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Ucrânia resiste, há um ano, invasão que Putin programou para uma um mês

Como acontece ha seculos, a guerra é sempre uma narrativa de vencedores e a realidade cruel de quem a fez acontecer de fato.

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Fernando Castilho

Publicado em 24/02/2023 às 7:15 | Atualizado em 24/02/2023 às 7:17
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Há exatamente um ano, o mundo acordou com os primeiros bombardeios de tanques e aviões da Rússia que invadiram a Ucrânia numa invasão territorial clássica de um país vizinho por outro numa ação impensável depois do final da II Guerra Mundial embora os argumentos afirmados pelo presidente Vladimir Putin de um “operação contra nazistas” tenham sido tão absurdos quando os horrores que uma guerra convencional possa produzir.

Um ano depois, o mundo ainda não tem qualquer esperança de uma paz, viu uma escalada armamentista internacional, a ascensão de um presidente que entrara na politica após construir uma carreira de ator de humor e mudança extraordinária na economia que impactou não apenas toda a União Europeia, como em países como Brasil e, especialmente, aos Estados Unidos que tem bancado a maior parte dos custos militares.

Mas o que mais surpreende não foi a capacidade de resistência da Ucrânia, um país de rica história com a base econômica mais forte entre as antigas republica soviéticas e recriado por decisão de Lenin após a Revolução Russa de 1917. Mas como Volodymyr Zelensky foi capaz de agregar tão grande número de esforços internacionais em defesa de sua pátria após a decisão de resistir.

Brendan Smialowski / AFP
ENCONTRO ZELENSKY E BIDEN Presidente ucraniano esteve em Washington - Brendan Smialowski / AFP

A história vai registrar o extraordinário equivoco de Vladmir Putin e seus generais em programar para, no máximo, um mês uma ocupação com a deposição do governo local e sua substituição por um títere a serviço da Rússia. E vai registrar essencialmente como o povo da Ucrânia, liderado por Volodymyr Zelensky foi capaz de resistir por um ano, ainda que destruída estrutural e economicamente, a uma invasão territorial de larga escala com milhares de tanques cruzando grande áreas de suas fronteiras e como foi capaz de colocar o presidente russo na condição de déspota sanguinário.

Vladimir Putin, efetivamente, não programou, não desejou e muito menos pretendia travar uma guerra de longa duração devido ao alto custo econômico.

 

Mais do que ninguém, ele sabe que a condição de produtor de 10 milhões de barris de petróleo e gás equivalente/dia não lhe permitia tamanho esforço. E mesmo que o envolvimento de soldados fosse um elemento secundário ele não estimara o custo humano do conflito e sua repercussão internamente.

Seu projeto era de “ir ali” na Ucrânia, ocupá-la, destituir o governo, anexar a parte leste do país que é a base econômica ucraniana e mandar seus tanques voltarem “cobertos de glorias” com o discurso de livrarem a Rússia de uma ameaça nazista. Deu erro.

O comportamento patriótico de Volodymyr Zelensky usando na TV e na internet não surpreendeu apenas ao presidente russo, mas aos seus compatriotas, ao mundo de forma que a Ucrânia - com sua estrutura militar – conseguiu resistir ao primeiro mês sozinha até começar a ser abastecida pela União Européia e Estado Unidos num esforço de guerra que só não foi maior que o extraordinário deslocamento de civis para os países vizinhos e o envolvimento direto de dezenas de países com suprimentos de armas e munições.

Volodymyr Zelensky resiste, mas não devemos ter ilusões. Ele não tem como ganhar essa guerra de ocupação clássica. Assim como a Rússia de Vladimir Putin, que demonstrou uma capacidade de gastos no conflito que para a maioria dos analistas a levaria a ruína pelo nível de restrições que o mundo ocidental lhe impôs, não tem como vencer essa guerra. E se a Rússia, em algum momento, terá que negociar um paz, o mundo já sabe que a recuperação da Ucrânia vai custar caro e levará décadas iniciando-se uma nova fase da história de desconfiança mútua.

STR / UKRAINIAN PRESIDENTIAL PRESS SERVICE / AFP
ONU alerta que danificar a usina nuclear ucraniana - STR / UKRAINIAN PRESIDENTIAL PRESS SERVICE / AFP

O fato novo da segunda década do século XXI é que se descortinou um cenário geopolítico bem claro. O temor da Rússia de que a Ucrânia seja uma porta de acesso do potencial bélico da União Europeia contra seu território. Assim como a União Europeia de que a ocupação da Ucrânia seja o começo de uma escalada de retomada de países que voltaram a ser autônomos com o fim da União Soviética, liderado pela Russia de Vladimir Putin.

Isso permitiu a União Europeia tomasse consciência de que entregara uma parte grande demais à Rússia de suas fontes energéticas e que todo o discurso de energia limpa teria que ser adiado para assegurar sua sobrevivência com fontes de carbono.

E que países como a rica Alemanha mostrassem mais uma vez à História que na crise os mais ricos resolvem seus problemas primeiro. Mesmo que tenha financiado os dois mega gasodutos da Russa para a Europa. E que os Estados Unidos estão voltando à condição de polícia do mundo com sua indústria bélica que pode testar milhares de itens numa guerra real. E, finalmente, e que a ameaça nuclear passou a ser de fato uma possibilidade ainda que na condição de última solução.

Enquanto isso a Ucrânia resiste e mostra ao mundo como a diferença da infraestrutura de um país rico permitiu sua resistência e capacidade de sobrevivência numa guerra de ocupação a despeito de um astronômico custo econômico e especialmente social.

Um ano depois da invasão a única certeza é que não há perspectiva de uma resolução em pouco tempo a despeito da constatação de que essa guerra já ficou cara demais, também para a Rússia que decididamente não a planejara para durar tanto. Mas a questão é: como encaminhar uma solução?

SERGEY BOBOK / AFP
Russos vão intensificar ataques após perda de territórios conquistados nas últimas semanas - SERGEY BOBOK / AFP

Um ano depois China, vários países inclusive o Brasil, tentam uma solução para o conflito. Mas ainda incipientes.  

Enquanto isso, a população de Ucrânia paga os custos de uma tragédia humanaria com mortes, deslocamentos de pessoas destruição de histórias de vida que o mundo só conhecida nos livros de história e que viram acontecer na sua cidade. E que já deixam uma sequela enorme na expectativas de suas vidas para o futuro.

Até porque a guerra é sempre uma narrativa de vencedores e a realidade cruel de quem a fez acontecer de fato.

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Mulheres e crianças estão deixando a Ucrânia por conta da invasão russa - DIMITAR DILKOFF / AFP

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