O salário pago ao professor, o ônibus que transporta o aluno até a escola, as cadeiras compradas para sala de aula, papéis, tintas e lápis usados pelos estudantes, o conserto do telhado do colégio que quebrou. Tudo isso pode ser pago com recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), principal mecanismo de financiamento hoje, no Brasil, para as redes públicas de ensino, sobretudo as municipais. Após cinco anos de discussão, a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que estava prevista para começar ontem na Câmara dos Deputados, deve começar nesta terça-feira (21).
Em vigência desde 2007, o Fundeb, considerado essencial para a educação do País, só vigora até o fim deste ano. É composto por impostos estaduais, municipais e federais. No ano passado, os recursos do fundo somaram cerca de R$ 166,6 bilhões - R$ 151,4 bilhões de arrecadação estadual e municipal, e R$ 15,14 bilhões da União. Em Pernambuco, em 2019, foram cerca de R$ 2 bilhões repassados pelo governo estadual para o fundo.
Mais R$ 2 bilhões vieram dos impostos municipais, totalizando, portanto, R$ 4 bilhões, segundo dados da Secretaria Estadual de Educação. A contrapartida do governo federal, para a rede estadual, ficou em R$ 242 milhões. A estimativa é que valor semelhante tenha sido somado ao montante, vindo do tesouro federal, e repassado para as prefeituras. Para este ano de 2020, a projeção é que a União pague R$ 615 milhões para Pernambuco, segundo o Movimento Todos pela Educação.
Atualmente, a União banca apenas 10% do Fundeb, embora 60% de tudo que se arrecada hoje no Brasil com impostos vá para o governo federal. A proposta da deputada Professora Dorinha (DEM-TO), relatora da PEC, é aumentar esse valor da complementação federal para 20%. Os 10% a mais seriam escalonados em seis anos: passaria a 12,5% em 2021, 15% em 2022, 16,5% em 2023, 18% em 2024, 19% em 2025 e 20% em 2026.
O governo Jair Bolsonaro, no entanto, quer evitar o aumento da complementação da União para 20%. A ideia da equipe econômica é destinar cinco pontos porcentuais dessa fatia ao Renda Brasil, programa em estudo no governo para substituir o Bolsa Família, e jogar para 2022 a entrada em vigor das mudanças no fundo. Como o Fundeb expira este ano, pela proposta do governo haveria uma lacuna no financiamento da educação básica em 2021.
OPINIÃO
"Precisamos de mais complementação da União. O Fundeb está defasado, não cresceu na mesma proporção que as nossas despesas com educação. Não temos como manter a educação básica, um ensino com o mínimo de qualidade se não houver o fundo. Defendíamos o aumento da União em 40%, a proposta que ficou é de apenas 10%. Já temos um ano letivo de 2020 quase perdido por causa da pandemia. Essa proposto do governo em não ter o fundo em 2021 é um desastre", diz o presidente da Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe) e prefeito de Afogados da Ingazeira, José Patriota.
"É fundamental que o governador Paulo Câmara, o prefeito de Recife, Geraldo Julio, se pronuciem e incentivem os parlamentares de Pernambuco a defenderem o Fundeb, sob o risco de as cidades entrarem em colapso por não terem verba para bancar a educação", sugere o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, comitê Pernambuco, Betinho Silva.
"A proposta da PEC foi construída com ampla representatividade, nos últimos cinco anos. O governo quer desarticular toda essa mobilização. Hoje 80% dos municípios pernambucanos dependem exclusivamente do Fundeb", observa o presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação de Pernambuco (Undime-PE) e secretário de Educação de Belém de Maria, Natanael Silva.
"Revolta é a palavra que resume o sentimento hoje. Houve todo tempo para o governo federal participar do debate sobre o Fundeb, aprofundar as discussões, mas o Ministério da Educação não se envolveu. O Ministério da Economia, quando se posicionou, foi apenas para criar restrições. A proposta apresentada sábado pelo governo é desrespeitosa", ressalta o secretário de Educação de Pernambuco e vice-presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed), Frederico Amancio.
Comentários