Cena Política

Consortes são livres para atuar no serviço público, só não podem ser fonte de tanta crise

Confira a coluna Cena Política desta terça-feira (25)

Igor Maciel
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Igor Maciel
Publicado em 25/04/2023 às 0:01
RICARDO STUCKERT
Lula e Janja - FOTO: RICARDO STUCKERT

Se você quiser desestabilizar a independência de alguém, basta isolar esse alguém de sua rede de apoio. Com o tempo, a pessoa olha para os lados e não encontra os amigos de antes, busca apoio e vai depender apenas de você. É cruel e, não por acaso, é considerado um comportamento abusivo.

A primeira-dama não deve estar fazendo de propósito, mas o resultado tem sido esse na relação de Rosângela da Silva com o presidente Lula (PT), segundo se comenta nos bastidores do Partido dos Trabalhadores. Há petistas de graduação elevada muito preocupados com a influência que Janja tem mantido sobre o marido. Num cargo como o de Presidente da República, é importante conviver com visões diferentes e conselheiros de repertório diverso.

Luiz Dulci, Aloizio Mercadante, Franklin Martins e Paulo Okamoto não são o que se pode considerar como um grande conselho. A ausência de qualidade técnica, a visão de mundo ultrapassada ou os interesses particulares de poder podem depor contra alguns ou todos eles em variados níveis. Mas eram repertórios diversos, com ambições diversas que dialogavam com o líder petista. Muitas vezes serviam de freio de arrumação e eram as pessoas que orientavam Lula para que ele não falasse bobagem (o que vem acontecendo com frequência). E todos foram afastados da convivência direta com o presidente, segundo alguns petistas, por Janja.

Quem não agrada a esposa de Lula, é afastado do presidente. A primeira-dama tem atuado nos bastidores isolando pessoas de quem ela não gosta do convívio presidencial e impondo suas versões sobre decisões de governo até quando se tratam de assuntos ministeriais.

Semanas atrás, alguns jornais chegaram a dar manchete com declarações da primeira-dama sobre a taxação de compras de até U$ 50,00 em sites chineses, anunciada pelo ministério da Fazenda. “Janja esclarece que a taxação de importados não será para os consumidores”, dizia um periódico, ignorando que sobre assuntos oficiais a primeira-dama não “esclarece” nada.

Os consortes das pessoas que ocupam a chefia do Executivo, no Brasil, não são eleitos e não têm função definida pela Constituição. Primeiras-damas e primeiros-cavalheiros não estão definidos na função pública e não têm atribuições formais. É exatamente por isso que não recebem salários. É importante que elas tenham papel ativo, desde que não interfiram na atividade de quem foi eleito democraticamente para governar.

Ruth Cardoso participou do programa “Comunidade Solidária” no governo FHC, cujo objetivo principal era combater a extrema pobreza; Marisa Letícia era engajada nas campanhas políticas de Lula; Marcela Temer foi embaixadora do programa “Criança Feliz” e Michelle Bolsonaro atuou em causas sociais relacionadas às pessoas com deficiência e inclusão social.

Janja pode ter um papel até mais ativo do que todas elas, pode atuar com mais ênfase se quiser. Ela tem o direito de contribuir com o governo do marido e ser auxiliada nisso, desde que os projetos sejam de interesse público. Ela só não pode gerar crises nem monopolizar o aconselhamento presidencial, muito menos utilizando o que tem utilizado, que é o termômetro de sua própria bolha das redes sociais.

Sim, Janja influenciou a decisão de Lula que, segundo fontes nos bastidores petistas, desistiu de taxar os sites chineses quando “foi informado” de que a medida era impopular nas redes.

Uma decisão que poderia render R$ 8 bilhões para a União, fortalecer a produção da indústria nacional e ajudar na geração de empregos, pode ter sido tomada baseada na impressão da primeira dama sobre suas redes sociais e não apoiada nos necessários relatórios técnicos do Ministério da Fazenda?

Se houver alguma verdade nessas afirmações, é preocupante e gera a necessidade de perguntar: se Lula escuta Janja, quem Janja escuta? Porque alguém precisa orientá-la nesse governo.

Amigo quem?

O ex-ministro, o general G. Dias é um caso desses de amizade que vira fumaça por necessidade política. Era um dos militares em quem Lula mais confiava, considerado um amigo próximo e com quem já trabalhou nas gestões anteriores. Depois de ter se demitido para preservar a gestão, a tendência é que Dias seja transformado em “bolsonarista desde criança” durante a CPI para livrar o governo da narrativa de que “fez corpo mole no dia 8/1 querendo lucrar politicamente”.

Tem boleto

Nas “comemorações” pelo empréstimo de R$ 2 bilhões que a gestão de João Campos (PSB) conseguiu garantir para o Recife, é muito importante não perder de vista um fator que integra a natureza de todas as operações de crédito: alguém precisa pagar. E esse alguém é o contribuinte. Paulo Câmara, quando governador, passou bastante tempo pagando contas que haviam sido feitas em gestões anteriores. Não existe almoço grátis.

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