Cena Política

A Guerra Fria pernambucana nas eleições de Caruaru e do Recife

Confira a coluna Cena Política desta quarta-feira (20)

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Igor Maciel

Publicado em 19/03/2024 às 20:00
Análise
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O tempo é um elemento essencial para uma batalha. Colocar as armas em campo antes ou depois do tempo provoca uma alteração nas engrenagens que pode desencadear derrotas em disputas antes dadas como vitórias certas.

E o mais importante é que, mesmo fazendo tudo no tempo certo, após a partida é importante não titubear. Quando avançar, avance sem olhar para trás.

Capital

No Recife, o prefeito João Campos (PSB) enveredou por algumas situações que podem lhe causar problemas no futuro, como a brincadeira com o cabelo no carnaval, que divertiu mas virou motivo de ironia e comparação com os problemas reais da cidade.

No geral, entretanto, Campos está aguardando muito bem o tempo certo antes de se lançar à reeleição e faz isso sem deixar de articular filiações e alianças.

Caruaru

Mas o tempo que vale para o Recife é outro em Caruaru, onde se diz que há uma antecipação da eleição de 2026. Lá, no Agreste, o prefeito do Recife resolveu se apresentar apoiando a candidatura do ex-prefeito José Queiroz (PDT). Todo o anúncio foi feito em tom de provocação e chamou a atenção por ter sido realizado na terra da atual governadora, Raquel Lyra (PSDB).

O evento foi um sucesso, atraiu a atenção do mundo político no estado e alavancou a repercussão da candidatura de oposição ao grupo de Raquel.

Tempo

A dificuldade de Queiroz é o tempo. Caruaru tem uma peculiaridade que ganha força em anos eleitorais: é chamada de “Maior e melhor São João do mundo” e pode fazer ou derrubar prefeitos. O atual gestor, Rodrigo Pinheiro (PSDB), sabe disso e programou o evento para durar 72 dias este ano.

Os adversários fizeram uma largada de campanha (mesmo que se chame pré-campanha) às vésperas de uma festa que está programada para durar quase dois meses e meio, até o final de junho, às vésperas das convenções.

No campo de batalha, depois de avançar, não pode parar. A equipe de José Queiroz terá um desafio ainda maior, depois do evento com João Campos, para mantê-lo em evidência competindo com o São João da cidade até as convenções.

Réplica

Além de tudo, o evento recente de Queiroz com o prefeito do Recife, tido por muitos como provocação à Raquel Lyra, teve uma resposta considerável dela. A governadora anunciou seu apoio ao atual prefeito, poucos dias depois, em um evento com mil e quinhentas pessoas, um bloco com 11 vereadores (metade da Câmara local) e a impressão de que finalmente há uma coesão entre o Palácio do Campo das Princesas e a determinação de Rodrigo Pinheiro (PSDB) para disputar um novo mandato.

A vantagem é que a réplica aconteceu pouco antes do principal evento da cidade, no qual ele estará sob holofotes. A “tréplica” de Queiroz terá que esperar até julho.

Risco de Raquel

Mas, outra vez, vale o aviso: quando avançar, avance. Ao se jogar na campanha de Caruaru, Raquel Lyra assumiu para si um risco gigante. Ao dizer que o PSDB é o partido que mais vai crescer em Pernambuco nesta eleição e que “crescerá tendo Caruaru como referência”, a governadora embarca na campanha sem direito ao retorno. Será preciso garantir a estrutura da campanha e marcar presença com regularidade nos eventos.

Para Rodrigo Pinheiro, ganhar por um voto apenas já o fará prefeito por mais quatros anos. O risco para ele é bem menor.

Para Raquel, qualquer vitória em Caruaru que não seja minimamente estrondosa pode prejudicar ela para 2026. Será a governadora que “não conseguiu eleger seu candidato nem em sua base eleitoral” ou que sofreu para "ganhar na cidade em que foi prefeita".

É um argumento forte para a militância adversária e o PSB vai saber utilizar isso.

O risco de João

A situação é bem parecida com a do próprio João Campos no Recife. A vantagem do socialista na capital é tão expressiva nas pesquisas que se não conseguir vencer na primeira votação e for para o segundo turno, mesmo sendo reeleito, o triunfo ficará manchado e ele terá dificuldades para ser candidato em 2026.

Guerra fria pernambucana

A eleição municipal de 2024 se encaminha para um cenário curioso. Raquel lançará um candidato desafiando as vantagens de João no Recife e João apoia um candidato que desafiará as vantagens de Raquel no território dela.

Quem viveu o período da Guerra Fria entre EUA e URSS lembra como isso funciona. Americanos e soviéticos se enfrentaram no Vietnã e no Afeganistão, por exemplo, mas nenhum tiro soviético foi disparado em Washington. E nenhum tiro americano foi disparado em Moscou.

Até 2026, muita coisa pode acontecer na “Guerra Fria Pernambucana”. Pode inclusive não resultar em uma guerra direta, como aconteceu com o fim da URSS.

Mas, tal como aconteceu no conflito internacional que mudou a política do mundo, a política pernambucana não será a mesma depois desse embate.

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