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Luana ou Priscila - Enquanto Pazuello implora por vacina, Fábio Faria veta chinesa no 5G

Governo de Bolsonaro parece viver dupla personalidade. Ora pede vacina a China, ora veta os chineses da Hauwei no 5G.

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Fernando Castilho

Publicado em 11/03/2021 às 14:00 | Atualizado em 11/03/2021 às 14:36
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Com a entrada de Lula no cenário político, depois que o ministro Edson Fachin mandou seus quatro processos para Brasília, o governo Bolsonaro entrou numa crise existencial cruel. Como na novela Sétimo Sentido, não sabe mais se é Luana Camará ou Priscila Capricce, interpretadas por Regina Duarte, em 1982.

Para quem não viu a novela do tempo em que Regina Duarte era a namoradinha do Brasil, a atriz interpretava em Sétimo Sentido a marroquina Luana Camará, que volta ao Brasil para tentar recuperar sua fortuna roubada pela família Rivoredo. Mas, de vez em quando, “baixava o santo” em Luana e ela assumia a personalidade da falecida atriz italiana Priscila Capricce.

Ontem, depois que Lula (no estilo Capricce) fez o seu discurso, Bolsonaro que fazia o estilo Camará assumiu a personalidade da atriz italiana e mudou tudo. Usou máscara, fez distanciamento e defendeu vacina surpreendendo até mesmo do seu filho, o senador Flávio Bolsonaro que se meteu a postar foto do pai dizendo que a vacina é sua arma.

O problema desse tipo de mudança mediúnica de Bolsonaro é que não deu tempo para o pessoal se acostumar.

Uma hora Bolsonaro é Luana. Outra, é Priscila. E nem sempre dá tempo dos seus ministros entenderem quando o personagem muda de personalidade mediúnica.

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, por exemplo, disse na terça-feira que a chinesa Huawei não poderá fornecer equipamentos para a rede privativa de comunicação do governo, acirrando a disputa futura do 5G no Brasil.

Faria parecia não saber de uma carta dramática do Ministério da Saúde, que implorava que o Governo da China fornecesse vacinas, assinada pelo ministro Pazuello já no estilo Priscila Capricce.

Junto com ela, numa outra carta, o presidente da Câmara Artur Lira foi ainda mais contundente quando disse que apelava ao governo chinês, neste momento de grande angústia para nós brasileiros, para que nossos parceiros chineses tenham um olhar amigo, humano, solidário e nos ajudem a superar a pandemia, oferecendo os insumos, as vacinas, todo o apoio que este grande parceiro da China precisa neste grave momento.

O embaixador da China, Yang Wanming, deve ter se perguntado. Qual a personalidade desse governo que a gente precisa ajudar? Que país maluco onde um ministro implora vacina e o outro diz que uma empresa chinesa não pode nem disputar um contrato?

Por trás dessa posição de Faria, está um mega negócio que deve mudar o perfil da telefonia na América do Sul, envolve a implantação no novo sistema de telefonia móvel 5G e uma posição radical do presidente contra os chineses.

Para se ter uma ideia, apenas a preparação da infraestrutura para acomodar as antenas para a internet móvel de quinta geração (5G) demandará investimentos da ordem de R$ 6 bilhões, na construção de torres, postes e posteletes em fachadas e topos de prédios, segundo a Associação Brasileira de Infraestrutura de Telecomunicações (Abrintel).

Portanto, a declaração não precisava ser feita exatamente nesta terça-feira. Tanto que o deputado Fausto Pinato (PP/SP), presidente da Frente Parlamentar Brasil-China, em entrevista ao site Mobile Time, disse que ela foi inoportuna e inoperante.

Pinato é um interlocutor privilegiado do embaixador Yang Wanming, e foi um dos que articularam a entrega da carta de Lira.

Mas se a gente observar bem, até terça-feira, antes do discurso de Lula, a restrição até que fazia sentido. Naquele dia, Bolsonaro era Luana Camará que dizia que a Huawei não está apta a participar da "rede privativa do governo", como disse o ministro, em audiência pública sobre o 5G na Câmara dos Deputados.

No Congresso, Fábio Faria foi mais longe dizendo que "já são vários os países que estão fazendo redes privativas e a Huawei não entrou em nenhuma até agora."

Pegou mal porque, no mesmo prédio da Câmara, o presidente da casa Artur Lira estava implorando vacina que, como se sabe, são feitas na China numa videoconferência com Wanming.

O 5G no Brasil é um negócio de bilhões. Ele está nas mãos das empresas apelidadas de ‘torreiras’, depois que as teles – casos de Vivo, TIM e Oi – decidiram vender essas propriedades e se tornar inquilinas. A mexicana América Móvil (dona da Claro) também está criando uma empresa independente para cuidar só das torres.

Essa posição do Governo a partir de uma determinação expressa de Bolsonaro que entendeu de ter uma rede para chamar de sua, prevê umas coisas muito particulares.

Bolsonaro entendeu de querer fazer uma rede, cuja portaria do Ministério das Comunicações que estabelece que as teles deverão optar por fornecedores que atendam aos requisitos mínimos de segurança e padrões de governança corporativa exigidos no mercado acionário brasileiro.

Essa portaria exige regras de governança, transparência e visibilidade sobre as decisões da companhia. Não será obrigatório que as empresas tenham capital aberto. Dito de outra forma, a Hauwei não entra.

O curioso é que nesta quarta-feira enquanto Lula falava no Sindicato do Metalúrgicos, o diretor de cibersegurança e soluções na Huawei, Marcelo Motta, explicou numa conferência organizada pelo Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE) que não há impedimentos para a empresa em colaborar com a rede estatal.

Então, nesta quinta-feira, temos a seguinte situação. Bolsonaro, no estilo Priscila Capricce, quer que os chineses ajudem ao Brasil e nos venda vacinas. E em outra sala Bolsonaro no estilo Luana Camará, quer impedir os chineses de vender um parafuso para a nova rede privada do governo federal que deve custar R$ 780 milhões.

Difícil essa dupla personalidade do Governo de Jair Bolsonaro depois que o sedutor Rudi Rivoredo (Lula) entrou na cena política.

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