Cena Política

Torcendo e retorcendo a lei para fazê-la caber nas conveniências políticas

Confira os detalhes da coluna Cena Política desta sexta-feira (17)

Imagem do autor
Cadastrado por

Igor Maciel

Publicado em 16/05/2024 às 20:00
Análise

Há uma conveniência política nos caminhos da Justiça que deveria preocupar os brasileiros. A conveniência é, antes de tudo, um risco coletivo. Costumamos vibrar quando ela nos atende e esquecemos a possibilidade de sermos atingidos na mesma medida. O caso de Sergio Moro (UB), e talvez toda a vida recente dele, é um exemplo.

O ex-juiz que “esticava” a lei para condenar políticos, viu-se político e vítima da lei “esticada” por conveniência de ocasião. Prestes a perder o mandato de senador, encontrou-se com nova reviravolta que pode mantê-lo com o cargo.

O que mudou entre ele condenar e quase ser condenado? O que mudou entre ele ser chamado pelos colegas de “ex-senador em exercício” e, agora, estar quase seguro de que vai seguir com o mandato?

Não foi a lei. Apenas o ambiente político.

Deve ficar

A aposta, em Brasília, é que Sergio Moro não será mais condenado no TSE. O PT, um dos autores da ação, ouviu de Lula que o presidente não tinha mais interesse na cassação do adversário, que chegou a condenar e mandar prender o petista.

Não se trata de altruísmo, antes que alguém pense em elogiar Lula. O cálculo é político. Com a eleição suplementar que decorreria da cassação, a chance de alguém ligado a Moro ou até de Michelle Bolsonaro ocupar a vaga seria muito maior do que a possibilidade de vitória de um petista.

Cassar Moro seria contratar um problema maior.

Conversas

O PT não retirou a ação (nem o PL que também é autor), mas os ministros do TSE entenderam alguns recados que receberam. E os palpites sobre o placar do julgamento, que já começou em Brasília, agora favorecem o ex-juiz.

Ajudou também uma conversa entre membros do tribunal e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), disposto a colocar uma pedra no assunto.

Torce e…

Curiosas são as justificativas “jurídicas” para a mudança de humor da Justiça Eleitoral com o ex-juiz Sergio Moro.

Se antes ele seria cassado, “com certeza”, porque gastou dinheiro demais na pré-campanha e abusou do poder econômico, agora ele não será cassado, “com certeza”, porque a figura do pré-candidato nem existe na lei e não há como delimitar uma punição.

Dizem que questionar a sandice é assumir a própria insanidade, mas caberia perguntar: se a figura do pré-candidato não é bem delimitada juridicamente, como agora se diz, a ação não deveria ter morrido na origem?

…retorce

Que a Justiça no Brasil trabalhe em sintonia com as conveniências políticas não é novidade. O risco que muitos não se dão conta é que os ventos mudam com uma frequência cada vez maior em Brasília. Quem aponta o dedo hoje, encontra-se rapidamente com a ponta dos indicadores alheios frente a testa, quase num piscar de olhos.

Quanto mais se torce a lei para benefício próprio, menos se pode contar com ela no futuro. Alguns objetos quando retorcidos em excesso, perdem resistência e quebram com mais facilidade.

Da lei que é para todos (ou deveria ser) convém não abusar.

No jogo

A deputada estadual Dani Portela (PSOL) lançou sua pré-candidatura à prefeitura do Recife para tentar colocar um fim na disputa interna da federação PSOL/Rede.

Foi um passo inteligente, de afirmação e, apesar de Túlio Gadêlha (Rede) dizer que não acabou e ainda lutar nos bastidores para ser candidato, ficou bem mais difícil.

A parlamentar, que é líder da oposição, só daria o passo público que deu com algum apoio dos representantes nacionais do partido. E é para esses representantes que Túlio ainda pretende apelar.

Pesquisas

Há uma outra dificuldade para o deputado federal, que já saiu do PDT por motivos parecidos após ser preterido na eleição de 2020, ele não consegue estar à frente de Dani Portela em nenhuma pesquisa divulgada até o momento. E nos levantamentos internos dos partidos aos quais a coluna tem acesso com certa regularidade, os números dele chegam a ser ainda menos animadores.

Auxiliar

A questão com a candidatura de Dani Portela é que ela vem sendo considerada representante de um palanque auxiliar ao de João Campos (PSB). Essa alegação está tão presente nos bastidores que ela própria fez questão de falar no assunto após o lançamento desta semana. Disse que sempre fez e vai continuar fazendo oposição ao PSB. Posicionou-se à esquerda de Campos e garantiu ser adversária pra valer.

Muita gente que ouviu não acreditou, principalmente por causa de seus posicionamentos na Alepe, quase sempre em sintonia com os socialistas ligados ao atual prefeito do Recife.

Identificação

Do outro lado, Túlio também é considerado o projeto de uma “linha auxiliar”, um tipo de plano B do Palácio do Campo das Princesas na eleição de outubro.

Mas o problema maior dele é a ausência de vínculo programático. O deputado costuma abraçar pautas por demanda de momento. Tanto faz encontrá-lo num protesto contra um projeto imobiliário, numa manifestação pela Cultura ou em piquetes pelo meio-ambiente. É como se a atuação do deputado dependesse apenas do que estiver chamando atenção no dia.

O eleitor, principalmente o do Recife, não consegue identificar uma causa da cidade e pensar imediatamente em Túlio Gadêlha. Isso inviabiliza qualquer potencial candidatura.

Tags

Autor