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Médico bolsonarista admirador de Olavo de Carvalho, Hélio Angotti Neto procura provocar um debate que chame atenção para seus trabalhos como medico escritor na área de bioética

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Publicado em 24/01/2022 às 11:00 | Atualizado em 24/01/2022 às 15:39
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A comunidade médica se sentiu ultrajada depois que o Professor Doutor Hélio Angotti Neto Secretário Nacional de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde do Brasil escreveu uma Nota Técnica desconsiderando um terabyte de estudos internacionais sobre a inutilidade do uso de medicamentos como os prescritos no que a imprensa chamou de Kit Covid.

Ele escreveu que “do ponto de vista bioético e humanístico” é preciso utilizar “todos os recursos que mostrarem um nível aceitável de segurança junto a uma expectativa de bem para o paciente”. Menciona também que o trabalho das diretrizes deve ser “periodicamente revisto e atualizado”.

É compreensível. Depois de dois anos dentro de UTIs, perdendo paciente e tendo que fazer vídeo chamada de gente que dificilmente sairia da intubação é um soco no estômago que um oftalmologista que, certamente, nunca entrou numa UTI de Covid 19, para um plantão de 24 horas durante a pandemia, escrever um parecer questionando tudo que a prática médica intensivista avançou depois de dois de milhões horas de trabalho real.

Mas o que o Professor Doutor Angotti não está interessado nisso. E a expressão "do ponto de vista bioético e humanístico” foi colocada para tentar chamar o debate de seus colgas para um tema que vem tratando em seus livros e pelo qual tem todo interesse em polemizar. E uma análise da sua vida profissional é possível que ele é dado mais aos textos do que aos prontuários.

No cargo desde o ano passado ele preferiu se alinhar ao receituário médico prescrito pelo presidente Bolsonaro do que aos colegas de profissão. Até porque, diferentemente, do ministro não houve muito interesse em saber de seus trabalhos. Na verdade, sua biografia foi carimbada como um epiteto de “medico bolsonaristas admirador de Olavo de Carvalho”.

Angotti está no grupo dos que não frequentam a elite da medicina no Brasil. O que não quer dizer que não tenha capacidades. Seu currículo é cheio de citações, mas o seu forte é a participação em conselhos. Nisso ele de fato é muito ativo. Exatamente porque neles tem acesso a informações de qualidade para os seus trabalhos escritos.

E ele não está naquele grupo de lunáticos que fora da prática médica escreve teorias da conspiração universal sobre o futuro da medicina. O seu nível é muito superior. 

Angotti tem sim embasamento. Talvez até mais que Marcelo Queiroga. Na publicação acadêmica certamente sim. Ele é autor de uma trilogia intitulada Disbioética em que critiva a "vertente secularista anticristã agressiva defendem a escravidão espiritual de médicos e demais profissionais da saúde".

Ele tem livros polêmicos sobre, mas não é um sujeito que não tem o que dizer. A luz de sua concepção de mundo ele tem escritos e pode argumentar sobre temas sobre a morte. O mais recente A Morte da Medicina foi que serviu para justificar seu parecer surgiu do espanto, do choque em constatar os caminhos que as ideologias estão a arrastar a tudo e a todos.

Angnotti diz no livro que “A Medicina, como ciência, deveria estar de fora de quaisquer tentativas de manipulação político-ideológica, que são sempre justificadas através de argumentações absurdas e totalmente anti-científicas.

O problema do professor Angotti é que ele parece não ter aquela vivência hard core de atendimento de centro de terapia intensiva que exige mais improviso e capacidade de gestão de crise cuja consequência é morte que ele tanto trata nos seus livros. O campo de trabalho dele é aquilo que na academia chama-se “Pesquisador 4x4” para definir o sujeito que trabalha textos em cima do trabalho de campos de outros pesquisadores.

Talvez o maior problema de Angotti seja a enorme vaidade com seu currículo Lattes, sua atenção às mídias sociais e mais recentemente seu alinhamento com o escritor Olavo de Carvalho.

E na portaria ele faz questão de ser provocativo. De buscar incendiar o debate que lhe interessa muito. Ele diz que existem “possibilidade de falhas metodológicas inadequadamente avaliadas, resultados das consultas e audiências públicas, e também falta de consenso do plenário da Conitec"

Os membros do Conitec devem ter tido uma sincope ao ler o texto: “Falhas metodológicas?” Quem inventou essa leseira de “das consultas e audiências públicas” foi Marcelo Queiroga para atender a uma determinação de Jair Bolsonaro.

No mundo real que cuida de gente em fase terminal e passou pelo que o mundo passou em dois anos não é razoável aceitar provocações de alguém que assine um texto, como a portaria que Angotti assinou.

Salvo se não tiver o objetivo de virar centro de atenção na mídia ainda que isso não lustre o currículo de ninguém entre os mestres da medicina internacional.

Portanto, Angotti sabe o que quer, o que deseja e o que isso vai ajudar na sua vida depois do Governo Bolsonaro. O secretário trabalhou cada palavra de sua resolvi mirando estar no centro de um debate que não ajuda a ciência, a projetada muito.

Ele também sabe terá o apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM) que com seu silencio, se tornou um bastião da defesa de uso do kit Covid, ineficaz contra o coronavírus, em pacientes ambulatoriais.

O secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto trabalhou duro no documento de 45 páginas. Se preparou para o debate já que hoje ninguém discute isso e até mesmo a portaria perdeu sentido já que os protocolos de atendimento a covid-19 nem mais falam disso.

Portanto, essa é uma provocação midiática que interessa muito a um professor que se diz interessado na pesquisa em Ciências Médicas, Órbita, Retina, Catarata, Neuro-Oftalmologia, Filosofia da Medicina, Educação Médica, Humanidades Médicas e ... Bioética.

Ativo nas mídias sociais ele se descreve como “cristão, pai de família, médico, gestor, escritor e pesquisador”. Então o que o professor gostaria mesmo seria de ser convocado e ter um espaço em rede nacional de através de seu conhecimento teórico da servir ao governo Bolsonaro.

No seu livro ele diz que a Medicina “corre sério perigo de se tornar apenas um instrumento de engenharia social para atender às demandas puramente ideológicas de uma revolução cultural e ética destinada a modificar valores, atitudes e comportamentos”.

Ele tem razão. Especialmente quando atende “às demandas puramente ideológicas” como está escrito nas páginas da portaria que ele assina.

Talvez o mais adequado fosse simplesmente ignorar a portaria e seguir o que já está se fazendo no mundo real dentro dos hospitais.

Mas a classe política não vai perder essa oportunidade em função das eleições o que para o professor Andotti será muito bom. Para seu currículo, é claro.

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