E se Lula não for candidato à reeleição em 2026?

Nos bastidores, petistas começam a discutir a possibilidade de não haver candidatura. Começaram a identificar que existe possibilidade de derrota.

Publicado em 31/10/2024 às 20:00

Não é impossível que Lula (PT) desista de ser candidato em 2026. O presidente tentaria a reeleição para um quarto mandato e a vitória seria histórica para sua biografia. Mas as medidas de um termo valem sempre para as duas pontas do termo em si. E uma derrota seria um gigantesco desastre para a história que vão contar sobre ele.

A Folha de São Paulo trouxe que alguns petistas começam a discutir a possibilidade de não haver candidatura exatamente porque começaram a identificar que existe a possibilidade de derrota. A avaliação do risco é correta.

Herói

Governantes populistas (e Lula é um deles) costumam guiar suas decisões em roteiros que, conscientemente ou não, assemelham-se à Jornada Clássica do Herói. É um conjunto de segmentos que encanta plateias e fez a fortuna de Hollywood.

Em resumo, o mocinho está recolhido vivendo sua própria vida humilde, sem querer se envolver com os problemas dos outros, mas é convocado para salvar o mundo. Inicialmente ele se recusa, até sofrer algum baque, ser provocado pessoalmente pelo vilão e decidir ir à luta. Nunca por ele, sempre pelos outros, com altruísmo bem marcado na história. No fim, ele vence e depois retorna a sua vida pacata.

Parece o roteiro de Rambo e de 99% dos filmes de ação que existem? Não é por acaso.

O que será contado

É também um roteiro utilizado por políticos populistas de maior calibre, por causa da receita que arrasta multidões. Pense bem na trajetória de Lula até agora, a que vai ficar na biografia do presidente contado por seus apoiadores, concorde você ou não com ela.

A biografia vai dizer que ele “dedicou a vida aos mais pobres nos primeiros mandatos, depois foi perseguido por isso, provou sua inocência (sendo liberado pelo STF) e estava disposto a ter uma vida pacata, rezando pelo futuro do Brasil. Mas foi obrigado a retornar e ser candidato em 2022 quando o país foi ameaçado por forças antidemocráticas. Venceu a eleição, afastou o mal e entrou para a História como um herói”. Você não precisa concordar com os detalhes, mas essa é a história que vai ser contada.

O que fica depois

Se Lula não for mais candidato em 2026, o mandato dele de 2023 até o fim nem será lembrado, sendo um sucesso ou um fracasso. Se não for candidato à reeleição, ninguém vai discutir nas aulas de História os gastos do governo, o descontrole fiscal, os tropeços de articulação política e nem a influência negativa do PT na gestão.

O último governo de Getúlio Vargas foi uma verdadeira tragédia. Mas o que se ensina nas salas de aula é apenas que ele “foi perseguido pelos opositores e saiu da vida para entrar na História”. Getúlio trouxe muitas realizações ao Brasil e muitos problemas, mas era um ditador que terminou cometendo suicídio quando foi obrigado a conviver com a democracia e percebeu que seria deposto. Ainda assim, é retratado como herói, exatamente porque nunca foi derrotado com voto popular.

O risco

Lula perdeu três eleições antes de ganhar a primeira, é verdade, mas venceu outras cinco depois (contando as dele e as de Dilma). A última derrota foi em 1998, quase trinta anos atrás. As primeiras derrotas serão contadas como um sinal de resiliência e obstinação em ajudar o Brasil.

Porém, se perder em 2026, o tropeço será um término inusitado para a jornada do herói lulista. Depois de ser apresentado como um salvador, o mocinho sempre vence no final. Uma queda pelo voto do eleitor levaria toda a história de Lula a um questionamento dos alunos quando o professor em sala de aula o chamasse de “herói”: se ele era mesmo tão amado, como não votaram nele?

A popularidade do atual governo não é uma tragédia, mas também não é confortável. Fosse outra pessoa, em outra situação, a candidatura à reeleição seria certa. Mas tendo tanto a perder, vale arriscar manchar a narrativa dos historiadores fraternos nas próximas décadas?

A chave é 2025

A resposta virá em 2025. A eleição municipal mostrou que o caminho é pelo centro, com Kassab (PSD), com o MDB e até com o Republicanos (que vai fazer o presidente da Câmara.

Os partidos desse segmento estão empoderados, sabendo disso. Se Lula conseguir agradar essas siglas, se garantir que o PT pare de atrapalhar, se conseguir isolar o bolsonarismo e apresentar resultados econômicos palpáveis, a candidatura e a reeleição são quase certas.

Se não fizer isso em um ano e desistir da reeleição, Lula fica para a História bonita que vão contar sobre ele. E alguém do centro (à esquerda ou à direita) poderá ser presidente em 2027. Aguardemos os próximos meses.

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