolsonaro e que, por aqui, nunca vingaram.

A diferença é que, lá, o autor do golpe foi um colega presidente de esquerda, de uma mesma vertente sindicalista. Mesmo assim, entre a solidariedade e a chance de mostrar, no Brasil, que o bolsonarismo é um risco real, com o exemplo de outro país, Lula foi na segunda opção e condenou a atitude de Castillo. 

O peruano tentou dissolver o Congresso. O problema é que, creiam, diferente de Kirchner com sua corrupção, Castillo tinha apoio da Constituição Peruana para fazer o que fez, num país em que as instituições foram enfraquecidas nos últimos 30 anos por autogolpes e escândalos de corrupção, desde Alberto Fujimori. É uma maluquice, comparando com outros países, mas dissolver o Congresso por lá é algo bem simples.

Caso Lula já estivesse diplomado e empossado, talvez defendesse o direito de Castillo usar o texto constitucional do país dele e ainda invocaria outro termo que aprendeu há algum tempo quando precisou defender ditaduras na América Latina: a “autodeterminação dos povos”.

Para quem não lembra, é esse o argumento que ele costuma usar quando diz que não pode condenar publicamente Daniel Ortega, ditador da Nicarágua, da esquerda sandinista.

Se Bolsonaro não fosse ainda presidente, Lula diria que o Congresso praticou Lawfare contra Castillo. E que não podia condenar o colega para não ferir a "autodeterminação" dos peruanos.

Aguardemos, então, pelo mês de janeiro, pra saber o que Lula realmente pensa. Por enquanto, está difícil descobrir.

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