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'No rumo do desespero', pro Ricardo Leitão

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Augusto Tenório

Publicado em 14/06/2022 às 10:25
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Depois de desfilar de motocicleta pelas ruas do Umuarama, interior do Paraná (sem capacete, claro), Jair Bolsonaro voltou a pregar o medo, a levantar dúvidas sobre a realização das eleições de outubro e a reafirmar que todos devem estar prontos para ir à guerra “porque não podemos deixar que o Brasil siga o caminho esquerdista da Argentina, da Venezuela e do Chile”.

Semana antes, em Maringá, também no interior do Paraná, Sua Excelência já tinha disparado contra a democracia: “Sabemos o que está em jogo. Todos têm que jogar dentro das quatros linhas (da Constituição). Queremos eleições limpas, mas vamos combater os inimigos internos, que querem comunizar o País”. Em meados de maio, ao discursar para empresários em São Paulo, foi bolsonariamente explícito: “Os que tentaram nos roubar em 1964 (referindo-se ao golpe militar) tentam nos roubar agora. Lá atrás pelas armas, hoje com as canetas”.

As canetas seriam as dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, no momento seus inimigos preferenciais. Mas não são as canetas, são as pesquisas, que explicam a subida de tom, que o levaram a se dirigir aos gritos aos empresários, em São Paulo: “Podemos ter crise. Podemos ter eleições conturbadas”.

No Paraná e em São Paulo a pregação de Bolsonaro não foi tão explicitamente golpista, como às vezes é destilada. No entanto, a sombra do breu autoritário esteve sempre presente, anunciando que as “eleições conturbadas” serão quase inevitáveis.

Sua Excelência está com medo da derrota – que pode levá-lo à prisão – e marcha no rumo do desespero. Apesar de suas limitações cognitivas, sabe fazer algumas contas básicas. As pesquisas de intenção de voto mostram que, a pouco menos de quatro meses das urnas de outubro, em nenhuma amostragem ele sequer se aproxima do petista Luiz Inácio Lula da Silva. Se um(a) terceiro(a) concorrente avançar sobre sua base, amealhando votos de seu eleitorado, cresce a possibilidade de Lula vencer no primeiro turno.

Acuado pelo desastre do desgoverno, Bolsonaro tenta se equilibrar em dois pilares: a fidelidade da base de direita e o combate à inflação, que mastiga sua popularidade. A base já foi maior, porém ainda assegura cerca de 25% das intenções de votos, o que mantem viva sua candidatura. A inflação, contudo, não recua dos dois dígitos mensais há dez meses, empobrecendo todos os brasileiros e afogando na miséria os mais pobres.

O desespero leva o desgoverno a dar cambalhotas. Em uma entrevista coletiva organizada às pressas, Sua Excelência anunciou que pretende zerar os impostos federais que incidem sobre a gasolina, o gás e o diesel, como forma de conter a explosão dos preços dos combustíveis, principal fonte da inflação. Por força de lei aprovada no Senado e na Câmara dos Deputados, os estados teriam de limitar em 17% a taxa do ICMS sobre as vendas de gás e óleo diesel.

Como haverá perdas de arrecadação para os estados – e, por extensão, aos municípios –, o desgoverno transferiria para seus cofres cerca de R$ 50 bilhões do Tesouro federal. A operação seria viabilizada mediante aprovação, em dois turnos de votação na Câmara dos Deputados e no Senado, de emenda constitucional.

É uma operação complexa, a se desenvolver no meio da campanha eleitoral, enfrentando a oposição parlamentar e a mobilização contrária dos governadores e dos prefeitos, movidos, de princípio, por três questões: de onde virão os R$ 50 bilhões que cobrirão as perdas dos estados e municípios? Se o preço do petróleo continuar a subir no mercado externo, o esquema se sustenta por aqui? Se a inflação permanecer descontrolada, como vai ser?

O desgoverno não tem respostas. E não tem porque se trata de uma manobra perversamente eleitoreira, que tenta iludir os consumidores com promessa de combustíveis mais baratos, em benefício da candidatura de Bolsonaro à reeleição. Manobra tão óbvia que a validade do esquema expira em 31 de dezembro próximo, dois meses depois das eleições de outubro. É o desespero.

Por Ricardo Leitão

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