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Energia solar vira negócio da moda no Nordeste e todos querem produzi-la

O Brasil tem 860 mil residências e empresas com placas fotovoltaicas nos seus telhados. Mas benefício de não pagar tributos vai acabar em 2023.

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Fernando Castilho

Publicado em 27/03/2022 às 7:00 | Atualizado em 27/03/2022 às 10:31
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Nos últimos anos, quando a conta de energia elétrica começou a subir com maior frequência, ter um sistema doméstico de geração fotovoltaica virou uma espécie de onda para milhares de consumidores que passaram a ver na possibilidade de produzir sua própria energia uma forma de economizar na conta mensal e até vender o excedente à distribuidora transformando o que era despesa num investimento ambientalmente correto.

O Brasil fechou fevereiro com 860 mil residências e empresas com placas fotovoltaicas nos seus telhados enquanto surgiu um meganegócio que, a cada dia, descobre uma forma diferente de remuneração que vai do sistema simplificado doméstico instalado em duas semanas, financiado em até 36 meses com juros subsidiados, a grandes parques instalados em áreas que anteriormente não se prestavam à agricultura e que exigem bilhões dos investidores.

O benefício de não pagar uma série de tributos vai acabar em 7 de janeiro de 2023 e alguns estados também estão revendo a política de incentivos fiscais para os grandes e médios produtores porque energia elétrica virou um elemento de aumento de receitas de ICMS. Mas ainda é um negócio de alta remuneração de capital.

 

ARTES JC
Energia solar mais competitiva - ARTES JC

  

MODELOS DIFERENTES

Hoje o mercado tem vários tipos de investidores lderado pelas empresas constituídas para operar grandes plataformas com milhões de placas fotovoltaicas, financiadas tanto por investidores diretos como por fundos de investimentos específicos para energia renovável.

Abaixo, existe o modelo de associação de consumidores e investidores onde quem consome põe dinheiro numa empresa que opera parques solares, compra energia deles e remunera os sócios abatendo o seu consumo.

Existe o modelo de cooperativa onde o cliente, sem investir, entrega a conta a uma gestora e ganha um desconto de até 15%, podendo sair do grupo a qualquer momento.

Também existe o modelo de negócio onde uma empresa contrata uma gestora para operar um parque próprio com tamanho suficiente para suas necessidades com o objetivo de usar o fato no marketing institucional e se declarar carbono zero.

E o modelo tradicional de produzir em cima do telhado e conectar essa produção à distribuidora pagando parte ou todo o investimento com a redução da despesa na conta mensal.

O discurso de economia com postura ambientalmente correta está em crescimento. Indústrias de bebidas, marketplace de várias áreas, empresas de varejo e até construtoras incluíram a produção de energia solar nas suas estratégias para aproveitar a onda de incentivos.

 

REPRODUÇÃO
FUTURO Expectativa é a de que o mercado continue aquecido - REPRODUÇÃO

 

MERCADO CORPORATIVO

No mercado corporativo, o crescimento foi tão grande que a Aneel ampliou os leilões de solar. Ano passado, a matriz solar no nosso sistema geral de transmissão de energia administrado pela Operadora Nacional do Sistema elétrico (ONS) foi a que mais cresceu; e já participa com 14GW captando investimentos de R$ 74,6 bilhões.

Produzir e vender energia solar se tornou um negócio tão interessante que os antigos investidores decidiram fixar placas solares entre as torres eólicas, combinando o investimento.
É mais fácil, as licenças ambientais saem rápido, o aluguel da terra é mais barato por apenas incluir mais um uso de uma área já destinada a geração, além da gestão poder ser compartilhada.

Finalmente, as próprias empresas geradoras estatais e privadas - que já haviam entrado no negócio de eólica - passaram criar negócios apartados de sua estratégia principal, as Sociedades de Propósito Específico (SPE), para operar parque solares.

O caso mais radical é o da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), que desenvolveu parque solar na lamina d’água no Lago de Sobradinho.

A questão da energia solar ficou tão importante que a colocação de placas fotovoltaicas ao longo das áreas de servidão do projeto da transposição das águas do Rio São Francisco entrou no planejamento da Chesf, que deseja usar a área para um conjunto de parques solares conectado à rede de transmissão da estatal.

 

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MARCO REGULATÓRIO Novas regras que gerem os sistema de energia renovável foram sancionadas este mês, com medidas que podem encarecer o consumo dos pernambucanos em 32% - DIVULGAÇÃO

 

TRANSPOSIÇÃO SOLAR

O novo negócio se tornou viável depois que a Chesf passou a ser a fornecedora de energia para o projeto, que necessita de 85 MWmédio que a Chesf vende ao custo de R$ 80,00 o MWh a partir de seu parque de geração no próprio Rio São Francisco.

O negócio é bom, mas parece que não disseram a muita gente que instalar um conjunto de placas solares é apenas comprar, instalar, gerar e esquecer. E muita gente não sabe que dentro do sistema tem um componente chamado capacitor, uma das peças mais caras para o sistema, cuja vida útil é de cinco anos, podendo chegar a oito e até dez anos nos modelos mais sofisticados.

Isso quer dizer que o investidor precisa se preparar para essa despesa. E lembrar daquela sábia lição ensinada no Nordeste, que tem a maior insolação média anual para fotovoltaica: Rapadura é doce, mas não é mole.

DESCONTO SEM INVESTIMENTO

 

Foto: Leo Caldas / Divulgação
Eugênio Barros, diretor do Grupo Referencial - Foto: Leo Caldas / Divulgação
 

A briga no mercado para trazer clientes e investidores está ocorrendo em todos os níveis do segmento e com ofertas tentadoras. Em alguns estados, empresas estão oferecendo o serviço com a opção de que, após cinco anos, o cliente passe a ser dono dos painéis fotovoltaicos.

O empresário Eugênio Barros, do Grupo Referencial, que atua na prestação de serviços de construção e manutenção de redes elétricas para grandes distribuidoras e na construção civil imobiliária, desenvolveu um novo modelo de negócio onde o cliente entrega sua conta de energia, tem até um desconto de 15% na fatura.

Ele poderá sair do grupo sem custo a qualquer momento. A empresa está construindo sistemas de até 1MW que podem ser compartilhados depois de um projeto piloto em Serra Talhada.

Eugenio chama atenção para uma informação importante. Os grandes projetos, alguns até ancorados na captação de fundos, raramente falam dessa atualização nos seus planos de negócio a partir da atualização dos sistemas.

Isso quer dizer que muita gente, encantada com o discurso, está inserida no contexto de estar ambientalmente correto, mas não sabe que daqui a poucos anos poder ser surpreendida com capital, para substituição de capacitores.

O modelo de negócios da Referencial, por não transformar o cliente em dono do empreendimento, sendo uma espécie de cooperado, prevê que no caso da modernização dos sistemas, a empresa ficará responsável por isso, garantindo o contrato.

Além de não exigir aporte de capital na partida do cliente. Eugênio Barros aposta que o modelo poderá ser um sistema de sucesso porque não exige o aporte de capital do cliente num sistema doméstico próprio, além de oferecer suporte técnico.

PLACAS NO MEIO DO SERTÃO

 

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Luiz Carlos Silva, Estácio Vieira Filho e Tiago Maranhão Alves da Solar Américas. - DIVULGAÇÃO

 

No final de 2020, o engenheiro Tiago Maranhão Alves e o físico e investidor em Venture capital Luiz Cláudio da Silva fundaram em Londres, na Inglaterra, onde vivem atualmente, a Solar Américas Capital. Sua empresa foca num novo tipo de comercialização de energia solar. Construir, adquirir e consolidar no Brasil ativos solares em mercados emergentes por meio de estruturas de capital que incluem o cliente no modelo de investimentos.

Os dois empresários viram um mercado por descobrir. Empresas que não têm recursos nem interesse em construir e gerenciar parques eólicos, mas também não desejam apenas trocar de fornecedor de energia, ainda que isso possa reduzir a conta de luz das suas plantas, galpões e sedes espalhadas pelo País.

A companhia mira um portfólio de 2 GW até 2026. Esse mercado é bem interessante. Empresas estão cada vez mais interessadas em associar seu nome a plantas de geração eólica e solar, enquanto reduzem suas despesas de energia que, ano passado, teve forte alta. Mas veem oportunidades.

O que a Solar Américas propõe é permitir que investidores possa fugir das ofertas das grandes empresas, interessadas em vender grandes blocos de energia, ancoradas no discurso verde e de integração ao futuro padrão ESG, afirma Tiago Maranhão Alves.

Ele atraiu para a companhia executivos do setor público, Leonardo Cerquinho (Suape) e Paulo Guimarães (BNDES), além de executivos de grandes empresas e finanças, como Leonardo Teixeira, Rebecca Bezerra, Besma Bourjini e Bruno Didier. Este é um negócio que está ficando com grandes números.
Segundo a Absolar, que reúne os produtores de energia fotovoltaica, existem hoje em carteira 39,7 GW outorgados, que vão exigir R$ 148 bilhões em investimentos, quase três vezes mais que o atuais 14 GW já em operação.
Todos os estados, com exceção de Sergipe, têm projetos de parques de energia solar. Fora da região, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais são os únicos que tem projetos.

Ou seja, esse é um novo negócio do Nordeste. No Brasil, mais de um milhão de sistemas já recebem créditos por geração solar.

JUNTANDO PLATAFORMAS

No próximo dia 27 de maio a Aneel promoverá um leilão com 1.894 projetos cadastrados na Empresa de Pesquisa Energética (EPE), capazes de gerar até 75,2 mil megawatts (MW) de potência.

Só os projetos eólicos e solar fotovoltaico somam 73,2 mil MW de potência (97,35% do total. Os projetos hidrelétricos, têm 976 MW e os de termelétrica e biomassa, 1.018 MW em projetos. Os números mostram a onda de produção de energia eólica e solar no Brasil. No ano passado, no Leilão A-5 (empreendimentos que devem entrar em operação daqui a cinco anos, daí o nome “Leilão A-5”), os projetos aprovados para solar (CE, PI e SP) chegaram a 20 de um total de 40. Os de eólica (BA, RN e PE) foram 11.

Apenas os de produção de energia solar receberão R$ 901 milhões. Os de eólica R$ 633 milhões para produzir 3.655 milhões de MWH e no caso de eólica, 3.984 MWh. Ou seja, produzir solar custa 40% mais caro que eólica. Especialmente pela necessidade forte na partida do investimento.

Mas compensa, mesmo para vender para o ONS por 15 anos. E porque podem ser combinados. Esses investimentos são os que estarão protegidos por contratos com o governo, portanto, não incluem os que estão sendo criados e desenvolvidos para serem comercializados no Mercado do Livre.

ENERGIA NO MEIO DO LAGO

 

Chesf/Divulgação
PIONEIRISMO Visando ampliar suas matrizes energéticas, a Chesf criou uma usina de energia solar flutuante no lado de Sobradinho, no Sertão - Chesf/Divulgação

 

Outra coisa interessante é que o discurso de energia renovável está levando a novas pesquisas, como a desenvolvida pela Chesf para o aproveitamento do espelho de água do Lago de Sobradinho. Em 2019, a empresa inaugurou primeira etapa da Usina Solar Flutuante instalada no Reservatório da Bahia.

Ela tem potência de geração de apenas 1MWp (Mega Watt pico) e está interligada à Usina. Esse é o maior projeto de Pesquisa & Desenvolvimento no País. Este ano fará uma segunda etapa, uma usina com capacidade de 2,5MW. O investimento nas duas plantas de R$ 56 milhões.

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