Cena Política

A patetice só foi patetice por causa das instituições. E isso vale reflexão

Confira a coluna Cena Política desta sexta-feira (9)

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Igor Maciel

Publicado em 08/02/2024 às 20:00
Análise
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Todas as informações apresentadas até agora pela Polícia Federal na operação que teve como alvo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu entorno, são, numa observação rápida, de um amadorismo tão elementar que é difícil fugir da impressão de que fomos governados por patetas.

O que leva a essa primeira impressão é o teor das conversas, o descuido de se terem deixado filmar e os bate-papos por aplicativos de mensagem que não utilizavam mensagens cifradas e nem nada disso. Basta ler para entender sobre o que eles estão falando. Se o Brasil depender dos “agentes secretos” de Bolsonaro para viver, estamos perdidos.

Mas, atenção, nós só podemos chamar de patetice agora porque deu errado. E só deu errado porque as instituições estavam fortes.

Método

O problema real nas revelações é que estivemos, sim, muito perto de um golpe de estado bizarro, baseado em teses malucas, como já temos alguns exemplos na América Latina. A rota para uma tomada de poder teve método, teve planejamento e cumprimento de metas.

Não deu certo porque a competência dos envolvidos não é lá grande coisa e porque as instituições, mesmo sem ter as informações que se tem hoje, reagiram por instinto.

Salvos pelo instinto

O instinto institucional foi essencial no processo, porque nas primeiras tentativas de construção do argumento de que as urnas não eram seguras, houve reação forte. O roteiro, pelo que se viu até agora, era bem simples. Havia um apelo sistemático para caracterizar as urnas como “indignas de confiança”. Depois, haveria uma intervenção militar para “manter a ordem”, além da consequente prisão de Alexandre de Moraes, substanciada pela ideia criada no imaginário popular de que a eleição era uma fraude comandada por ele.

Pelo que se viu dos diálogos, a discussão entre eles era se a ação aconteceria antes ou depois da eleição. Dependia de como o nível de desconfiança sobre as urnas estaria.

Instituições

Mas a confiança no processo eleitoral foi mantida, graças às instituições do Judiciário, setores do Legislativo e da imprensa.

Na última intervenção militar que aconteceu nestas terras, o Judiciário sofreu, o Legislativo foi fechado e a Imprensa foi perseguida. As cicatrizes, por maiores que sejam os interesses pessoais de hoje, geraram reflexos e reações imediatas.

Escolados

O Congresso tratou de mostrar a Bolsonaro que ele não teria apoio para questionar as urnas. O Judiciário tratou de explicar a segurança do processo e a maior parte da imprensa preocupou-se em não embarcar nas teses, que tinham cheiro de golpe desde sempre.

Visto agora, todo esse roteiro parece pateta, mas podia ter dado certo, não fosse o amadurecimento institucional.

Mais fortes

Então, antes de celebrar a estupidez alheia, é preciso lembrar mais uma vez como são importantes as instituições que formam esta república e como elas devem ser respeitadas acima de qualquer interesse pessoal ou partidário, agora e sempre.

Que haja a punição adequada para os patetas políticos e que possamos sair fortalecidos.

Porém

Mas que sirva de recado para todos aqueles que ocupam ou virão a ocupar cargos públicos e se utilizam das instituições com o objetivo de enriquecer às custas do contribuinte, para todos os que praticam corrupção em todos os níveis ou os que bebem dos benefícios dos cargos passageiros defendendo seus políticos de estimação por interesse ou por simples torcida descompromissada de consequências: se um dia as instituições não forem fortes o suficiente para resistir a uma dessas patetices ditatoriais, a culpa será de vocês.

Avenida dos patetas

Se um dia a imprensa não tiver credibilidade porque dizia coisas com as quais você não concordava, mesmo que sejam duras verdades.

Se um dia o Legislativo estiver tão enfraquecido ao ponto de não conseguir impedir arroubos autoritários porque seus deputados e senadores pensaram apenas em seus ganhos pessoais e esqueceram o Brasil.

Se o Judiciário passar da conta, abusando de suas prerrogativas para atender interesses pessoais. Se tudo isso acontecer, no futuro, será uma avenida aberta para os ditadores.

Mesmo que sejam patetas.

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