O curioso caso dos candidatos que cresceram (muito) com Rádio e TV
Carregar credibilidade das TVs para o Instagram é poderoso, mas ficar excluído dos espaços de TV, afastado da credibilidade que ela confere, é mortal.
Do fim de agosto até agora, houve mudanças importantes nas corridas eleitorais em várias capitais do Brasil. Em São Paulo, Ricardo Nunes (MDB) saiu do terceiro lugar com 19% e assumiu a liderança com 27%.
Em Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD) saiu do quarto lugar com 9%, chegou a 20% e está quase empatado com o primeiro lugar.
Em Fortaleza, há uma movimentação expressiva de dois nomes. André Fernandes (PL) saiu de 16% e foi a 25%. Já Evandro Leitão (PT) saiu de 10% para 19% na capital cearense.
Em Curitiba, Eduardo Pimentel (PSD), saiu de 19% e chegou a 36%.
Pergunto: o que todos esses nomes têm em comum e o que fez eles crescerem tanto num espaço tão curto?
É que todos esses candidatos são os que têm os maiores tempos de rádio e TV e os maiores blocos de inserções nesses veículos ditos tradicionais.
E a internet?
Significa que acabou o domínio das redes sociais no debate político? Depende do que você entende como domínio. Depende de você acreditar que esse domínio já existiu.
Criou-se uma ilusão de competição entre as chamadas mídias tradicionais de massa e as mídias sociais, como se uma estivesse suplantando a outra quando na verdade a relação delas é cooperativa.
Elas se ajudam, mesmo quando fingem um embate.
Jogos
Quem percebeu isso com facilidade nos últimos meses foi a Globo. Podemos tomar como exemplo a transmissão das Olimpíadas.
No início a questão era financeira e a Globo, para reduzir custos, começou a abrir mão de transmissão exclusiva em alguns eventos esportivos. Mas os resultados começaram a mostrar que os produtos acabavam tendo repercussão mais ampla quando eram divididos com outros meios, beneficiando a todos (com uma fatia maior para a própria Globo).
Ninguém está inventando a roda. O que se faz é usar as características da concorrência para ampliar o seu próprio mercado potencial.
Dividir é…
Nos Jogos Olímpicos de 2024 se falou muito nos números da Cazé TV, operada usando o YouTube, que aproveitou a brecha de exclusividade para exibir competições e impactou 41 milhões de pessoas em 18 dias. Foi um absurdo de audiência.
O curioso é que, no mesmo período, a Globo impactou 140,5 milhões de pessoas, com os mesmos jogos, somando todas as suas plataformas. São 100 milhões de pessoas a mais.
Ambas bateram recordes, a Cazé TV e a Globo. Foi bom para todo mundo. Quando forem vender o próximo ciclo olímpico, os dois poderão dizer que o potencial é de 180 milhões de pessoas.
…somar
Como dividir um mesmo produto pode fazer com que os dois concorrentes cresçam, que mágica é essa? É preciso perceber o benefício da concorrência para ampliar mercados específicos.
Quando somente uma emissora exibe os jogos você só tem duas escolhas: assistir ou não assistir. Com duas ou mais opções, o mercado se amplia e ambos se beneficiam.
Melhor ainda, nesse caso, porque a emissora tradicional cria um vínculo, através do produto, com um público que normalmente ela não iria alcançar.
Em relação às Olimpíadas, a Cazé TV não venceu a Globo e nem está caminhando para isso. Ao contrário, elas se complementam.
Emprestando
Agora, como essa realidade se encaixa na política eleitoral? A base é a mesma, com mídias tradicionais e novas mídias se complementando, ampliando “mercados” e votos.
Além disso, há empréstimos de características que são feitos entre as plataformas. As TVs e Rádios conferem credibilidade, enquanto as mídias sociais entregam capacidade de engajamento, de feedback e facilidade de acesso. Se os dois estiverem vendendo o mesmo produto ou candidato, o impacto pode ser muito ampliado.
Recife
O Recife é um bom exemplo disso. João Campos (PSB) soube trabalhar nas redes sociais com muita competência, enquanto dava entrevistas em emissoras de TV e Rádio para agregar credibilidade aos seus conteúdos. O resultado está próximo de 80% das intenções de voto para o socialista.
Em São Paulo, Pablo Marçal (PRTB) cresceu enquanto utilizava a credibilidade das emissoras de TV e Rádio para gerar cortes que iam parar em suas redes. Quando Nunes disparou foi com o início da propaganda eleitoral, na qual ele tem o maior tempo entre todos os candidatos. Marçal não tem tempo de TV e nem inserções, levou desvantagem, desidratou.
Isso acontece porque, em termos de volume, a penetração da TV e do Rádio ainda é muito maior que a das redes sociais. Carregar credibilidade das TVs para o Instagram é poderoso, mas ficar excluído dos espaços de TV, afastado de uma constância na programação diária, é mortal.
Aprendizado
O que se fala no meio político é que, para tudo no Brasil, a eleição municipal é um ensaio da eleição para presidente e governador, quando se fazem ajustes e as surpresas são absorvidas.
Para as próximas eleições, isso já está consolidado, candidato que cair na conversa mole de “economizar com TV e Rádio porque a internet resolve”, pode acabar sem mandato.