No ano que vem o governo de Pernambuco precisará gastar R$ 3,197 bilhões do dinheiro do contribuinte para completar as aposentadorias de seus servidores. Esse é o valor da diferença entre as contribuições que eles pagam (14% sobre o seus vencimentos) mais 28% que o Estado paga na condição de empregador.
O contribuinte vai continuar a pagar mais do que o Estado está contribuindo com o sistema previdenciários de seus servidores públicos. O valor de R$ 3,197 bilhões é 8,08% do orçamento do Estado para 2021. E a conta não deve parar de subir pelos próximos 20 anos, quando deve atingir R$ 5 bilhões para, então, começar a baixar.
Pernambuco é um dos estados brasileiros que, daqui para frente, mais precisará destinar dinheiro do contribuinte para cobrir o déficit previdenciário. Sem um programa de reforma de seu modelo de financiamento das aposentadorias, o Estado só começou, este ano, a tomar ações para mudar trajetória de insuficiência de fundos para pagar as aposentadorias de seus empregados que, diferentemente dos trabalhadores do setor privado, se aposentam (em média) ao 62,6 anos, os homens e 52,9 as mulheres. E mais ainda, em relação aos militares que (em média) se aposentam aos 56,1 anos os homens e 51,6 anos as mulheres.
No caso dos militares, a progressão das aposentadorias fará com que todo oficial seja aposentado como coronel, recebendo pelo topo da carreira. Da mesma forma que os praças possam se aposentar, no mínimo, como sub-oficial. Apenas o déficit previdenciário dos militares, a preços de 2020, é de R$ 27,05 bilhões.
Mas além disso, Pernambuco tem outros riscos contratados. Como o caixa é único, importa pouco se o servidor está lotado no Executivo, Legislativo ou Judiciário. Ou se trabalha numa empresa estatal que não gera receitas suficientes para se sustentar. No final da carreira, ele estará no guarda-chuva do Estado, absorvendo as vantagens que obteve ao longo da carreira, mesmo que isso ultrapasse o teto constitucional, como é o caso de magistrados.
Isso inclui os salários do juízes, membros do Ministério Público, Tribunal de Contas e do Legislativo, que formam um grupo de elite no setor público e que se aposenta com salários no topo da carreira.
A questão do déficit previdenciário - estimado no OGE 2020 em R$ 92,03 bilhões - foi um tema que não foi abordado de frente no primeiro mandato do governador Paulo Câmara, que é auditor do Tribunal de Contas do Estado.
O governador sofreu pressões da própria equipe formada, em sua maioria, por servidores que estão no grupo considerado de elite do setor público do Estado e que resistiram a ações mais efetivas. Com a reforma da previdência pelo Congresso começou a se mexer.
Também houve pressão dos sindicatos de servidores, especialmente os da carreira de Estado como policiais civis e militares. Desde 2018 que o Estado deixou de incluir no projeto da LDO os relatórios que informavam os valor médios das aposentadorias dos poderes, onde ficava evidenciado os custos para os contribuintes.
Analistas previdenciários lembram que essa é uma conta hoje estimada em quase R$ 100 bilhões e vai subir independentemente da ação de qualquer governador que administre o Estado. Salvo se forem tomadas, já a partir de agora, as providencias que possam mudar a trajetória de gastos com as aposentadorias dos servidores públicos. Mas é um processo de longo prazo.Vai levar uma geração.
Estado começou a mudar regime em abril
O governador Paulo Câmara deixará um marco no setor previdenciário. A partir de 1º de abril, todos os servidores contratados pelo governo do Estado já serão admitidos submetidos às regras do regime fundo de capitalização coletiva. Foi a primeira mudança no sentido de reduzir o déficit, ao substituir o regime de capitalização simples.
Em 2021, o Estado terá que bancar R$ 3,19 bilhões relativos à diferença entre o que os servidores pagaram e o custo final do proventos. O orçamento do próximo ano estima um déficit previdenciário de Pernambuco em R$ 92,30 bilhões.
Segundo o diretor de Previdência Social do Funape, Maurício Benedito, o outro movimento do Estado será definir que entidade multipatrocinada vai se associar em cumprimento a nova legislação previdenciária já aprovada e que instituiu o regime de previdência complementar dos servidores sub o qual os estados devem estar adaptados em até dois anos.
A partir dessa escolha, e da aprovação de uma nova legislação, o Estado começa a seguir a legislação com a qual os novos servidores contratados serão descontados pelo teto máximo (R$ 6.101,36) do INSS. E passarão a contribuir com a diferença a maior do seu salário para a entidade multipatrocinada que o Estado selecionar.
A nova legislação ajudará os estados que não fizeram a segregação das contribuições no passado e não criaram fundações de direito privado para gerir esses recursos no mercado financeiro na chamada contribuição definida. Nesse regime, quando se aposentar, o servidor terá o dinheiro do regime próprio mais o que capitalizar no fundo.
Segundo Benedito Maurício, com a legislação já aprovada na Alepe, o Estado analisa ofertas. Ano passado, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) exigiu que os novos estados que aderirem à nova legislação terão que atingir uma escala para operar uma fundação sozinho.
A Bahia, que já estruturou a sua fundação, captou as contribuições de Sergipe e o Piauí. São Paulo está disputando esse novo mercado que terá ainda a participação de Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Petros, Previ Eletros) oferecendo o serviço. A questão do déficit previdenciário existe há mais de 20 anos. E já foi objeto de preocupação, em 2000, quando o então governador Jarbas Vasconcelos, ao enviar a LDO 2001, informou existir um buraco de R$ 427 milhões, o que correspondia a 2,03% do orçamento estadual. O texto informou uma estimativa do déficit previdenciário em 4,5% do PIB.
O texto destacou a necessidade de instituir, a médio prazo, um fundo previdenciário, o Fundo de Aposentadorias e Pensões dos Servidores do Estado de Pernambuco -Funaprev e um Fundo Financeiro de Aposentadorias e Pensões - Funafin, o que não aconteceu.
Dez anos depois, o então governador Eduardo Campos tinha um problema maior. No orçamento de 2011, o déficit foi de R$ 1,233 bilhão correspondente a 6,30% do orçamento daquele ano. O déficit previdenciário foi estimado foi estimado em R$ 24,98 bilhões.
Mas naquele ano, o OGE ainda não fazia distinção entres os déficits do pessoal civil e militar que Paulo Câmara fez e revelou um déficit financeiro de R$ 92,03 bilhões.
Militares podem garantir mais tempo como aposentados do que na ativa
O impacto das despesas previdenciárias com os militares não seria como os altos salários do demais poderes. Porque embute uma despesa que pode chegar a quase 60 anos, se contados o tempo de trabalho, os anos que o servidor militar vive após deixar a ativa e o tempo vida de seu pensionista após sua morte.
Segundo o estudo que anualmente avalia o quadro atuarial dos servidores militares, o tempo mínimo para que se possa requerer aposentadoria é de 25 anos, independentemente de sexo.
Isso faz a média entre os integrantes da força estar em 56,1 anos para os homens e 51,6 anos para as mulheres. Pernambuco tem, atualmente, 20.402 militares na ativa, 14.209 aposentados e 6.365 pensionistas. Dito de outra forma: a partir deste ano, o Estado terá mais militares e pensionistas que na ativa. Nos próximos 10 anos Pernambuco deverá aposentar 20.913 servidores militares.
Segundo o orçamento aprovado pela Alepe para 2021, a reavaliação atuarial para os militares revelou a existência de um déficit atuarial de R$ 27,05 bilhões. Em Pernambuco, os militares da ativa, aposentados e pensionista pagam 9,5% de contribuição. Ano que vem esse percentual vai passar para 10,5%. E como acontece com os servidores civis, o Estado contribui com os aportes necessários para custear a folha de benefícios.
Isso acontece porque o regime financeiro utilizado em Pernambuco é o de "Repartição Simples" para todos os benefícios. As alíquotas de contribuição são definidas a cada período, de forma a custear integralmente os benefícios. Não existem reservas, e as contribuições são integralmente utilizadas para o pagamento dos benefícios do período.
O problema é que, diferentemente dos servidores civis, a carreira militar está estruturada, do soldado ao coronel. Isso quer dizer que, ao se aposentar, automaticamente sobe um degrau na escala. Depois como a carreira está hierarquizada os oficiais naturalmente tendem a se aposentar no postos mais alto da carreira consolidando a despesa.
Ou seja, as chances de um aspirante que entra na PMPE com 18 anos se aposentar como coronel aos 50 anos é muito alta. Numa previsão simples, em breve a PMPE terá mais coronéis aposentados que na ativa como já acontece em São Paulo e Rio Grande do Sul.
Altos salários na elite dos poderes
Embora o assunto do déficit previdenciário seja um tema que esteja diretamente ligado à capacidade de investimento do Estado, um dos aspectos que mais preocupa é a questão dos chamados salários da elite do setor público. Um grupo de servidores que, naturalmente, goza de mais benefícios que os demais, especialmente o que o Executivo não tem.
Com a Constituição de 1988, o Estado brasileiro conferiu aos poderes a autonomia financeira sem relacioná-la à responsabilidade fiscal. Assim, cada poder, além do Executivo, pode definir o que fazer com o percentual que recebe todo dia 20 de cada mês.
Essa conta, porém, é debitada no Executivo e aumenta o déficit previdenciário, independentemente do esforço do governador para reduzir as despesas de pessoal. Em Pernambuco, o quadro é dramático pela diferença de salários entre os servidores pagos pelo único caixa do Executivo.
Na prática, o que se observou, depois de 30 anos de aplicações, foi uma alta concentração de despesas com salários, especialmente no poderes Judiciário e Legislativo que junta quase 10 mil servidores subordinados aos chefes desses dois poderes.
Segundo um estudo publicado no orçamento de 2019 (em 2020 e 2021 o dado ainda não está disponível), enquanto no Executivo a média de salários era R$ 4.295,98, no Judiciário subia para R$ 17.097,14 e no Legislativo, R$ 17.744,10. No Ministério Público é de R$ 25.844,71 assim como no Tribunal de Contas.
Aposentados no TCE e no MPPE custam ao Estado mais de cinco vezes que o aposentado do Executivo. No caso do TCE chega a seis vezes mais.
Um aposentado no MPPE custa, em média, R$ 26.634,86. Um do TCE custa a salários de 2018 - ano base em que a consultoria contrata trabalhou - R$ 28.591,06.
Comentários