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Todos os pastores do presidente. Por Ricardo Leitão

Ministro da educação acabou de ser trocado em função de suspeita de desvios na pasta, para favorecer pastores

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Jamildo Melo

Publicado em 31/03/2022 às 9:00 | Atualizado em 31/03/2022 às 12:35
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Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog

Depois dos protocolares protestos de inocência, o pastor presbiteriano Milton Ribeiro foi exonerado, por Jair Bolsonaro, do cargo de ministro da Educação, o quarto no desgoverno. Conservador, homofóbico, Ribeiro se envolveu em um escândalo em que se misturam corrupção ativa e passiva, advocacia administrativa e desprezo ao caráter laico do Estado. Como operadores do esquema, dois pastores: Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura.

Ribeiro já os encontrou nos corredores do ministério, embora não sejam funcionários nem comissionados da pasta. Ambos também tinham acesso ao gabinete de Bolsonaro no Palácio do Planalto. Fotos em solenidades com o presidente ilustram suas redes sociais. Santos é presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministérios das Assembleias de Deus e diretor do Instituto Teológico Cristão; Moura é assessor político da Convenção Nacional de Igrejas e preside o seu Conselho Político.

Na verdade, por trás dessas pomposas denominações os dois pastores operavam no ministério como corretores dos bilionários recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Mediante diversificadas formas de propinas, conseguiam a liberação dos recursos do fundo para projetos “de prefeitos aliados ou outros, do interesse do presidente Bolsonaro”, como explicou o ex-ministro. Em um ano, foram atendidos 15 prefeitos, em 8 estados.

A dupla de pastores cobrava de R$ 15 mil a R$ 40 mil para abrir um processo no FNDE e mais uma “taxa de sucesso” se a operação fosse bem sucedida. O prefeito tinha opções para pagar a taxa: depósito bancário, um quilo de ouro (cerca de R$ 300 mil) ou a aquisição de mil Bíblias, a R$ 50 o exemplar. Ainda não se sabe quanto os dois religiosos embolsaram. A Polícia Federal abriu inquérito. Um dos mais importantes pontos a ser investigado é saber como as portas do Ministério da Educação e do Palácio do Planalto – e, por extensão, as portas do FNDE – foram abertas a Santos e Moura.

Como destacado no início, Milton Ribeiro se diz inocente. Teria pensado ser uma homenagem a sua foto impressa nas Bíblias vendidas aos prefeitos pelos pastores. Até chegar ao ministério, em julho de 2020, não tinha qualquer experiência em administração pública. Foi indicado a Bolsonaro pelo então ministro da Justiça André Mendonça. A Mendonça coube posteriormente o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal por ser – segundo Bolsonaro – “terrivelmente evangélico”.

Dada a extensão das atividades de Santos e Moura, a Polícia Federal deve também investigar a existência, no Ministério da Educação, de um “gabinete paralelo”, para cuidar exclusivamente das verbas do FNDE. Se existir, não será original no desgoverno. Irá se juntar ao “gabinete do ódio e das fake news”; ao “gabinete da cloroquina”; ao “gabinete do Orçamento secreto” – todos atestando o descalabro de uma gestão patrimonialista, corrupta, sem qualquer transparência.

Ribeiro irá depor no Senado, mesmo defenestrado do cargo. Há tensão no Palácio do Planalto sobre o que vai dizer, especialmente a respeito dos dois pastores, que sequer conhecia quando assumiu. Irá se sacrificar por Bolsonaro, como fez o general Eduardo Pazuello, quando explodiu o escândalo das vacinas no Ministério da Saúde? Ou será fiel aos mandamentos e não mentirá?

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