Má gestão do dinheiro público impede resultados melhores na Educação, diz Mozart Neves
Ex-secretário da Educação de Pernambuco diz que gestão ineficiente mitiga os efeitos dos investimentos e vê enfraquecimento do FIES como reflexo disso

Em entrevista ao Passando a Limpo da Rádio Jornal, nesta quarta-feira (12), o ex-secretário da Educação de Pernambuco Mozart Neves, professor emérito da UFPE e titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP, disse que o Brasil precisa profissionalizar sua gestão educacional para melhorar os dados da Educação no país.
O professor participou do programa para comentar sobre o artigo que publicou no JC, também nesta quarta-feira (12), intitulado “Quando os extremos se conjugam”, onde ele analisa o crescimento da população brasileira com formação superior, revelado no Censo do IBGE de 2022, em comparação com os dados de 2000.
O censo revela que o percentual da população branca de 25 anos ou mais com diploma de nível superior cresceu 2,6 vezes, passando de 9,9%, em 2000, para 25,8%, em 2022. Já entre a população preta de 25 anos ou mais, o crescimento foi ainda maior, 5,6 vezes, indo de 2,1%, em 2000, para 11,7%, em 2022.
Para analisar esses números, Neves usou dados do relatório “Qualidade dos bens públicos e eficiência do gasto no Brasil”, produzido por economistas do Itaú Unibanco, que aponta como o dinheiro público está sendo empregado no país.
Gestão ineficiente limita resultados
A conclusão do ex-secretário da Educação é de que, embora tenha havido avanço no intervalo de 22 anos, o Brasil tinha potencial de ter alcançado resultados muito melhores se tivesse uma gestão mais eficiente do dinheiro aplicado na educação pública.
“O Brasil tem um gasto bastante significativo do seu produto em termos brutos, mas apesar disso a gente não consegue ter o impacto em termos de metas, em termos de resultados que o país precisa”, afirma o professor.
Neves aponta que o gasto do dinheiro público em áreas como a educação é ‘muito ineficiente’, o que mitiga o impacto das políticas públicas, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos.
“É como se a gente estivesse fazendo um percurso de automóvel, e para cada litro de gasolina, eu faço apenas 5km. Eu ando, mas são 5 km por litro de gasolina, enquanto a gente poderia estar fazendo 10km por litro de gasolina”, compara.
Para aproveitar melhor o potencial dos investimentos em educação, o professor afirma que é necessário mudar o modelo de gestão brasileiro, repleto de ‘achismos’, sem critérios técnicos e tomado por interferências políticas, como a indicação de diretores escolares por prefeitos.
“A metodologia tem que ter estudo, ciência, pesquisa, mostrando que ela impacta na aprendizagem do aluno. A gente não faz isso na educação”, pontua Neves.
Endividamento de jovens enfraquece FIES
Como reflexo da ineficiência da gestão educacional, Mozart Neves aponta o declínio do FIES, o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior, impulsionado durante os primeiros governos de Lula e com ápice em 2014, no governo Dilma, quando mais de 700 mil matrículas foram realizadas em faculdades privadas por meio do programa. Neste ano de 2025, o número de contratos pelo FIES caiu para apenas 90 mil.
O professor afirma que parte do enfraquecimento do programa, que se tornou uma das principais políticas de acesso de jovens de baixa renda ao ensino superior, é devido à má gestão dos recursos. “O governo não fez o controle, o seu dever de casa, para ver quanto as universidades particulares estavam cobrando pela mensalidade do aluno com FIES”, diz.
Segundo Neves, por conta do descontrole, não foi possível impedir práticas como cobranças de mensalidades com valores excessivos pelas instituições privadas, o que levou ao endividamento de muitos jovens.
“Muitas faculdades particulares cobraram uma mensalidade via FIES maior do que aquela mensalidade pelo balcão. Então, terminou o FIES dando, naturalmente, insustentável. Cresceu a dívida de R$ 1 bilhão para R$ 30 bilhões do custo do FIES em quatro anos”, afirma.
Neves aponta que outro fator determinante para enfraquecimento do programa, mesmo com o esforço do governo para atrair os jovens, é a quebra de expectativa com um mercado de trabalho em crise, com baixos salários, que dificulta que muitos estudantes consigam quitar seus débitos com os bancos após a formatura.
“O jovem percebeu que quando ele conclui o ensino superior, mesmo com o FIES, ele tem uma renda que não possibilita pagar o FIES, isso se ele estiver empregado”, explica.