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Porto de Galinhas: presença da polícia na praia precisa ir além do Bope

O tráfico só se estabelece onde tem consumo e possibilidade de distribuição. O Estado como poder precisa dizer que não tolera isso

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Fernando Castilho

Publicado em 01/04/2022 às 16:20 | Atualizado em 01/04/2022 às 18:19
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A julgar pelas declarações do secretário de Defesa Social, Humberto Freire, o Governo de Pernambuco avalia que os incidentes que ocorreram nos últimos dias em Porto de Galinhas, Ipojuca, tratam-se de uma reação de traficantes que atuam na área, aproveitando-se da tragédia da morte da garota Heloysa Gabrielly, seis anos, que a polícia ainda não esclareceu.

E que essa reação deve-se à presença de policiais do Bope no combate ao tráfico, a exemplo da operação feita pela SDS na semana passada - com repercussão em outros estados.

Reconhecer que traficantes já têm capacidade de reação às ações da Polícia Militar em Porto de Galinhas é um gesto importante. Mas, certamente, não é aceitável num Estado onde a SDS afirma na sua publicidade institucional que combate firmemente o crime organizado. Porque isso embute que a polícia deixou o outro lado se estabelecer e adquirir capacidade de confronto explícito.

O secretário também insiste na afirmação de que a Polícia Militar tem presença atuante no terreno de Ipojuca e Cabo e que ali permanecerá até que a população sinta-se segura, garantindo que isso será percebido por quem vai para aquele balneário.

BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
Movimentação em Porto de Galinhas nesta sexta-feira (1º) - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

O governo, portanto, parece avaliar que a presença de policiamento ostensivo pode resolver o problema, e que os traficantes não devem mais se expor como estão fazendo. O secretário também informa que a Secretaria de Defesa Social manterá uma base para responder com mais celeridade a possíveis ações.

O governo precisa ir muito além da presença de policiamento ostensivo depois dos atos de vandalismo que foram registrados.

E talvez fosse uma boa atitude revelar que a presença da polícia nos municípios do Cabo e Ipojuca faz parte de uma operação bem maior, para que não seja percebida apenas na circulação de mais viaturas e abordagens.

As organizações criminosas que se estabeleceram desde 2018 e depois de três anos adquiriam status de controle e presença em áreas dos dois municípios, não fosse a tragédia da morte de Heloysa Gabrielly, certamente, passariam despercebidas - sem que o Governo jogasse uma luz no que acontece ali.

O tráfico só se estabelece onde tem consumo e possibilidade de distribuição. Ao que se saiba, não se produz maconha nem cocaína naquela região, o que nos remete ao fato de alguém está trazendo no atacado.

O que parece estar consolidado ali é uma presença de um corpo estranho ao aparelho do Estado, que foi crescendo sem que a polícia o combatesse e evitasse a sua consolidação.

Certamente, a polícia sabe o que acontece ali, até porque os traficantes em grupos de redes sociais não se escondem e publicam grande número de mensagens sobre suas atividades.

O Estado como poder precisa dizer que não tolera isso.

O desafio da SDS, portanto, não é mais montar operações ostensivas de modo a ser percebida pelo público externo, mas investir pesado em ações de inteligência permanentemente de modo a reduzir a influência desses grupos.

Bruno Campos/JC Imagem
Movimentação em Porto de Galinhas, dois dias após morte de criança - Bruno Campos/JC Imagem
 

Não será fácil, não vai custar barato e vai exigir determinação de ter como meta eliminar essa presença.

Isso significa descolar pessoal e gente de alto nível, porque esse talvez tenha se tornando um dos maiores desafios do Governo de Pernambuco. E vai exigir a presença de mais órgãos do Estado que apenas policiais militares fardados.

O estrago na imagem de Porto de Galinhas já está feito. Não será fácil reconstruir o conceito de um lugar paradisíaco sem que imediatamente a isso seja associado a presença de uma facção que distribui drogas no atacado e varejo. E onde já se morre em decorrência de bala perdida.

Existe muito em jogo no que acontece em Porto de Galinhas e na sua região. Existe a necessidade de preservar anos de investimento financeiro e treinamento de pessoal para se construir um destino internacional.

E nesse negócio na cabe o tráfico de drogas, morte por bala perdida e fechamento de comércio por ordem de traficantes. Até porque quando isso acontece quer dizer que a presença do Estado deixou de existir. O que não pode sequer ser pensando para Pernambuco, que precisa reconhecer que esse é um desafio necessário e que será vencido. 

 

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