Por apoio na Segurança Pública é preciso que Lula faça sua parte primeiro

Uma medida essencial seria desmembrar o Ministério da Justiça, criando uma pasta específica para o setor e só depois cobrar alguma coisa.

Publicado em 01/11/2024 às 20:00

Essa é da série “conselhos de avó que todo gestor público deveria ouvir”. Lula convocou uma reunião com os governadores para apresentar a Proposta de Emenda à Constituição que será enviada ao Congresso sobre a segurança pública. O conselho das santas vozinhas que se encaixa nesse enredo é: “antes de cobrar do outro, faça a sua parte”. Lula não fez. E acabou cometendo um erro.

Antes de apresentar uma receita pronta para o problema da Segurança Pública, admitindo que é um problema nacional e prioritário, o presidente da República precisava ter dado mostras do quanto considera a importância do tema. Uma medida essencial seria desmembrar o Ministério da Justiça, criando uma pasta específica para a Segurança Pública. Podia ter anunciado isso na reunião. Não o fez.

Estrutura errada

Não entenda mal, o problema que o Governo Federal põe sobre a mesa é essencial e precisa ser discutido, a formulação das mudanças foi um bom ponto de partida, embora precise de muitos ajustes feitos por um congresso que ultimamente trabalha menos do que um bicho preguiça com dor de barriga e não esteja servindo para muita coisa. O problema é que não dá para o governo apresentar mudanças sem mudar a própria estrutura.

Então Segurança Pública é algo tão importante ao ponto de fazer com que os governadores do país gastem dinheiro com deslocamento para irem à Brasília, mas o próprio Governo resume o setor de segurança a uma secretaria do ministério da Justiça? Tem algo errado aí.

Seguro e ao centro

O ambiente da eleição de 2026 vai se formando aos poucos. Já sabemos, por exemplo, que a Segurança Pública será um tema essencial nas discussões, tanto porque os possíveis adversários da esquerda são governadores que se orgulham de terem essa prioridade quanto porque o crime organizado está prejudicando diretamente o sossego das pessoas enquanto se infiltra na sociedade.

Já sabemos também, por causa da eleição municipal, que há uma tendência forte ao centro, fugindo dos extremos e da polarização entre Lula e Bolsonaro. Honestamente, enquanto Lula não criar um ministério específico para a Segurança Pública e, mais, entregá-lo a um político com boa influência no centro, significa que ainda não tem ideia do que seu grupo está para enfrentar no próximo pleito.

E nem precisa gastar muito para isso. Basta rachar a verba do Ministério da Justiça, depois incorporar o dinheiro que sustenta dois ou três ministérios que poderiam ser secretarias e não fariam muita falta. Está resolvida a estrutura. Se é prioridade ao ponto de se convocar uma reunião com os gestores estaduais, então Lula tem que fazer a parte dele e organizar sua administração para isso.

Sabe o que faz

Agora, sobre o Ronaldo Caiado (UB) que foi lá aproveitar o convite para fazer propaganda de sua gestão, praticamente dizendo que seu estado é uma maravilha e que violência não é problema, é preciso dizer que o governador de Goiás, embora haja como oportunista, soe falacioso e tenha intenções pessoais e partidárias que não tem nada a ver com o bem estar verdadeiro da população, fez a leitura eleitoral e política correta do que saiu da eleição de 2024.

Caiado poderia somente ter faltado ao encontro, como vários outros governadores fizeram. Seu protesto estaria registrado pela ausência. Mas fez questão de ir lá para tentar cavar uma discussão com Lula.

Bolsonaro também

Antes disso, poucos dias atrás, estava discutindo com Jair Bolsonaro (PL) por causa das eleições e do comando da oposição no país. Caiado não é bobo. O recado dele para a opinião pública é de que foi capaz de brigar, numa mesma semana, tanto com Lula quanto com Bolsonaro.

Ele não é um e não é o outro, quis dizer a quem acompanhou os dois noticiários. Tanto Lula quanto Bolsonaro, cada um do seu jeito, responderam. Deram palco para ele. Um oportunista escala a montanha em provocação, mas só a conquista de verdade quando o provocado lhe dá alguma resposta. O presidente e o ex-presidente caíram na armadilha.

Crime sem fronteira

O cerne da questão na gestão pública contra o crime é que não existe uma coordenação das ações que envolvam União, estados e municípios. E isso é essencial. O crime organizado está dando a volta ao mundo enquanto o poder público tenta amarrar os sapatos.

As facções criminosas não atuam de acordo com as divisas dos estados e nem respeitam fronteiras. Querer combatê-los dentro de divisas e fronteiras não faz nenhum sentido. O Comando Vermelho atua no Nordeste como se estivesse no Rio de Janeiro. O PCC está em vários estados da federação e no Paraguai. Sabe onde o PCC também é muito forte? Em Goiás, estado de Ronaldo Caiado, que está longe de ser a maravilha que ele professa.

Achar possível combater o crime organizado ramificado dessa maneira, infiltrado em instituições públicas e até na própria polícia, sem uma coordenação nacional, é no mínimo uma estupidez.

Sem ideologização

No fim, o que deveria prevalecer sobre a Segurança Pública não é nem o oportunismo estúpido de Caiado e nem a ação do tipo “finge que acredita e eu finjo que faço” proposta por Lula.

Encaixa melhor com a realidade do país a fala da governadora em exercício Priscila Krause (Cidadania), que participou do evento em Brasília. “Sozinhos, os estados não podem vencer essa batalha. Esse debate promete ser longo e profundo, mas apelo para que nós não nos percamos em ideologização e politização, e possamos enfrentar os problemas como um projeto de nação. Este é um debate que deve ser sereno, com foco no interesse público”.

É isso.

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