Pouca coisa é mais traumática do que a expectativa frustrada sobre uma promessa aguardada. E essa decepção nos leva aos limites da razão, da lógica como reação. Em resumo, ao esperar muito por uma promessa não cumprida, costumamos nos tornar radicais. Prometa um passeio a uma criança, algo divertido, e na hora de cumprir, experimente dizer que não vai. Você ouvirá choro e o choro é a criança expressando sua frustração de maneira radical.
Quando ficamos adultos, choramos menos diante das frustrações, mas continuamos nos revoltando com expectativas não cumpridas pelos outros. Quando um eleitor vai às urnas, ele está indo com um roteiro na cabeça, baseado nas promessas feitas durante a campanha eleitoral.
Não é gratuito que a palavra “esperança” seja tão utilizada pelos estrategistas políticos. No Brasil, “A esperança venceu o medo” era o slogan da primeira vitória lulista em 2002. Voltaremos a falar nisso depois.
Essa lembrança vem à cabeça exatamente porque o resultado da eleição para o Conselho Constituinte do Chile deu à extrema-direita uma vitória que chamou a atenção por lá, no meio de um mandato de um presidente de esquerda que sofre com baixa popularidade.
Gabriel Boric foi eleito numa votação apertada, em 2021, vendendo essa tal “esperança” à população que ia às ruas protestar contra a Constituição do país, um texto da época do ditador Pinochet.
Num ambiente de contestação, Boric, um líder de esquerda, é eleito para mudar o país e garantir uma constituição progressista, mas a população, após dois anos, elege um colegiado constituinte de extrema-direita que defende um texto conservador muito parecido com o que já existe. O que aconteceu em 24 meses? Decepção.
Além da constituição, Boric prometeu o que não podia entregar, reformas que não dependiam somente dele e uma melhora nos números da economia que não se realizou. Como resposta, os eleitores votaram na oposição chilena.
Quando a “esperança venceu o medo”, em 2002, Lula prometia um governo pautado em correção e ética, já que o PT vivia de apontar o dedo para o mundo político, acusando-o de "corrupto". Eis que esquemas de corrupção foram se sucedendo na gestão petista, Mensalão e Petrolão, mais a atuação da Lava Jato, feriram de morte a imagem quase santa que alguns tinham do grupo comandado por Lula.
A revolta dos brasileiros com as expectativas frustradas pelo PT só eclodiram nos movimentos de rua a partir de 2013 e culminaram com a eleição de Bolsonaro (PL) em 2018.
Por que demorou tanto até que a frustração tivesse consequências? Bom, quando você frustra uma criança, ela chora. Quando isso vai se repetindo ao longo dos anos, a frustração vai acumulando e só depois você terá um adolescente problemático e um adulto que vai gastar muito dinheiro com terapia.
A revolta com as frustrações que o PT impôs aos brasileiros levaram à eleição de Jair Bolsonaro anos depois. Pessoas frustradas fazem bobagens. Bolsonaro foi uma bobagem tão grande que fez o Brasil dar outra chance a Lula.
Mas, o que a eleição no Chile deveria ensinar ao atual governo do petista e nos fazer prestar mais atenção?
O mundo, numa comprovação das teorias do filósofo Zygmunt Bauman, está se tornando cada vez mais líquido. Tudo muda mais rápido, as frustrações eclodem mais rápido, as revoltas se intensificam em maior velocidade e as bobagens podem ser cometidas com muito mais frequência como reação a essa frustração.
Os chilenos passaram décadas para se revoltar contra a constituição de Pinochet, votaram em Boric para mudar tudo. Mas em apenas dois anos, frustrados, votaram numa constituinte que não vai mudar quase nada.
Os brasileiros passaram 16 anos para se revoltar com o PT, votaram em Bolsonaro para que ele mudasse tudo, ficaram frustrados e, em apenas quatro anos, elegeram Lula de novo.
Esperança, frustração e revolta se sucedem com velocidade muito maior agora do que há alguns anos. As pessoas estão menos pacientes e mais reativas.
Lula foi eleito, outra vez, com a temática da “esperança” e sua popularidade ainda não decolou. Ele ainda não conseguiu entregar quase nada do que foi prometido. A economia segue ruim.
Num mundo, pelo que mostra o Chile, cada vez mais líquido, quanto tempo o petista ainda terá até que se perca completamente a paciência com ele?
Se a eleição fosse este mês, Lula seria reeleito?
Sobre o medo e o crime
Numa entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, ontem, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira (PT), desconversou duas vezes ao ser perguntado se havia algum tipo de divisão dentro do MST, com um grupo mais próximo ao governo Lula e outro que não apoia o petista. A pergunta foi feita no início e no fim da participação e não foi respondida.
Teixeira fez questão de dizer, também, que a culpa das invasões que aconteceram nos primeiros meses do ano em terras produtivas eram fruto da falta de atenção que o movimento recebeu da gestão Bolsonaro, mas que já se encerraram.
Se eram ignorados por Bolsonaro e agora não são, por que resolveram invadir terras produtivas só no governo Lula? O ministro deu a entender que antes eles tinham medo da reação dos fazendeiros, dizendo que “Bolsonaro incentivava a violência contra eles”.
É mais ou menos como um funcionário que aguenta todos os malfeitos e o assédio moral de um gerente, mas não faz nada contra isso. Ele não reclamava por medo de perder o emprego. Até que o gerente "mau" é demitido e substituído por outro, com formação humana exemplar, que o trata bem e o respeita. Aí o funcionário denuncia o novo gerente, o "bom", na Justiça do Trabalho.
Faz sentido? Nenhum. Mas deve ser o argumento a ser utilizado na CPI do MST, na Câmara Federal.