Em Pernambuco, mais de 136 mil crianças não frequentam a creche por dificuldades de acesso, diz estudo

A creche atende crianças de 0 a 3 anos e, apesar de não existir a obrigatoriedade da matrícula, a oferta de vagas é um direito da família e da criança

Publicado em 08/04/2024 às 15:03 | Atualizado em 08/08/2024 às 14:15

Em Pernambuco, mais de 136 mil (25%) crianças não frequentam a creche por dificuldades de acesso. É o que mostra o estudo divulgado, nesta segunda-feira (8), pela organização Todos Pela Educação, com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).

Primeira etapa da Educação Básica, a creche atende crianças de 0 a 3 anos e, apesar de não existir a obrigatoriedade da matrícula, a oferta de vagas é um direito da família e da criança segundo a Constituição Federal e o Marco Legal da Primeira Infância que reforça o papel do Estado neste desafio. Inclusive, a pesquisa também mostra que 216,34 crianças (40%) não frequentam a creche por uma opção dos responsáveis. 

“Essa dificuldade de acesso pode ser tanto a inexistência de uma vaga. Então, realmente ali naquela região, naquele município, não tem vagas suficientes para o tamanho da demanda. Como também pode ser uma questão distribuição  desigual destas vagas pelo território. Ou seja, até pode existir a vaga, mas ela está muito distante da residência da família. Esses são os dois principais motivos que podemos trazer aqui como dificuldades de acesso e que o estado de Pernambuco está nessa cifra de 25%”, afirmou a coordenadora de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, Daniela Mendes, em entrevista à coluna Enem e Educação.

Ainda segundo Daniela, esse percentual de 25% é um dado preocupante porque mostra que as famílias dessas crianças gostariam que elas estivessem matriculadas, que elas deveriam frequentar este ambiente, mas não têm acesso a vaga. “Esse é um número preocupante porque é um direito que não está sendo garantido”

Vale lembrar que no Plano Nacional de Educação (PNE) a meta era de que o Brasil deveria atender pelo menos 50% das crianças de até 3 anos nas creches até 2024. Em Pernambuco, como mostra o levantamento da ONG Todos pela Educação, 29% das crianças frequentam a creche, ou seja, isso representa 159,40 crianças matriculadas (em números absolutos).

POLÍTICA NACIONAL

Os maiores percentuais de crianças que não frequentam a creche por dificuldade de acesso estão nas regiões Norte e Nordeste do país. Os quatro estados com os maiores índices são: Acre (48%), Roraima (38%), Pará (35%) e Piauí (33%).

Muitos municípios relatam que os problemas sobre ampliar a oferta da vagas em creche recaem sobre as dificuldade de recursos financeiros, que se traduzem nos desafios implementar infraestrutura adequada e  profissionais especializados para lidar com essa faixa etária.

Para estas questões, Daniela Mendes, defende a criação de uma Política Nacional Integrada para a Primeira Infantil - abrangendo as áreas da saúde, assistência social e educação - e que tenha como compromisso o regime de colaboração entre os entes federados.

"Porque essa priorização política como a questão de conseguir com que os municípios aumente suas vagas, isso precisa ser algo nacional. E isso vem da colaboração do governo federal, com os estados e os municípios. Nós sabemos que o município sozinho não vai conseguir, então é muito importante que tenha uma cooperação e que tenham planos e diretrizes que sejam claros e pactuados entre os entes da federação para que a gente consiga avançar nessa questão de acesso e que a gente consiga atender as demandas", pontou coordenadora de Políticas Educacionais.

 Divulgação/Todos Pela Educação
Daniela Mendes, coordenadora de Políticas Educacionais - Divulgação/Todos Pela Educação

CENÁRIO NACIONAL

No Brasil, 2,3 milhões (20%) de crianças de até 3 anos de idade não frequentam creches por alguma dificuldade de acesso ao serviço. O levantamento do Todos Pela Educação mostra que cerca de seis em cada 10 famílias gostariam que seus filhos frequentassem a creche, mas apenas quatro são atendidas.

Esse cenário também evidencia a desigualdade que existe no país, quando mostra que o percentual das famílias mais pobres (28%) que não conseguem vagas é quatro vezes maior do que o das famílias ricas (7%).

"Nós conseguimos ver nesse estudo que o desafio do acesso a creche ele não é igual em todos os territórios. É muito importante que a gente olhe com muita atenção e entenda a demanda real que existe no nosso país, para que possamos fazer um planejamento enquanto nação que quer garantir os direitos das nossas crianças", disse Daniela Mendes.  

OPERAÇÃO DE FISCALIZAÇÃO

Em novembro de 2023, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) divulgou os resultados da “Operação Ordenada Educação Infantil 2023”. A ação de fiscalização avaliou a estrutura e a oferta de vagas em creches e pré-escolas públicas de Pernambuco.

Durante a fiscalização, iniciada no dia 9 de outubro, 92 auditores do TCE visitaram 2.500 unidades de Ensino Infantil em todos os 184 municípios pernambucanos, sendo aproximadamente 60% do total de creches e escolas com educação infantil existentes no estado.

As equipes do Tribunal encontraram diversos problemas estruturais e pedagógicos, que vão desde a falta de abastecimento de água, alimentos para merenda armazenados em locais inadequados ou vencidos, salas com rachaduras e infiltrações, banheiros sem vaso sanitário e pia, até a proporção entre professores e alunos.

Sobre a estrutura das escolas e creches com Educação Infantil, a nota geral do Estado foi de 59,1 (a nota máxima é 100). Entre os critérios avaliados pela fiscalização está a Diversidade Funcional (82%), Alimentação (67%), Equipe (62%), Infraestrutura (66%), Práticas Pedagógicas e Bem-estar (32%) e Segurança (28).

No âmbito das práticas pedagógicas e bem-estar, por exemplo, foi observado que em muitas escolas, equipamentos como os parquinhos que são importantes para o desenvolvimento psicomotor e social da criança, não estavam em condições de uso.

Já no que se refere a segurança, há problemas com relação a extintores de incêndio regulares, licença da vigilância sanitária válida, vistoria dos bombeiros válidos, e câmeras de monitoramento.

Ao final do levantamento, os municípios foram classificados por meio de indicadores retratando a situação local como "desejável", "boa", razoável ","grave" ou "crítica ". Segundo a operação do TCE, nenhum município atingiu estágios de bom ou desejável.

“A partir dessa transparência nós vamos poder, inclusive punir, aqueles municípios que não garantirem os direitos da Primeira Infância. E essa punição poderá ir até às últimas consequências, que é a rejeição de contas. Esse vai ser um dos itens que em breve, nos próximos exercícios, vai ser resultado para análise de aprovação ou rejeição de contas para os municípios e Estado, e todos os responsáveis pela Primeira Infância”, disse o presidente do Tribunal de Contas, Ranilson Ramos.

No entanto, ele reforça que um dos grandes desafios enfrentados pelas gestões municipais para fortalecer a educação infantil, está no financiamento. "Não é só porque o município tem a competência de executar, que ele necessariamente tem que ter o financiamento, ele precisa ser ajudado pelo governo federal e pelo governo do Estado", afirmou.

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