Cena Política

O governador alternativo de Lula e a estratégia política na crise do RS

Confira a coluna Cena Política desta quinta-feira (16)

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Cadastrado por

Igor Maciel

Publicado em 15/05/2024 às 20:00
Análise

Mesmo com a tragédia localizada em um só estado, as enchentes do Rio Grande do Sul já podem ser consideradas a “pandemia” de Lula (PT) do ponto de vista político. Bolsonaro (PL) poderia ter sido reeleito sem nenhuma dificuldade caso tivesse levado a crise que enfrentou a sério, caso tivesse sido minimamente humano e tivesse se guiado pela ciência naquela época.

Lula está fazendo diferente.

Republicano

O sul do Brasil, hoje, é a região em que o atual presidente petista tem seus maiores índices de rejeição. Até o momento ele está sabendo aproveitar bem a oportunidade política que o desastre ambiental proporcionou.

Para ajudar ainda mais no intento, o governador do Rio Grande do Sul é um de seus maiores opositores e era considerado um pré-candidato à presidência em 2026. Ajudá-lo ainda dá a Lula ares de “grande republicano”.

Estratégia

O jeito do petista para fazer as coisas contém boas pinceladas de humanidade, o que já o diferencia do antecessor. Mas há um conteúdo forte de estratégia política também.

Num primeiro momento, diferente do que fez Bolsonaro na pandemia, quando entrou em guerra com os governadores do Nordeste, Lula apoiou sem medida o governador adversário. Mobilizou efetivo das forças armadas, levou uma caravana de ministros para visitar o palco da tragédia, conseguiu destravar e anunciar bilhões de reais para o suporte às vítimas e a reconstrução.

Até então, tudo em parceria com o governador Eduardo Leite (PSDB), evitando qualquer crítica dele ao Governo Federal.

Na hora do cheque

Mas, agora, quando o dinheiro está prestes a começar seu fluxo real para as ações, surpreendeu o próprio governador gaúcho anunciando um tipo de “governador alternativo”. Criou um novo órgão, com estrutura de ministério, específico para cuidar da reconstrução do Rio Grande do Sul, instalado no estado gaúcho.

Ou seja, na hora de anunciar a verba, o fez ao lado do governador de verdade. Na hora de assinar os cheques, quem assina é Paulo Pimenta (PT). E na situação em que ficou, Leite nem pode reclamar.

Pimenta

Quem vai acompanhar as obras, fiscalizar os gastos, direcionar as ações, conversar com os prefeitos e articular quanto cada município irá receber? Pimenta.

E por que isso é estratégico num campo mais amplo? Paulo Pimenta, o “governador da reconstrução”, é pré-candidato a “governador de verdade”, no Rio Grande do Sul, em 2026.

Ninguém acredita que será possível reconstruir o estado em menos de um ano. Pimenta estará lá, todo esse tempo, assinando cheques e sendo solidário com os municípios. Na campanha, isso conta muito.

Ações

Lula pode ter aproveitado a sua “pandemia” para angariar lucro político, crescendo em um estado no qual o bolsonarismo andava muito forte. Depois que Pimenta foi confirmado, ao menos duas ações já foram anunciadas em conjunto: o governo vai pagar R$ 5,1 mil para cada família atingida, por pix, sem muita burocracia, e já se propôs a construir dez mil casas para alojar, temporariamente, famílias desabrigadas de Porto Alegre.

Eduardo Leite vai agradecer o dinheiro e ficar assistindo a entrega.

Não aproveitou

Bolsonaro teve a chance de fazer isso no Nordeste em 2020, mas aceitou as provocações dos governadores de esquerda da região, na época, e perdeu uma oportunidade rara na República Brasileira, que é a chance de usar o braço longo do Executivo Federal para abraçar o povo onde os executivos estaduais não alcançam, porque são dependentes financeiramente.

Crise e oportunidade

Crises são oportunidades, sempre. Toda escuridão é o ponto de partida para a luz.

Na vida, e na política, há os que têm habilidade para encontrar um caminho iluminado em meio ao breu. E há os que apenas perdem o rumo batendo em alguma parede.

CGU em PE

O ministro da Controladoria Geral da União, Vinícius de Carvalho, visitou o Recife nesta quarta-feira (15) e falou com a Rádio Jornal, no programa Passando a Limpo. O trabalho da CGU tem tudo a ver com os esforços de reconstrução do Rio Grande do Sul.

O órgão é responsável pela fiscalização e transparência dos recursos utilizados pelo poder público. Exatamente para evitar que o dinheiro do contribuinte seja alvo de corrupção. O alerta é ainda maior em municípios que estão em situação de emergência ou calamidade, quando a burocracia é acelerada e os dispositivos de transparência ficam mais frágeis.

Recife

No Recife, o ministro da CGU veio tratar da Rede Nacional de Transparência e Acesso à Informação (Redelai). A iniciativa tem o objetivo de estabelecer parâmetros comuns para troca de informações e compartilhamento de práticas de transparência nos gastos públicos. Estado e municípios podem aderir à rede e se beneficiar.

Trinta entes federativos já demonstraram interesse, inclusive o Recife.

Quaest

Quem também falou ao Passando a Limpo, na Rádio Jornal, foi o sócio-fundador do Instituto Quaest, Felipe Nunes.

Ele detalhou aspectos da pesquisa divulgada há alguns dias, mostrando que a maior parte da população (55%) acredita que o presidente Lula não deveria tentar um novo mandato em 2026 e que a rejeição a Bolsonaro (PL) continua alta, em torno de 54%, enquanto a do presidente petista está em 49%.

Diferente

O Quaest vem se destacando por fazer medições que vão além do “vota ou não vota” habitual. Com perguntas elaboradas para captar sentimentos menos diretos, é possível fazer análises mais certeiras e condizentes com a realidade.

O próprio Felipe Nunes deu um exemplo à Rádio Jornal: “Em 2022, antes da eleição, quando se perguntava se as pessoas votavam em Bolsonaro, a maioria dizia que não. Mas quando você perguntava se Bolsonaro merecia uma nova chance, os dados mudaram consideravelmente, por exemplo”.

Na campanha, é bom lembrar, Bolsonaro, que tinha rejeição altíssima, só não foi reeleito por 0,9%, legitimando o que apontava a Quaest.

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