Bolsonaro, Bolsa Família, auxílio emergencial

Na ilusão de mudar nome do Bolsa Família para marca de sua gestão. Bolsonaro esqueceu o principal: o dinheiro

Ninguém lembra de José Sarney pela autoria do BPC e nem se considera um eterno devedor a Lula pela instituição do Bolsa Família, embora o reconheça como autor do benefício.

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JC

Publicado em 23/06/2022 às 13:30 | Atualizado em 23/06/2022 às 14:51
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Político experiente, com décadas no Congresso, embora sem conexão com as camadas de renda mais baixa da população, o presidente Jair Bolsonaro tomou um susto, em 2020, ao ver que sua popularidade aumentou no Nordeste quando (após uma atabalhoada negociação no Congresso) aceitou pagar R$ 600 no Auxílio Emergencial.

Mas como todo novato ao tratar com esse segmento da população fez uma leitura apressada de que, se mantivesse o crédito, o apoio se consolidaria.

Seria verdade se não precisasse reduzir os valores, o público-alvo e não entendesse de querer mudar o nome do programa, especialmente para os inscritos no Bolsa Família.

Se ouvisse o pessoal técnico do Ministério da Cidadania, ainda em 2020, teria cuidado de assegurar dinheiro para o programa nos orçamentos para 2021 e 2022.

Mas ele preferiu ouvir os então ministros, Onyx Lorenzoni João Roma que entenderam que, para fixar o benefício como marca de Jair Bolsonaro, seria preciso mudar o nome para Auxílio Brasil.

Cometeram um dos mais clássicos erros de marketing e posicionamento de mercado: tentar mudar uma marca forte com prestígio em alta perente o público alvo.

Grosso modo seria como querer chamar água sanitária de Hipoclorito de Sódio. Ou passar a chamar carne de charque de Jerqed Beef. Ou ainda identificar o flanelinha como "Gestor Temporário de Patrimônio Móvel". Ninguém vai prestar atenção.

Mas os políticos que se consideram especialistas em comunicação convenceram o presidente e ele achou que poderia mudar uma marca de sucesso do Governo Lula apenas trocando o nome. O Auxílio Brasil, assim como o Casa Verde Amarela existem, mas ninguém chama pelo nome fora dos documentos oficiais.

Mas é preciso não radicalizar no conceito. Seria razoável a aquisição do novo nome se ele viesse acompanhado de mais dinheiro e que não houvesse interrupções. Aquilo que os especialistas chama de um produto melhor.

Infelizmente, a falta de articulação do Governo com o Congresso levou meses para a fixação do valor de R$ 400, em 2022, sem que isso acontecesse em 2021.

Para completar, o ministério da Cidadania entendeu de fixar uma base linear de R$ 400 sem levar em consideração o tamanho da família alvo do programa. Resultado: famílias que recebiam R$ 84 passaram a receber R$ 400. Por sua vez, famílias que já receberam pelo número de filhos R$ 285, passaram a receber os mesmo R$ 400 desequilibrando o alcance social do programa.

De uma só vez, o Governo jogou por terra toda uma estratégia histórica de benefícios que tinha o conceito de tratar diferente as famílias diferentes. Resultado: quem recebia R$ 285 não percebeu o Auxílio Brasil como um produto melhor. A inflação se encarregou de reduzir o impacto.

A nova proposta de Bolsonaro em ampliar para R$ 600 ainda este ano amplia esse espalhamento entre beneficiários e, de novo, vai exigir negociação no Congresso sem a garantia de que o público alvo vai perceber o benefício como uma decisão do Governo Bolsonaro.

O que parece claro é que o presidente e sua equipe não perceberam é o cidadão só paga, com voto, o benéfico que recebe uma vez. Ninguém lembra de José Sarney pela autoria do BPC e nem se considera um eterno devedor a Lula pela instituição do Bolsa Família, embora o reconheça como autor do benefício.

Viúvas que estão tendo sua renda cortada pela metade após a morte de seus maridos avaliam que foi a "Reforma de Bolsonaro" que lhe tirou benefícios sobre o que seus maridos pagaram ao INSS.

Isso quer dizer que, aumentar o valor do benefício até dezembro, talvez não seja percebido pelos beneficiários como uma atitude do presidente em tempo de eleição. Além disso, para os inscritos do programa esse já são direitos assegurados e que precisam apenas ser atualizados monetariamente.

E o que o gesto do presidente agora não é mais do que sua obrigação, portanto não lhe deve nada.

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