AVIAÇÃO

Aviões do Brasil correm risco de sumir do mapa assim como voo da Malaysia Airlines

Apesar de esforços das companhias brasileiras, poucas aeronaves têm equipamento indicado para evitar sumiço das aeronaves mesmo após 10 anos do caso MH370

Imagem do autor
Cadastrado por

Marcelo Aprígio

Publicado em 07/03/2024 às 12:31 | Atualizado em 07/03/2024 às 13:44
Notícia
X

Era uma noite comum em 8 de março de 2014, quando o Boeing 777-200ER decolou do Aeroporto Internacional de Kuala Lumpur com destino a Pequim.

Tudo parecia conforme o planejado, mas o que se seguiu foi um mistério que desafiou a compreensão humana e abalou as estruturas da aviação comercial.

Horas após o início da viagem, as comunicações foram abruptamente interrompidas e o voo 370 da Malaysia Airlines desapareceu dos radares.

Uma sensação de incredulidade varreu o mundo, e assim começou uma das operações de busca mais extensas e dispendiosas já registradas na história da aviação.

Por meses a fio, equipes de resgate, especialistas e voluntários se empenharam em vasculhar vastas extensões do Oceano Índico, em busca de quaisquer vestígios que pudessem lançar luz sobre o destino do voo e de seus 239 passageiros e tripulantes.

Sem pedido de socorro, sem trajetória de voo conhecida e sem destroços, o MH370 continua sendo o maior mistério da aviação moderna, apesar dos esforços incansáveis para desvendá-lo.

Uma década depois do desaparecimento do MH370, aviões que voam por companhias do Brasil estão sob o mesmo risco de 'sumir do mapa'.

Isso porque as aéreas do país têm poucos jatos equipados com um dispositivo de rastreamento indicado pela Organização da Aviação Civil Internacional (Icao, na sigla em inglês) para evitar episódios semelhantes ao da Malaysia. 

Vale frisar que o risco se desaparecer um novo avião, contudo, é baixo. Visto que a aviação comercial é reconhecidamente segura, mas infelizmente não é infalível, por isso ainda há o risco. Continue lendo a matéria para entender melhor.

LOCALIZADOR DE EMERGÊNCIA

Reprodução

MH370 - Reprodução

Para tentar evitar futuros episódios como o do MH370, a Icao propôs que novas aeronaves fabricadas após o incidente transmitissem sua localização pelo menos a cada minuto em situações de emergência, o chamado Transmissor Localizador de Emergência em Condição de Risco (ELT-DT, em inglês).

O objetivo do sistema é alertar as autoridades responsáveis pelo controle do tráfego aéreo com antecedência sobre possíveis desastres iminentes. Caso a aeronave viesse a cair posteriormente, as equipes de resgate teriam ao menos uma chance de encontrar o local do acidente.

No entanto, passados 10 anos desde o desaparecimento do MH370, os esforços para implementar medidas preventivas foram frustrados por questões burocráticas, pressões financeiras e debates sobre quem deveria ter controle final sobre o cockpit.

Reprodução

MH370 - Reprodução

Desde o sumiço do MH370, a regra de rastreamento de um minuto foi adiada duas vezes. Inicialmente deveria entrar em vigor em janeiro de 2021, mas o rastreamento foi adiado até 2023.

Agora, sofrendo ainda com os efeitos da pandemia de covid-19, que interrompeu as viagens aéreas e enviou centenas de aviões recém-fabricados e não entregues para armazenamento, a implementação da regra está prevista para 2025.

“Foram dadas garantias de que isso seria resolvido até 2023; no entanto, a pandemia atrasou todos novamente, levando ao segundo atraso”, disse a ICAO num comunicado ao This Week in Asia, referindo-se ao novo prazo.

As companhias aéreas têm aumentado até certo ponto suas capacidades de rastreio após o caso do MH370, identificando seus aviões de passageiros pelo menos a cada 15 minutos quando sobrevoam águas tidas como remotas ou em condição de risco (distress).

POUCOS AVIÕES DO BRASIL TÊM SISTEMA

O NE10 perguntou às três maiores companhias aéreas do Brasil sobre quantos aviões em suas frotas já atendem aos requisitos propostos pela Icao.

Latam, Gol e Azul, que representam mais de 90% do mercado nacional, repetem o que acontece em todo o mundo: poucos aviões têm o sistema.

A Gol, que tem 141 aeronaves — todas do modelo Boeing 737 — disse que seus jatos possuem mecanismos de rastreabilidade remota do voo sem intervenção do piloto, mas nenhum de seus jatos atende ao padrão sugerido pelas autoridades malaias e pela Icao após o caso envolvendo o MH370. 

A companhia justificou que todas as áereas atendidas pela Boeing estão no mesmo compasso de espera pelo dispositivo.

“A tecnologia ELT-DT ainda está em desenvolvimento pela indústria e estará disponível nas aeronaves da Boeing somente a partir de agosto de 2024.”, disse a Gol.

A Gol disse ainda que "trabalha em conjunto com a fabricante para que aeronaves que foram entregues da fábrica sem o sistema instalado sejam modificadas pela Gol antes da data recomendada pela Auditoria de Segurança Operacional da IATA."

FREEPIK

Imagem ilustrativa de radar - FREEPIK

A Latam afirmou que está instalando o novo ELT em toda a sua frota (mundial) de 334 aviões "para atender às novas exigências das autoridades correspondentes". 

Segundo a multinacional, atualmente, está previsto que 203 aeronaves sejam modificadas, sendo que os 30 jatos recebidos pelo grupo Latam desde 2023 já estão equipados com o dispositivo de rastreamento indicado pela Icao. 

A Azul não retornou o contato da reportagem até a última atualização desta matéria.

Com a baixa quantidade de aviões operando no Brasil com o novo sistema, apesar dos esforços das companhias, há aeronaves que cortam os céus do país correndo risco de sumir do mapa, a exemplo do ocorrido com o MH370. 

O mundo foi colocado em alerta para a possibilidade de isto ocorrer novamente. E por esta razão, é improvável que vejamos uma recorrência, mesmo com a tecnologia e os processos existentes ainda aquém do adequado.

APENAS NOVOS AVIÕES TERÃO SISTEMA

Além de estar atrasado, tendo em vista o prazo inicial, o novo padrão de rastreamento se aplica apenas a aeronaves novas.

Ou seja, não há exigência de instalação da tecnologia relevante em mais de 20 mil aviões mais antigos em serviço.

Isso significa que, pelos próximos anos, talvez décadas, milhares de aeronaves voarão transportando milhões de passageiros ao redor do mundo sem uma capacidade que foi considerada crucial após o desaparecimento do MH370.

Netflix

MH370 - Netflix

Os obstáculos tecnológicos desempenharam pelo menos algum papel nos atrasos. Quando o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes dos EUA recomendou sistemas de rastreamento “à prova de adulteração” em aviões em 2015, a Administração Federal de Aviação (FAA, em inglês), equivalente à Anac brasileira, recuou.

A FAA afirmou que a adoção do sistema não poderia ser feita sem retirar o controle do piloto da aeronave, visto que um dos principais pilares dos protocolos de segurança da aviação é que os comandantes deveriam ter a palavra final sobre a aeronave em caso de emergência.

Apesar disso, o especialista em segurança de voo Roberto Peterka afirma que, no caso do MH370, se o sistema estivesse em vigor, o desfecho poderia ter sido outro.

“Não posso afirmar que [o transponder] foi intencionalmente desligado pelo piloto, pode ter ocorrido pane nos instrumentos, mas, com certeza, com ele funcionando seria possível continuar acompanhando a posição da aeronave [mesmo após a queda]”, argumenta.

“Desconhecemos os motivos que levaram a esse acidente, mas podemos trabalhar na prevenção do fator humano, até termos as respostas”, pontua.

“A máquina você regula e tem certeza que vai trabalhar bem pelo tempo previsto; já o ser humano você não tem controle (nem ele próprio) pela reação que terá ao mover o próximo passo”, conclui.

Tags

Autor