POLÍTICAS PÚBLICAS

Em Pernambuco, maioria dos municípios ainda não possuem ações para a primeira infância

O relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) mostra que 99 municípios pernambucanos ainda não elaboraram o Plano Municipal da Primeira Infância

Imagem do autor
Cadastrado por

Mirella Araújo

Publicado em 15/12/2023 às 16:34 | Atualizado em 03/01/2024 às 9:26
Notícia
X

O Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) divulgou um relatório que mapeou a existência de instrumentos que assegurem políticas públicas voltadas às crianças de zero a seis anos, em Pernambuco. Segundo o levantamento, 144 cidades pernambucanas (84%) não possuem Marco Legal pela Primeira Infância, e 99 cidades (54%) não elaboraram ainda o Plano Municipal (PMPI) com essa finalidade. 

O estudo, divulgado nessa quinta-feira (14), foi feito com base nas respostas de 172 das 184 prefeituras do Estado a um questionário eletrônico enviado pelo TCE-PE sobre a existência, ou não, do documento e da norma, e nas informações extraídas da campanha do Selo Unicef. Apenas os municípios de Calçado e São José do Belmonte, e o Distrito Estadual de Fernando de Noronha, não responderam à pesquisa.

"Nós temos identificado uma série de desafios para que os municípios consigam elaborar seus Planos para a primeira infância. Falta capacitação para os agentes, financiamento para programas destinados a garantir os direitos das crianças, bem como ainda há baixa compreensão sobre a importância dos primeiros anos de vida para o desenvolvimento integral do ser humano", explicou o auditor do TCE-PE, Diego Maciel. 

Outro grande desafio, é a decisão do gestor municipal de dar prioridade absoluta aos direitos das crianças. O Marco Legal é a lei que estabelece princípios e diretrizes para a formulação e a implementação das políticas públicas voltadas à primeira infância, enquanto o PMPI é aprovado por Lei (nº 17.647/22) e organiza as ações, programas e iniciativas do município, por meio de metas e indicadores.

A elaboração deve ser feita mediante um processo democrático e participativo, envolvendo órgãos da administração pública, a sociedade civil e a participação das crianças. 

Em Pernambuco, a vida e o desenvolvimento integral de mais de 840 mil meninas e meninos (9,3% da população) de zero a seis anos dependem de serviços públicos acessíveis e de qualidade nas áreas de saúde, educação, assistência social, saneamento básico, urbanismo, cuidados responsivos, entre outros.

"O Tribunal de Contas tem atuado fortemente em benefício da primeira infância em três eixos principais de ação: fiscalização, comunicação e orientação pedagógica. Foram realizadas operações em áreas sensíveis à primeira infância, como no transporte e infraestrutura escolar e no programa de imunização (vacinas). Também disponibilizamos uma capacitação para ajudar os gestores na elaboração do Plano Municipal pela Primeira Infância, via Escola de Contas, e promovemos seminários e lives sobre a temática", informou o auditor Diego Maciel ao JC

“Podemos avançar com mais rapidez”

O diretor-executivo do Instituto Pipa, Rogério Morais, destacou que esse é o primeiro levantamento oficial feito por um órgão do Estado e que a partir dos índices apontados, será possível fazer com que Pernambuco possa avançar mais rápido no que diz respeito ao fortalecimento de ações e políticas públicas para a primeira infância.

Rogério avalia que não estamos em um cenário ruim, do ponto de vista nacional, mas que o principal entrave para que os municípios possam implementar o Plano Municipal pela Primeira Infância, tem sido a carência de suporte técnico. "É claro que ainda tem alguns municípios que você também precisa fazer a defesa da causa, uma sensibilização”, disse Morais ao JC.

A adoção dessas medidas é responsabilidade do estado e municípios, que precisam implementar políticas intersetoriais e integradas para a primeira infância. “Neste ano, Pernambuco anunciou que vai construir o Plano Estadual de Primeira Infância, que além das diretrizes gerais para o estado, ele também deve inaugurar uma orientação para os municípios. É essa orientação que muitas vezes falta na primeira infância, é o desafio da política intersetorial”, explicou o diretor-executivo do Instituto Pipa.

Também neste ano, pela primeira vez, o Governo de Pernambuco inseriu o Orçamento da Criança, voltado para a primeira infância, no escopo da Lei Orçamentária Anual (LOA) 2024. O Executivo prevê um investimento de R$ 2.148.963.798,00 só para o próximo ano.

 A nível federal, o GT Primeira Infância que integra o grupo chamado de Conselhão, entregou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nessa terça-feira (12), uma síntese preliminar das propostas que estão sendo construídas para o cuidado integral das crianças brasileiras.

Segundo o documento, elaborado sob a coordenação da presidente-executiva da Todos pela Educação, Priscila Cruz, o primeiro passo é criar um Cadastro Único Nacional voltado para a primeira infância. Nele, deverá constar o histórico de acesso a serviços essenciais como saúde, educação e assistência social, para que chegue a todas às crianças de 0 a seis anos, principalmente as que se encontram em situação de vulnerabilidade. 

Outro ponto importante abordado pelo GT do Conselhão, é a previsão de incentivos técnicos e financeiros para expandir equipamentos públicos, fortalecer os múltiplos serviços individualmente e garantir, com protocolos específicos, a integração entre todos eles.

FREEPIK/BANCO DE IMAGENS
Diretor-executivo do Pipa, Rogério Morais - FREEPIK/BANCO DE IMAGENS

RECORTE POR PORTE E REGIÕES

A auditoria também levou em conta a população total e de crianças na faixa etária entre 0 e 6 anos de cada uma das localidades; o porte populacional dos municípios (de acordo com o IBGE); e a classificação relacionada às Regiões de Desenvolvimento.

De acordo com o levantamento do TCE-PE, 40% dos municípios de médio porte e 41,6% dos de grande porte possuem PMPI, respectivamente. Em relação às cidades de pequeno porte, 45% delas informaram possuir o documento. Recife, a única cidade pernambucana com mais de 900 mil habitantes, possui Plano e Marco Legal para a Primeira Infância.

Em relação às regiões de desenvolvimento, o Agreste Setentrional foi a região com o menor percentual, tendo 11% de seus municípios com Plano Municipal pela Primeira Infância, enquanto o Sertão do São Francisco apresenta o maior percentual (71%). 

O trabalho foi coordenado pela Gerência de Padrões, Métodos e Qualidade (GQUALI) do TCE-PE, com a colaboração do Departamento de Fiscalização Regional (DREGIO) e de parceiros externos como a União dos Dirigentes Municipais de Educação de Pernambuco (UNDIME-PE), a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação de Pernambuco (UNCME-PE), o Fórum em Defesa da Educação Infantil de Pernambuco (FEIPE), a Rede Nacional Primeira Infância (REPI-PE), dentre outros.

Thiago Lucas/ Design SJCC
Planos pela primeira infância - Thiago Lucas/ Design SJCC
 

POBREZA NA INFÂNCIA

Dados do relatório “Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil", divulgado pela UNICEF em agosto deste ano, mostram que o cenário é desafiador. O estudo revelou que 73,4% das crianças pernambucanas vivem em situação de pobreza, o que pode comprometer o desenvolvimento cerebral e prejudicar a capacidade de aprendizagem e de relacionamento do indivíduo, inclusive na vida adulta.

Para a chefe do escritório do UNICEF no Recife, Verônica Bezerra, estratégias como os Planos Municipais pela Primeira são fundamentais para que as ações voltadas às crianças sejam prioridade no orçamento e nas políticas públicas.

"O UNICEF reconhece, com satisfação, a importância da iniciativa do TCE de Pernambuco em investir na primeira infância e realizar este mapeamento. Esperamos que os resultados contribuam para o fortalecimento de ações em benefício dos direitos de cada criança, especialmente num período tão importante como o da primeira infância”, afirmou Verônica Bezerra.

 *Com informações da Gerência de Jornalismo do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE)

Tags

Autor