Cena Política

O futuro da política depende de refundar a política e isso só é possível com Educação

Confira a coluna Cena Política deste sábado (21)

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Cadastrado por

Igor Maciel

Publicado em 20/10/2023 às 21:00
Análise
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O Rec’n’Play, no Bairro do Recife, foi o palco para o lançamento do Manifesto do marketing da Política, na última sexta-feira (20). A ideia é assinada pelo professor e cientista Silvio Meira com a jornalista Rosário Pompéia. Aqui é importante explicar que, para além de suas vestes curriculares, Meira é um provocador e Rosário se assemelha a um gerador de energia. Juntos, criaram um documento para o marketing do futuro que atende às dificuldades da sociedade do presente, mas não será bem digerido dentro de um sistema político com dificuldades para entender a velocidade com a qual esta sociedade vem se modificando.

2013 do futuro

O próprio Meira citou isso na apresentação do manifesto. Os políticos ainda não entenderam os movimentos de 2013. As manifestações daquele ano foram o resultado não somente de uma insatisfação, mas da velocidade com que as informações circulam e da volatilidade das opiniões e do impacto delas. Apesar disso, segue-se fazendo eleições da mesma maneira. Segue-se vendendo o candidato como um herói e comprando o voto com promessas que não dialogam com a sociedade, mas com a expectativa de saciedade individual dos eleitores.

Palhaço

Depois de tudo isso, ainda assim, ninguém entendeu a eleição de Bolsonaro (PL), por exemplo. Antes mesmo de 2013 ou 2018, ninguém entendeu a eleição de Tiririca com 1,3 milhão de votos. Foi em 2010. Sim, estamos falando de 1,3 milhão de pessoas que votaram num palhaço de profissão, cujo slogan era “Pior do que está não fica, vote Tiririca” e ninguém entendeu o que estava acontecendo com o país.

Sinais

É verdade, os sinais estavam todos lá, para quem quisesse ver e ouvir. O que Silvio Meira e Rosário Pompéia fazem de mais importante com o manifesto é alertar, acender um farol e sinalizar aos donos desse mar chamado República que a Democracia está em risco porque os pequenos barcos estão cada vez mais conectados, com velocidades cada vez maiores por causa da tecnologia e formam frotas gigantescas, capazes de mobilizar contingentes para fortalecer ou destruir as estruturas que sustentam esse oceano.

O que vem por aí

Se não houver orientação, se os barcos não começarem a ter espaço para navegar, se não forem ouvidos, Tiriricas, Bolsonaros e manifestações iguais àquelas de 2013 podem se tornar o menor dos nossos problemas daqui para frente.

Diagnóstico

Eles estão corretos no diagnóstico. Os 16 sinais do colapso da política, no documento lançado, vão dos aspectos personalistas das eleições, do cidadão tratado como mercadoria eleitoral ordinária, da ausência de uma regulação que controle o fenômeno da consonância cognitiva forçada, origem das famigeradas fake news, passando pela desconexão das pesquisas políticas com a fluidez das opiniões e chegando à decomposição, quase putrefação, da representatividade dos partidos políticos e dos movimentos sociais estabelecidos, basicamente por causa da captura destes por aqueles.

Quem faz

É preciso dizer: no manifesto, a análise dos fatores que contribuem para a erosão da democracia é irretocável. O problema para a boa manutenção democrática do país, é que todas essas questões são bem difíceis de resolver sem uma grande participação do poder atualmente estabelecido. Sim, a maior parte dos problemas dispostos só poderia ser resolvida com a forte atuação daqueles que, no curto prazo, seriam prejudicados pelas mudanças.

Raízes

Todos os problemas descritos por Meira e Pompéia têm raízes que só podem ser arrancadas com mudanças na Conduta Ética, mudanças na Legislação e/ou mudanças nos processos. Quem pode mudar os processos de marketing político são os que, hoje, fazem campanhas. A mudança da fórmula, no ambiente de hoje, dificilmente venceria uma eleição no modelo brasileiro. O modelo precisaria mudar e para isso a Legislação teria que ser alterada (o voto distrital surge imediatamente à mente), mas os políticos com poder para mudar as leis vão querer mudá-las? Há um nó difícil de resolver.

Ética

O aspecto da conduta ética é outra dificuldade, não por falta de vontade. Todo mundo gostaria de ser ético, mas isso depende da formação de uma base educacional e cultural ainda indisponível e distante de se tornar realidade neste país. O manifesto é rico em detalhar soluções para cada um dos problemas apresentados, mas essas soluções são viáveis apenas se as raízes éticas, técnicas e legais forem enfrentadas primeiro.

Educação

Isso em nada, porém, diminui a importância do manifesto. Na apresentação do documento, nem Sílvio Meira e nem Rosário Pompéia tiveram dificuldade em admitir que nada pode se resolver nesse aspecto sem um grande reforço educacional. Se não for possível modificar a educação e a cultura da população para que ela fique menos suscetível às armadilhas dos roedores que atacam os pilares da democracia, seria impossível modificar a política ou a sociedade.

Mudança

Na apresentação, ambos deixaram claro que o manifesto é aberto e está sendo posto para receber sugestões e contribuições em momentos como o de ontem, durante o Rec'n'Play. Esperamos que esta coluna contribua também.

Hoje, somente a política pode refundar a política para atender à sociedade. Quando sociedade e política se confundirem através da educação, é quando as coisas começam a mudar. A provocação de Meira e Rosário é sacudir o sistema para nos fazer enxergar isso. E o fazem muito bem.

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