Caos no Sistema Penitenciário de Pernambuco desafia futuro governo de Raquel Lyra
População carcerária explodiu durante a gestão do Governador Paulo Câmara, que entregou menos de 1 mil vagas em oito anos
O Governo do Estado está informando que vai retomar a licitação para início das obras de conclusão de dois presídios em Araçoiaba. A licitação estava suspensa, mas foi retomada pelo Governo do Estado. A informação foi publicada na quinta-feira (17) no Blog de Jamildo.
É uma providência importante, embora venha com anos de atraso pela inação do próprio governo estadual, que simplesmente vem ignorando a dramática situação dos presídios de Pernambuco, especialmente depois da saída do secretário de ressocialização Pedro Eurico.
Pernambuco tem atualmente uma das piores gestões do sistema penitenciário, com quase 50 mil presos, ao mesmo tempo em que viu sua população carcerária explodir durante a gestão do Governador Paulo Câmara, que entregou menos de 1 mil vagas em oito anos.
Uma das coisas que mais chama atenção com a falta de atenção com os presídios é que, no orçamento de R$ 5 bilhões de investimentos, não há recursos para ampliação da capacidade e melhoria das condições de vida nas unidades prisionais.
A questão dos presídios de Pernambuco foi objeto de uma força-tarefa liderada pela Corregedoria Nacional de Justiça e pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), que visitou Pernambuco no mês de agosto e não viu nenhum avanço da melhoria da gestão.
A comissão inspecionou presencialmente 16 unidades prisionais do estado, que tem uma população carcerária de cerca de 49 mil pessoas e esteve no principal complexo prisional de Pernambuco, o Complexo do Curado, liderada pela corregedora nacional de Justiça, ministra Maria Thereza de Assis Moura.
O resultado foi constrangedor para o Governo do Estado, com a ministra cobrando diretamente ao governador Paulo Câmara as ações que ela mesmo tinha acertado com ele e que não forma feitas.
DESAFIO PARA GOVERNO RAQUEL LYRA
Melhorias no sistema vêm sendo cobradas especialmente pela futura vice-governadora, a Priscila Krause (Cidadania), que no final de 2021 acusou o Governo de Pernambuco ser obrigado a devolver "até R$ 42 milhões para obras de complexo penitenciário em Araçoiaba, inacabadas há 6 anos".
São essas obras que o governo agora tenta finalizar as licitações.
Após a visita da comissão, a irritação da corregedora Nacional de Justiça, ministra Maria Thereza de Assis Moura com a gestão dos sistema penitenciário era tão grande que ela determinou que o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), em oito meses reduzisse em 70% a população do Complexo Prisional do Curado, no Recife, uma das maiores unidades prisionais do país.
A medida prevê a redução da lotação do Curado, que era de 6.508 pessoas quando foi iniciada a correição extraordinária da Corregedoria Nacional de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na justiça criminal e no sistema prisional de Pernambuco. A previsão é que pouco mais de 4,5 mil homens deixem a unidade.
O quadro de violações aos direitos humanos cometidos no Curado inclui, entre outras, pavilhões onde pessoas são forçadas a dormir no chão por falta de celas, abrigadas da chuva por pedaços de lona. Os temporais de maio e junho em Pernambuco causaram a maior catástrofe natural em Pernambuco desde 1966, matando pelo menos 130 pessoas em deslizamentos e afogamentos – em julho, novas chuvas deixaram 10 mil pessoas sem casa.
Segundo a ministra Maria Thereza de Assis Moura, todas as unidades da Justiça criminal de Pernambuco também deverão regularizar o andamento dos processos referentes a pessoas privadas de liberdade por mais de 100 dias, informando ao CNJ quem são essas pessoas e qual a situação processual de cada uma delas.
Os acusados de crime que estão no presídio sem terem sido julgados representam mais da metade (56%) da população do Complexo do Curado, o que equivale a 3,6 mil dos 6,5 mil presos no local.
A realidade do Curado se repete nas demais unidades prisionais de Pernambuco, onde, de acordo com os resultados preliminares da correição extraordinária nas varas criminais e nos sistemas informatizados do TJPE e no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), foram identificadas 13.560 pessoas presas provisoriamente, sendo que, destas, apenas 1.926 dentro do prazo legal, ou seja, há menos de 90 dias.
RESPOSTA DO GABINETE DE CRISE
O gabinete de crise do Complexo Prisional do Curado, emitiu resposta sobre a matéria. Confira na íntegra.
1 . A situação do sistema penitenciário do Estado de Pernambuco, de fato, é dramática. Trata-se de uma realidade que existe há décadas e semelhante a de muitos outros Estados. Em razão disso, o Estado Brasileiro foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2018;
2 - Desde 23 de agosto de 2022, após correição extraordinária da Corregedoria Nacional de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na justiça criminal e no sistema prisional de Pernambuco, porém, várias providências foram tomadas pelo Gabinete de Crise do Complexo Prisional do Curado. O grupo é formado pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, Corregedoria Geral da Justiça (CGJ), Procuradoria Geral de Justiça, Defensoria Pública, Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) e Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos. Em três meses foi feito mais do que em uma década. Algumas medidas tomadas desde agosto passado:
- Concurso público para contratação de 1.333 policiais penais (em andamento);
- Número de tornozeleiras eletrônicas aumentou de quatro mil para 8.400 equipamentos.
- Foi aprovado também o Projeto de Lei Complementar 3.673/2022 que prevê o aumento de dois para quatro mil policiais penais.
- Foram empossados 28 novos defensores públicos e, pela primeira vez, a designação desses profissionais para cada uma das unidades prisionais do Estado.
- Quanto ao Complexo Prisional do Curado, local de inspeção do CNJ, há cerca de cinco mil pessoas privadas de liberdade, quase 1.500 a menos desde a visita do CNJ, em agosto de 2022.
- No Complexo também está em andamento a requalificação do Presídio Frei Damião de Bozzano (PFDB).
- O sistema prisional de Pernambuco registra cerca de 33.100 pessoas privadas de liberdade.
3 - No que compete ao Poder Judiciário, várias medidas também foram tomadas. São elas:
- Para agilizar a tramitação dos processos, o TJPE solicitou à Secretaria Executiva de Ressocialização levantamento de todas as pessoas privadas de liberdade nas unidades do Complexo, com detalhamento do nome, situação da prisão, ficha jurídica e varas processantes.
- A Coordenadoria Criminal do TJPE oficiou todas as unidades judiciárias com competência para matéria criminal solicitando que se abstivessem de determinar o envio de pessoas presas para as unidades do Complexo do Curado.
- O TJPE também está revisando a situação processual das pessoas custodiadas nas unidades do Curado. Quinze juízes estão trabalhando sistematicamente nessa espécie de mutirão. As Varas criminais foram reforçadas com mais servidores. Eram 231 pessoas. Agora são 282.
- No conjunto de ações promovidas, já foram analisados cerca de 1.386 processos e proferidas 390 decisões revogando prisões preventivas.
- Vale destacar que, além da atuação dos magistrados do Grupo Especial, há engajamento dos juízos criminais e promotorias criminais do Estado de Pernambuco para que, no âmbito de suas unidades judiciárias, priorizem os feitos nos quais há réu preso, estando esses custodiados no Complexo do Curado ou em outras unidades prisionais do estado.
- O TJPE também implantou regime especial de prioridade e atuação em todas as unidades judiciais de 1º e 2º graus em que haja presos com mais de 100 (cem) dias sob custódia cautelar.
- Na esfera tecnológica, o Tribunal desenvolveu uma ferramenta chamada Expedito, plataforma de automação robótica que agilizará a tramitação dos processos criminais no Estado. O Expedito, instituído e regulamentado através da Instrução Normativa Conjunta nº 12, de 13 de outubro de 2022, funciona executando atividades repetitivas que hoje ocupam vários servidores, como a enviar guia de recolhimento para unidades prisional e enviar comunicações cartorárias e bancárias de destinação de bens e ativos oriundos de atividade criminosa.