O Recife eleitoral entre as palavras agradáveis e as verdadeiras

Um pouco sobre a realidade do Recife, o filósofo Lao-Tsé e os dilemas entre o que é novo e o que é básico na eleição da capital de Pernambuco.

Publicado em 16/08/2024 às 20:00

O maior desafio das eleições deste ano no Recife será marcar um encontro com a realidade e não com as narrativas. O filósofo chinês Lao-Tsé, ativo entre os séculos V e VI A.C e fundador do Taoismo, dizia que “as palavras verdadeiras não são agradáveis e as agradáveis não são verdadeiras”.

Poucas frases se encaixam com tanta facilidade na eleição da capital este ano. De um lado, a oposição vai apontar para uma cidade pesadelo, o que não é verdade. Do outro, o atual prefeito e candidato à reeleição apresentará um Recife de sonho, que também não é verdadeiro. Isso acontecerá porque a verdade não é agradável, como bem ensinava Lao-Tsé.

Melhor

A verdade é que o Recife está melhor do que na época de Geraldo Julio (PSB) e não há nada que o desmereça nisso. O ex-prefeito teve suas dificuldades com a pandemia e com influências partidárias muito fortes, concorrência interna socialista com o governador da época, quando eles ainda fingiam ser aliados mas estavam em pé de guerra, além de não ser um legítimo “Campos Arraes”. Sim, isso conta. O que também conta é Geraldo ser mais um burocrata que aprendeu a política tradicional do que exatamente alguém nascido para a vida partidária e eleitoral. Acontece.

Mas não tanto

O Recife está melhor do que estava antes, mas também está longe de ser o oásis da inovação, vivendo uma revolução na qualidade de vida. O Recife não é o paraíso que está nas redes sociais. Há indicadores apontando exatamente isso. Na maioria dos índices de desenvolvimento, a capital de Pernambuco aparece melhor, mas ainda entre as piores do país. É o caso do desemprego, do ambiente de negócios e da pobreza, para citar alguns exemplos. O problema dos moradores de rua continua, basta andar pela cidade para encontrá-los.

Sem correria

Algo que precisa ser observado é que a vantagem inicial do atual prefeito nas pesquisas, parece ter arrefecido a intensidade do trabalho da prefeitura na infraestrutura. Basta andar um pouco pela cidade para perceber a quantidade de buracos em ruas importantes e a falta de cuidado em algumas praças movimentadas, com mato alto e aspecto de abandono. Se a disputa estivesse mais apertada, talvez tivesse havido uma corrida para resolver problemas simples desse tipo. Não houve.

Descolado

A apresentação do prefeito como se fosse uma celebridade das redes sociais e não como gestor fez com que ele acabasse descolado dos problemas que persistem no município. Recentemente, numa corrida de aplicativo, ouvi o motorista reclamar do trânsito e dos buracos por metade do percurso. Quando perguntei o que achava do prefeito, o motorista se saiu com essa: “É culpa dele não. Ele deve contratar e o povo não faz o serviço”. Então, tá bom.

O novo e…

Ao mesmo tempo, a construção de caos e abandono total que a oposição faz da gestão atual também está fora da realidade. A equipe da prefeitura promoveu uma revolução digital importante no acesso da população aos equipamentos e serviços públicos. O investimento feito em parques pela cidade e em infraestrutura de iluminação, por exemplo, é expressivo. A gestão teve boas ideias para lidar com dificuldades, principalmente na fase final da pandemia. Não reconhecer isso é fugir da verdade.

…o básico

O Recife de verdade não estará no guia eleitoral da oposição e nem no do prefeito. E essa é a grande dificuldade deste ano de 2024. Corremos o risco de passar a eleição inteira sem discutir o Recife de verdade. Aquele Recife que teve avanços, mas precisa ir além dos parques para alcançar as moradias populares. Precisa ir além do carnaval para alcançar o saneamento. Precisa ir além do que é novo e moderno para alcançar aquilo que é básico.

Esse Recife, infelizmente, com o nível geral dos eleitores brasileiros, não dá votos ao prefeito e nem à oposição, apesar de ser real.

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