Apesar de todo entusiasmo do governo, especialmente do vice-presidente Geraldo Alkmin, que programa fazer o lançamento na próxima semana, por ocasião do Dia da Indústria, na próxima quinta-feira (25), a indústria automobilística não demonstra animação com a proposta de lançar um carro popular com valor de até R$ 60 mil, reprisando o movimento de Itamar Franco em 1994, quando convenceu a Volkswagen de relançar o Fusca.
Um veículo que possa ser chamado de “carro popular” é o novo projeto de Lula, que instruiu o ministro do Desenvolvimento Econômico e vice-presidente Geraldo Alkmin a convencer a indústria a embarcar na ideia de um produto com essas características. Mas a indústria não tem demonstrado muito entusiasmo. O problema é que carro de entrada não deixa margem de lucro para as montadoras.
Mas parece claro que o esforço com redução de impostos por parte do governo e simplificação dos modelos do lado das fabricantes não é o que a indústria deseja. Como forma de baixar ainda mais, a proposta é de carros sem a quinta marcha opcional, usar vidros mais finos e tirar itens como retrovisor do lado direito, apoios de cabeça dos bancos e janela quebra-vento retrátil, que vão de encontro a todo o marketing das indústrias, que não têm o mesmo foco do passado.
Primeiro porque a volta do tema ganhou corpo no início de abril, a partir de uma iniciativa da Fenabrave, a associação de concessionários de veículos que tentou convencer a algumas montadoras a defender a necessidade de oferta de carros mais baratos para tentar recuperar o mercado. Portanto, essa é uma tentativa de melhorar o faturamento dos revendedores desesperados com a queda nas vendas.
Em abril, segundo dados da Anfavea, estavam nos pátios das fábricas 131.600 carros prontos e mais 72.300 nas revendas. Isso equivale a 31 dias de produção. Uma situação que mês a mês vem crescendo.
É como se, da produção do primeiro quadrimestre, um mês tivesse ficado nos pátios. E, certamente, não será a venda de carro popular que vai melhorar isso.
A indústria de hoje não aceita retirar itens que hoje são considerados básicos e que no passado eram luxo. O coordenador dos cursos da área automotiva da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Antônio Jorge Martins, advertiu numa entrevista ao Jornal do Carro (Estadão) que "Os carros evoluíram, mas não com a periodicidade de antes. As montadoras lançam novas séries a todo tempo. Por isso, hoje o consumidor exige evolução. E os carros tendem a ser cada vez mais um celular sobre rodas".
Para ele, O preço baixo não é mais o objetivo das montadoras. É um fenômeno mundial. Atualmente, o conteúdo tecnológico se tornou imperativo na disputa entre as marcas e modelos.
Tem mais, diz Martins: Não é só a alta de preços que compromete a indústria automobilística no momento. Não houve adequação ao novo nível de mercado. O custo de financiamento dos veículos novos disparou.
Ou seja, nossa taxa é mais consequência global que nacional. “O problema é que temos uma população com baixo poder de compra e um custo financeiro elevado”, sintetiza o professor da FGV.
Além disso, tem um fator determinante nessa questão: o custo do dinheiro para o consumidor comprar o carro que em 60 meses estoura o orçamento do cliente. Hoje, o consumidor está pagando taxas de 1,26% ao mês (13,73% ao ano) até 3,83% ao mês (57,01% ao ano). E mesmo que, na média, as taxas sejam de 2,05% ao mês (27,505) ao ano, como é o caso dos bancos Itaú e Bradesco, a prestação é muito alta para o cliente pagar por um carro de baixa qualidade.
Outro ponto importante é que dos 10 carros mais vendidos no Brasil, apenas o Fiat Mobi está na lista, ocupando o quinto lugar. Segundo a Fenabrave, os líderes de vendas são o Fiat Strada (R$ 112.456,00); Hyundai HB20 (R$ 96.255,00); Chevrolet Onix (R$ 85.252,00); Chevrolet Onix Plus (R$ 75.243,00) e o Fiat Mobi (R$ 72.756,00)
Nenhum desses fatores parece desanimar o governo Lula, que quer um carro para chamar de seu. Embora para algumas montadoras e para os concessionários, o tema é visto com certa urgência em um momento de queda de vendas, fábricas suspendendo a produção e sindicatos de trabalhadores temendo demissões.
Mas baixar os preços de um carro no Brasil não interessa a todas as montadoras e certamente não serão todas que vão participar. Tomando-se por base quem está no mercado dos produtos mais baratos, é possível prever que ao menos quatro montadoras possam estar nessa nova onda de carro popular.
A Renault com o seu Kwid Zen, que custa R$ 68.990; a Stellantis Fiat Mobi, que custa R$ 68.990, a Citroën com o modelo básico do C3, que custa R$ R$ 72.990, e a Volkswagen com o Gol 1.0, cujo preço é de R$ 78.160. E, talvez, a coreana Hyundai HB20 Sense 1.0, cujo preço de partida é R$ 82.290.