A explosão do discurso de pacificação e o enterro da anistia bolsonarista
Quando, no meio desse papo sobre paz, um sujeito se veste de "Coringa" e se explode em frente à Praça dos Três Poderes, nada mais resta a dizer.
Não duvidando da estupidez humana, mas há uma defesa forte para os bolsonaristas, caso sejam acusados de terem qualquer envolvimento com o atentado ocorrido em Brasília esta semana.
É que é preciso ser muito burro para acreditar que isso, de alguma maneira, ajudaria a direita no Brasil. Se o tal do “Tio França”, que se explodiu em plena Praça dos Três Poderes quando tentava atacar o Supremo Tribunal Federal, tivesse um mínimo de noção de realidade política e jurídica, saberia que praticamente enterrou as chances de Bolsonaro (PL) ser habilitado novamente para disputar a presidência da República.
O baque foi tão violento para o ex-presidente que ele assinou uma nota sem qualquer narrativa esdrúxula, sem tentar culpar a esquerda pelos males do mundo. Foi como se fosse um ex-chefe de estado normal, falando em pacificação e na necessidade de desarmar o discurso em todos os espectros ideológicos. É natural, porque a realidade agora se tornou muito dura para ele.
Paz, por favor
E a realidade é a seguinte: nas últimas semanas, toda a negociação de deputados bolsonaristas no Congresso se resumia ao argumento de que o Brasil estava pacificado, os ânimos exaltados do fim de 2022 e início de 2023 estavam contidos e não havia necessidade de mais punições.
A conclusão era que seria necessário anistiar os envolvidos no 8 de janeiro para selar a normalidade institucional brasileira. A narrativa era de que o Brasil precisava colocar um ponto final no rescaldo dos incêndios da última eleição.
Quando, no meio desse papo, um sujeito se veste de “Coringa” e se explode em frente à Praça dos Três Poderes, nada mais resta a dizer.
Melou tudo
Em março deste ano, o Datafolha realizou uma pesquisa perguntando aos brasileiros o que eles achavam das punições aos que participaram dos atos golpistas de 2023. Na época, 63% dos entrevistados afirmou que era a favor da punição.
Depois, já este mês, o Instituto França fez outro levantamento, com a mesma questão. A coleta da pesquisa começou no dia 4 e terminou no dia das explosões, em 13 de novembro. Neste resultado o apoio às prisões era um pouco menor, com 57% dos brasileiros sendo favoráveis às punições.
Apesar de serem metodologias diferentes e institutos diferentes, isso mostrava que havia uma aceitação um pouco maior para a proposta de anistia dos parlamentares. Aí acontece o atentado.
É sério
Bolsonaro está preocupado e divulgou nota falando em “pacificar o Brasil” tentando se desvincular totalmente de qualquer ato insano de seus apoiadores, mas também para tentar sobreviver politicamente. Havia uma esperança de que, com a possibilidade de anistia para os golpistas, ele não fosse ainda mais implicado com novos processos que reforçassem a inelegibilidade.
Sim, a vinculação dele, como incentivador dos ataques aos poderes, está no forno aguardando o ponto certo para ser apresentada.
Nesse caso, além do obstáculo eleitoral, existe possibilidade concreta de condenação e prisão. É sério, muito sério.
Virou o jogo
Nos últimos meses, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, andava mais quieto, sem chamar tanta atenção. Moraes mergulhou e fugiu dos holofotes desde a briga com Elon Musk.
Sem o empoderamento contínuo do palco que criou para si, o alvo costumeiro dos bolsonaristas deixou a imagem descansar e nem estava sendo tão atacado, exatamente porque a direita não queria melar a chance de anistia.
Aí vieram as bombas. A que explodiu em Brasília e a outra bomba, um depoimento da ex-mulher do morto, afirmando que o alvo do atentado era Alexandre. Foi o suficiente.
Moraes voltou a dar entrevistas e foi direto: “Homem-bomba na Praça dos Três Poderes é fruto de discurso de ódio e anistia vai gerar mais agressividade”. Foi a pá de cal.