Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

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Por Fernando Castilho
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Aposta de Nelson Teich numa maior testagem deve expor a urgência do reforço no isolamento social

O problema da estratégia de fazer testes é o risco de não valorizar as ações práticas de emergência.

Fernando Castilho
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Fernando Castilho
Publicado em 19/04/2020 às 22:15 | Atualizado em 19/04/2020 às 22:50
MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL
Nelson Teich deseja conhecer o comportamento do vírus tarefa que milhares de pesquisadores já trabalham desde janeiro. - FOTO: MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL

Por Fernando Castilho do JC Negócios

A aposta do novo ministro da Saúde, Nelson Teich na testagem dificilmente não deve expor a urgência do reforço no isolamento social. O oncologista carioca assumiu propondo a realização de um programa de testagem em massa de pacientes da corona vírus embora tenha esclarecido, neste domingo, que isso não signifique que está propondo fazer exames em todos os 210 milhões de brasileiros.

De fato, não há chance de um país, com as condições geográficas e econômicas como Brasil, organizar um programa dessa magnitude, especialmente neste momento onde as gigantes do setor estão praticamente leiloando os kits.

A Coreia de Sul (com 52 milhões de habitantes e 100 mil k² contra 8,5 milhões do Brasil), conseguiu chegar perto porque abriga a planta da produção dos kits de uma das marcas líderes e como a China fechou o mercado em fevereiro.

Mas a estratégia de Nelson Teich embute um problema. Ao dizer que precisa ampliar o número de testes para conhecer melhor o comportamento do vírus, ele põe o verbo no futuro e releva - ao menos no discurso - a realidade atual do espalhamento da civid-19 no Brasil.

Pode ser do ponto de vista científico que testar para saber o comportamento do vírus no Brasil seja estratégico. Ao menos para saber o comportamento da dinâmica geográfica de espalhamento. Mas fazer isso no meio da crise é revelar um comportamento típico de cientista de laboratório que vê o mundo a partir do microscópio sem valorizar o quadro geral.

O desafio proposto a Nelson Teich não foi conhecer o comportamento do vírus. Disso milhares de pesquisadores ao redor do mundo estão trabalhando desde janeiro (sem nenhuma crítica à capacidade do ministro), com muito mais expertise e recursos que ele.

O problema do Ministério da Saúde, a partir desta segunda-feira, é qual estratégia a sua pasta vai fazer diante da perspectiva de gerenciar 30 mil, 50 mil ou 100 mil casos nos próximos 15 dias. E o que a pasta pode ajudar aos estados e municípios. Até porque teste não tem função curativa.

O comportamento de Nelson Teich é típico do novato que chega no emprego em posto de comando de uma empresa em crise e diz que, primeiro, é preciso contratar uma consultoria externa. Pode funcionar, mas a literatura empresarial está cheia de empresas de faliram depois de serem muito bem avaliadas pelos consultores porque o gestor ficou esperando o diagnóstico.

O problema dessa estratégia de fazer testes para tentar conhecer o vírus é que ela abre o risco de não valorizar as ações práticas de emergência. É não valorizar a necessidade de se ganhar tempo.

Ela até se presta muito bem ao discurso de do Presidente Jair Bolsonaro de forçar a redução do isolamento social. Mas tem prazo de validade se as coisas começarem a sair do controle em termos de estrangulamento do sistema de saúde. Mas tem altíssimo risco temporal.

Dito de outra forma. Nenhum governador estará interessado em conhecer o comportamento do vírus diante de um volume de casos que o obrigue a ter contêineres freezers nas portas de seus hospitais colapsados.

Nelson Teich também se queixa que a população está ficando assustada com tanta notícia ruim. Está subestimando a realidade brasileira. A população vai ficar assustada na medida em que começar a ver, no bairro, seus amigos e familiares saírem para um posto de saúde, serem transferidos para um hospital de campanha e depois serem informados do óbito.

O risco é passar a ideia de não ter a dimensão de sua tarefa neste momento. É natural que, no primeiro momento, os seus colegas em respeito ao seu currículo afirmem em público que ele todas as condições de fazer um bom trabalho. Aliás, do seu sucesso o Brasil inteiro espera aflito.

Mas aqui para nós, virologistas, infectologistas, sanitaristas e pesquisadores realmente acreditam num oncologista que nunca teve qualquer contato com o SUS e programas de saúde pública?

Então, o problema do novo ministro não é o seu alinhamento com Bolsonaro, seu festejado currículo e sua capacidade como médico oncologista e consultor renomado no setor de saúde suplementar. O desafio é apresentar imediatamente um plano de ação para o enfrentamento da covid-19.

Se insistir apenas no discurso de que é preciso testar para conhecer o comportamento do vírus corre o risco que ser desmoralizado por ele em menos de 30 dias.

Os novos gestores dessa crise não podem, ao menos internamente, esquecer que quando Luiz Henrique Mandetta escolhe a estratégia de focar na estrutura de atendimento ao infectados e no isolamento não foi porque não queira testar.

Ele, e a equipe interna do ministério da Saúde, perceberam o obvio. O comportamento de espalhamento do vírus já tem um padrão de classe mundial. Importa pouco testar se não tiver recursos de enfrentamento médico nem isolamento. Isso todos os países já fizeram em maior ou menor grau. Como o vírus se espelha todos os gestores de saúde já sabem.

Com esse comportamento inicial, Nelson Teich não está propondo nada de novo no Brasil e nem diante do quadro global. De certa forma, diante dos seus colegas ministros do G-20 neste domingo, o que ele disse deve ter sido ouvido como uma platitude.

A testagem apenas vai dizer o que os prefeitos e governadores já estão constatado nos seus hospitais. Daí a insistência na compra de equipamento e a luta com o presidente que levou a demissão de Mandetta.

Ninguém discorda de que é preciso testar. Mas além de ser caro, exigir uma montanha de dinheiro e uma gestão extremamente eficiente, leva tempo. E esse talvez seja o único insumo que Nelson Teich não tenha nesse momento da crise da covid-19. E talvez nem Bolsonaro esteja disposto a lhe dar.

 

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