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Chamada de "A pátria de chuteiras", seleção brasileira sempre esteve ao lado do poder

Os jogadores de 2021 não inovam. Outros convocados fizeram no passado. Porque a Seleção Brasileira sempre foi um objeto de manipulação política

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Fernando Castilho

Publicado em 09/06/2021 às 21:00 | Atualizado em 09/06/2021 às 23:23
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Redigido por assessores de imprensa - que agora todo jogador de futebol tem - o manifesto dos jogadores da seleção brasileira dirigido “para os mais de 200 milhões de torcedores” expondo sua “opinião quanto a realização da Copa América” não surpreendeu. Até porque como eles mesmo dizem já na primeira linha, “quando nasce um brasileiro, nasce um torcedor.” E porque todos que ali estão sonharam vestir a camisa desde que deram os primeiros chutes.

Eles se explicam dizendo “que em nenhum momento quisemos tornar essa discussão política” como se isso fosse possível. Toda posição que tomassem, diante do contexto em que a realização da Copa América foi tomada, seria política.

Porque o Governo brasileiro tomou uma decisão política. Exatamente porque sabia que eles jamais se recusariam a não participar da competição.

A sua posição, a despeito das afirmações de que estão “insatisfeitos com a condução da Copa América pela Conmebol, fosse ela sediada tardiamente no Chile ou mesmo no Brasil” não surpreende.

Os jogadores de 2021 não inovam e não fazem diferente do que outros convocados fizeram no passado. Porque a Seleção Brasileira sempre foi um objeto de manipulação política.

Desde Vargas, passando Emílio Médici e seu radinho de pilha Motorádio cuja fábrica não existe mais, passando por FHC e Lula, em algum momento, a vitória da seleção de futebol foi capitalizada pelo Governo do momento. João Havelange e Heleno Nunes eram tão alinhados com os governos militares como são Ricardo Teixeira e Rogério Caboclo com Bolsonaro.

Nelson Rodrigues cunhou a expressão "A seleção brasileira é a pátria de chuteiras" e a literatura e filmografia estão repletos de exemplos de textos e filmes de adversários dos governos que na hora de um jogo de futebol mandaram às favas os compêndios de sociologia política e marxismo para gritar gol.

Portanto, a única diferença entre Jair Bolsonaro e Emílio Médici é que o general sempre apareceu de paletó e gravata torcendo pelo Brasil, enquanto o presidente não toma o cuidado de, ao menos, vestir os modelos oficiais da CBF e assim desestimular a pirataria que existe em torno dos uniformes.

Talvez possa se dizer que o diferencial de Bolsonaro é que ele e seu grupo se apropriaram da camisa verde amarela que todos os brasileiros se orgulham de usar nos dias de jogos. É que agora vesti-la significa apoio ao presidente e seu Governo. Milhões de torcedores se sentem constrangidos. Mesmo os que não se alinham integralmente com o atual Governo.

Esse prejuízo ao extraordinário mercado de camisas será, por muitos, atribuído a Bolsonaro a jugar pela queda nas vendas de camisas da seleção.

Mas é sempre ter presente que a seleção sempre foi usada pelo governo da ocasião e não adianta muito ex-jogadores na condição de comentaristas bradarem que os jogadores teriam que fazer diferente.

Eles não tem essa consciência. Jogadores com a informação de Sócrates, que era médico, não são a maioria e muito menos desse grupo que nem vive no Brasil.

Imaginar uma rebelião com a recusa e pedido de desconvocação não impediria a realização do evento. Muito menos seria possível pensar que a CBF convocaria outro técnico capaz de chamar apenas jogadores alinhados. Não se pode exigir de alguém aquilo que ele não pode dar.

Então, a questão é como o Governo pode capitalizar esse evento e se isso pode ajudar na melhoria da imagem de Bolsonaro e sua tese de imunidade de rebanho via contaminação de todos, naturalmente com a morte de milhões que, como se sabe, o Governo trata como danos colaterais.

Os jogadores e seus assessores de imprensa sem esforçam para dizer que concordam que “os fatos recentes nos levam a acreditar em um processo inadequado em sua realização”, mas daí a achar eles se recusariam a participar do torneio é ir longe demais.

No fundo, essa seleção (como aliás o fizeram todas as demais), estarão no Palácio do Planalto na recepção que o presidente Bolsonaro sonha em fazer se ela for campeã. Farão exatamente como fizeram as que tinham Dario, Carlos Alberto, Pelé e tantos outros.

Com afirma Nelson Rodrigues a seleção é a pátria de chuteiras. O que torna a atual diferente nas fotos oficiais é o apoio que alguns dos seus integrantes já manifestado anteriormente em suas contas pessoais nas redes sociais. Mas nem mesmo quanto a isso eles serão originais.

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