Por Fernnado Castilho, do JC Negócios
O presidente Jair Bolsonaro precisa imediatamente passar a copiar o seu guru político Donaldo Trump. Não o Trump de até 15 dias atrás que atacava jornalistas, negava o possível impacto da covid-19 e até criou a expressão “corona chinês”. Esse não existe mais desde a última semana e é o “novo” Trump que Bolsonaro precisa se espelhar.
Para começo de conversa, o novo Donald Trump mudou radicalmente seu relacionamento com a mídia. Deixou de agredi-la, deixou de lado seu sorriso sarcástico nas respostas grosseiras e passou a focar nas ações de seu governo na covid-19.
Não existe mais o Trump que achava a reação ao novo coronavírus de “exagerada” e a pandemia de “uma fantasia”. O que não o impede de as vezes ser otimista demais nas providências que está tomando.
Mas a mudança de comportamento pôde ser vista na solenidade do decreto de estado de emergência nacional a de anunciar a entrega de cheques de US$ 1.000 para americanos ao custo de US$ 1 trilhão. Ou como no fechamento de fronteiras e suspensão do acesso aos aeroportos por 30 dias de passageiros da China e União Europeia. Ele simplesmente parou de brigar com a pandemia.
Bom, é verdade que manteve o confronto provocativo com a China. Mas esse não é foco nas suas entrevistas. Aliás, nas entrevistas o protagonismo é do vice Mike Pence, que Trump nomeou o coordenador do grupo estratégico de combate a covid19.
A mudança de comportamento do presidente americano se deu depois de ler (sim ele leu todo o documento), um estudo científico que aponta para a possibilidade de até 2,2 milhões de mortes nos EUA, caso não fossem tomadas medidas governamentais e individuais para conter a velocidade de transmissão da Covid-19. O estudo foi feito pelo Imperial College, no Reino Unido liderado pelo pesquisador-chefe do projeto e pesquisador de epidemiologia, Neil Ferguson.
É impressionante como agora Trump que se apresenta nas entrevistas coletivas (diárias) assumindo o comando das ações e indo a TV falando sério e passando orientações. Até a pose da exibição de sua assinatura de decretos contraditórios não existe mais.
O presidente americano tem razões de sobra para se preocupar. O número de casos confirmados nos Estados Unidos chegou a 26.900 na manhã deste domingo, colocando o país em terceiro lugar no mundo, atrás de China (81.054) e Itália (53.578). Em 24 horas, os EUA registraram 2.693 novos casos de contaminação, mais que o dobro de todos os casos brasileiros até agora.
O problema é que Bolsonaro insiste em se preocupar com o seu protagonismo na crise mirando nas próximas eleições agora que percebeu que perdeu a liderança das ações. Inclusive, para auxiliares como o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, o que claramente o incomoda.
E não percebeu que, nos Estados Unidos de Trump, é o vice-presidente Pence quem anunciar as medidas técnicas na área de saúde e proteção social cabendo a Trump questões estratégicas e financeiras com o presidente assentindo sua aprovação.
O problema de Bolsonaro é que ele ver ameaça política em tudo. Na última segunda feira, por exemplo, disse que "estamos em uma briga pelo poder e vou ser fiel àquilo que eu sempre tive com a população brasileira. Não dá para querer jogar nas minhas costas uma possível disseminação do vírus."
O presidente brasileiro não passa um dia sem criar um novo conflito. Terça-feira ele disse que "esse vírus trouxe uma certa histeria. Tem alguns governadores, no meu entender, posso até estar errado, que estão tomando medidas que vão prejudicar e muito a nossa economia.”
Nesta sexta-feira, abriu uma guerra sobre medidas adotadas por governadores para evitar a disseminação do coronavírus. Na sua visão, as ações como o fechamento do comércio, adotado nas maiores cidades do País e defendida por especialistas, podem prejudicar a economia e serem usadas para enfraquecê-lo politicamente. Pode ser, mas uma articulação mínima resolveria o impasse. O problema de Bolsonaro é que ele parece preferir copiar os esquivos de Trump.
Na questão do medicamento hidroxicloroquina que o presidente americano anunciou com possível cura ao Covid19 quando não há estudos conclusivos é ilustrativa. Trump foi duramente criticado neste final de semana pelas entidades médicas, mas Bolsonaro foi mais enfático do que o presidente americano ao falar da hidroxicloroquina.
Disse que "existe a possibilidade sim de que seja eficaz. Devemos nos antecipar porque esses testes levam tempo. Estamos na frente, pensando lá na frente. Na possibilidade de ser eficaz."
Trump disse que a droga tem o potencial de “virar o jogo” do coronavírus e que “resultados iniciais” se mostraram muito encorajadores” e que iria tornar a droga disponível “quase imediatamente”, acrescentando que ela já tinha sido aprovada para esse uso pela FDA. Na verdade, o uso da hidroxicloroquina ainda está em estudos iniciais e sua declaração fez os estoques sumirem das farmácias americanas.
Então, o que se observa é que o presidente brasileiro copia os erros de seu colega americano e não os acertos. Trump está numa corrida para um segundo mandato, em novembro, e percebeu que se não assumisse o protagonismo exigido de um chefe de Estado da mais poderosa nação do mundo poderia colocar sua reeleição em risco.
Bolsonaro, depois de perder a chance de liderar o país por negar a epidemia do Covi-19, agora tenta antecipar um embate que, se acontecer, será travado em 2022. E que vai depender muito mais de ações de um líder, de fato, do que de um candidato a reeleição apressado.
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