Por Fernando Castilho do JC Negócios
No meio dessa debate absurdo que no Brasil (e só no Brasil) se tornou a questão do enfrentamento da covid-19, tem um aspecto politico que se tornou a permanência ou não do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, para gerenciar a má notícia que o sistema de saúde entrou em colapso. E explicar por que poderemos ter imagens de fila de carros funerários nas ruas de cemitérios.
Porque independentemente das informações equivocadas do deputado Osmar Terra e da médica Nise Yamaguchi, o Governo está montando um colossal esquema de suporte para atender os infectados.
A realidade dessa superestrutura - que exige bilhões na compra de equipamentos - evidentemente não bate com as previsões risíveis de Terra que que a epidemia já atingiu o pico de infectados e que ela tende a ser reduzida.
Mas o problema é que o presidente acreditou nela a ponto de ser comprometer no encontro com líderes religiosos, neste final de semana, quando disse que o vírus “está indo embora do Brasil”.
Osmar Terra e Nise Yamaguchi afirmarem suas estultices é uma coisa. O problema é o presidente - que autorizou a compra de bilhões de remédios, equipamentos e contratações de médicos e enfermeiros - aceitar e validar a pessoas que tem os mais diversos interesses nessa questão. Como se fosse possível ter outros interesses numa questão dessa magnitude.
Mas o que parece claro é que o presidente sabe o quadro dramático que vem pela frente. Sabe - até porque tem assessoria profissional de pessoas do segmento militar - que o quadro que se avizinha não tem nada a ver com a ideia de que a epidemia atingiu o pico. E é ai que entra o Mandetta.
Bolsonaro não quer Mandeta para genro, cunhado ou co-sogro. Na verdade, não o quer nem para ser ministro da Saúde. Mas sabe que se demitir Mandetta esta semana – ele pode fazer isso a qualquer momento – estará sozinho na linha de frente quando o tsunami das internações seguida de morte chegar.
O problema para o país é como ele lida com esse quadro. Como ler esse movimento. O presidente quando Paulo Guedes conversa com ele sobre os custos da assistência médica faz uma constatação óbvia: Não faria sentido algum deslocar tanto dinheiro para comprar esses insumos se a epidemia estivesse “indo embora” como lhe prometeu Osmar Terra.
Tem mais: com a divulgação das informações que o GSI já lhe trouxe sobre o tamanho das notificações, subnotificações, mortes e sub-notificação de óbitos por morte de por problemas respiratórios sabe que o quadro de caos está apenas começando.
E para isso o Mandetta serve, ao menos nesse momento.
Alguém pode imaginar o caos no SUS e no ministério se ele atender o desejo insaciável de Osmar Terra de virar ministro?
Alguém pode imaginar Terra mandando reduzir as despesas com as compra de equipamentos já que como ele disse a epidemia atingiu o pico na última quinta-feira?
E se a realidade se provar - como na realidade dos demais países – caótica com o crescimento de mortes e sistemas de apoio montados entrando em colapso?
Qualquer pessoa minimamente informada sabe que vamos enfrentar essa epidemia desequipados. O que o Ministério da Saúde está fazendo é organizar o caos. Alinhar uma estratégia de redução de danos. Mas partindo da ideia de que teremos um quadro assustador mesmo para os mais experientes.
Mas porque Bolsonaro insiste na sua tese de isolamento vertical, abertura de todas as atividades e liberação dos contatos?
Talvez porque não possa mais voltar. O presidente foi longe demais na sua cruzada e levou com ele milhões de fiéis seguidores. Gente que está disposta a morrer de covid-19 negando a doença e acusando a mídia e os comunistas de serem os culpados.
É por eles que Bolsonaro batalha. E por isso quer se cerca de quem lhe assegurar estar certo. Ele vai demitir Mandetta. Mas até lá vai resistir a ideia do confinamento e não seria surpresa de chegar ao ponto de negar o caos. Mandetta será o mensageiro da má notícia.
Bolsonaro acredita que, depois do caos e sem ele, possa vir à luz se apresentando como o líder que nos levar a um porto seguro.
O presidente criou um confronto absurdo entre economia e saúde. Mas esqueceu que, sem organizar a questão da saúde, o tema economia se torna secundário.
A economia vai sofrer porque a covid-19 tem o poder de travá-la. Não depende de Bolsonaro ou de Donald Trump ou de Xi Jinping. Virou um fenômeno estrutural de classe mundial. Vai muito além da simples convicção ideológica do capitão e seus seguidores.
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