Bolsonaro vai à casa dos banqueiros e diz tudo o que eles não gostariam de ouvir
"Vocês têm que olhar na minha cara, ver minhas ações e me julgar por aí. Não assinar cartinha, não vai assinar cartinha." disse Bolsonaro
Banqueiros são senhores discretos, que usam roupas clássicas e falam baixo. Os donos das maiores instituições são quase entidades espirituais que se materializam apenas nas reuniões do Conselho de Administração para dar autorização a tudo que já foi acertado antes e conferidos pelos advogados. Não são dados a ouvir desaforos. Muito menos na sua casa.
Mas foi o que eles ouviram na tarde desta segunda-feira (8), quando o preesidente Jair Bolsonaro foi à sede da sua entidade, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), almoçar com um grupo restrito de representantes do setor disposto a dar um recado que certamente a casa nunca tinha recebido, muito menos no tom em que ele falou.
Certamente, a maioria dos presentes precisou de um sal de frutas para digerir o que Bolsonaro, sem meias palavras, disse.
Segundo relato de interlocutores, o presidente da entidade, Isaac Sidney, disse que o setor é comprometido com o País, não gosta de juros altos, quer previsibilidade na economia e diálogo com o governo e levantou a bola para o presidente dizendo que “sinta-se à vontade, Presidente, para colocar a sua visão na forma e no tempo que lhe convier”.
O que ele não contava é que Jair Bolsonaro entrasse, literalmente, rasgando.
“Alguém recontrataria empregado que roubou sua empresa no passado? Acho que não” numa referência ao candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva.
“Alguns acham que o canalha que estava preso vai voltar para não continuar o que estava fazendo?” continuou enquanto os comensais bebiam agua. E continuou perguntado: “Como banqueiros estão se sentindo na Argentina neste momento?
O presidente não ficou apenas na critica a vizinha Argentina e a ascensão da esquerda no Chile e na Colômbia.
E antes que os garçons servissem a entrada abriu a caixa de ferramentas. “Vocês têm que olhar na minha cara, ver minhas ações e me julgar por aí. Não assinar cartinha, não vai assinar cartinha.”
Uma coisa pode-se de Bolsonaro. Ele não pensa duas vezes quando parte para o ataque. Não tinha discurso preparado. Ele foi falando que tinha listado para dizer aos banqueiros.
Certamente não foi uma boa ideia para a entidade abrir espaço para Bolsonaro quando a maior parte da classe está muito mais preocupada com o que Lula deve falar no mesmo recinto nos próximos dias. Mas não se pode dizer que o presidente não foi para a sede da Febraban para dar um recado ao setor e fortalecer o discurso para sua base de que não tem e nem quer apoio de banqueiro.
Até porque na semana passada disse que o setor estava com raiva dele porque com o PIX os bancos perderam R$ 20 bilhões em taxas de serviços. O PIX de fato retirou as despesas de TED e DOC dos bancos.
Mas certamente essa não foi uma receita que as taxas de juros não a substituíssem. Imagina se banco depende de receita que o PIX extinguiu?
Mas Bolsonaro foi à casa dos banqueiros com faca nos dentes: “Me chamem de qual quer coisa, até de incompetente. Agora, tenho caráter. Minha vida é vasculhada 24 horas por dia e não se acha nada”.
Os comensais convidados por Isaac Sidney depois de horas de análise de nomes devem ter sentido bem constrangidos.
O presidente até pediu que os bancos baixem os juros dos empréstimos consignados. Especialmente para os beneficiários do Auxílio Brasil, que ele aumentou o valor pago para R$ 600, que em alguns instituições chega a 78% ao ano.
Na verdade, grande número de especialistas apontam para o risco de que esse tipo de endividamento agravar a situação de pobreza dos beneficiários, já que eles poderão comprometer até 40% do valor-base do benefício (R$ 400) com as parcelas.
E já se sabe que os megabancos como o Bradesco, Itaú, Santander e Nubank já decidiram não oferecer o crédito. A recusa do mercado vem após o governo lançar a iniciativa sem, por exemplo, colocar um limite à taxa de juros a ser cobrada o que certamente reduz o alcance da oferta do crédito.
Mas o presidente não poderia perder a oportunidade de fazer elogios ao seu governo e falou os programas como o Auxílio Emergencial, do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm) e do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).
Bolsonaro até comeu alguma coisa. Mas não respondeu a perguntas. Até porque pelo que se sabe ninguém quis fazer qualquer contraponto.
No final da tarde a Febraban, publicou uma nota dizendo que no “âmbito de sua governança interna, por maioria, deliberou por subscrever documento encaminhado à entidade pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), intitulado “Em Defesa da Democracia e da Justiça”.
Como se disse no começo banqueiros são senhores discretos e não entram em polêmica