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Bancos brasileiros apostam na regulação do mercado de criptomoedas para escalar negócios a partir do DREX

O nome DREX possui um significado: D e R explicam uma referência ao Real Digital, enquanto a letra E vem de "eletrônico". O X é usado para passar a ideia de modernidade e de conexão do uso de tecnologia.

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Fernando Castilho

Publicado em 06/09/2023 às 15:30 | Atualizado em 06/09/2023 às 15:51
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No país que transformou o PIX no meio de pagamento instantâneo de maior sucesso no mundo, o Banco Central (BC) entendeu de transformar o DREX numa ferramenta de custo zero, fazendo o Real Digital virar uma realidade acessível ao cidadão que se habituou a usar seu smartphone como agência bancária.

Isso faz do Brasil uma das nações com maior potencial de migrar para um sistema financeiro totalmente digitalizado capaz de operar todos os serviços bancários de forma segura sem as amarras da burocracia que o correntista digital não deseja mais se submeter.

O DREX é um nome bonito que o BC escolheu para denominar a moeda digital de em banco central (Central Bank Digital Currency – CBDC em inglês), com propósitos e arranjos variados.
Pode-se dizer que o nome DREX possui um significado: D e R explicam uma referência ao Real Digital, enquanto a letra E vem de “eletrônico”. O X é usado para passar a ideia de modernidade e de conexão do uso de tecnologia. Mais moderno impossível.

Mas antes de qualquer confusão é importante não esquecer que esse tal de DREX não é uma nova moeda. É apenas a representação digital de nosso velho e querido Real.

O que o BC quer é começar um processo do que, tecnicamente, se chama de representação digital de ativos “reais” criados a partir de contratos inteligentes em redes blockchain, viabilizando funcionalidades específicas.

Redes blockchain

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O Banco Cenral trabalha na estruturação de uma mercadp de criptoativos - Divulgação

Redes blockchain (blocos) - outra palavra nova - em uma rede descentralizada por meio de criptografia. Bom, criptografia é fácil de entender porque quem usa WhatsApp sabe que aquele jeito de enviar uma mensagem sem que nenhum enxerido veja o que está escrito.

Mas voltemos ao DREX. O potencial dele é inimaginável ainda. Porque ele pode colocar numa linguagem digital acessível ao cidadão todas as relações bancárias que o cliente tem com seu banco. Isso quer dizer que o DREX será o veículo no qual uma pessoa, no futuro, poderá movimentar ativos e fazer operações num sistema seguro (até mais seguro contra criminosos em processos de lavagem de dinheiro).

Mas neste momento, o que o Banco Central está fazendo depois do lançamento do DREX é testar como ele funciona de fato no mundo real (desculpe, no mundo digital) junto com os bancos.

Na semana passada, o BC autorizou a primeira operação de dois bancos (Itaú e BTG), que estão entre os maiores do Brasil, e que estão participando dos testes com um piloto da moeda digital do banco central (CBDC) e realizaram a primeira transferência interbancária na rede do projeto.

O chefe da Itaú Digital Assets, Guto Antunes, afirmou que foi a primeira troca na câmara interbancária do real digital. Em português normal o que isso quer dizer é que, supervisionados pelo BC, os dois bancos separaram um dinheiro dentro do existente no sistema regulado pelo BC (na verdade) um depósito à vista e compram um Título Público Federal com Tokenização (TPFt).

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Itaú Digital Assets, Guto Antunes - Divulgação

Mais intermediação

Essa operação abre caminho para uma série de benefícios relacionados à eficiência que contratos inteligentes podem gerar uma infinidade de serviços financeiros podem ser desintermediados.

Calma. Não podemos esquecer que o banco vive exatamente disso: intermediação. Então, toda essa movimentação não é para tirar o banco da jogada, é para incluí-lo. Aliás, 16 bancos estão no projeto do DREX e não estão querendo deixar de intermediar operações financeiras. O que eles querem é agilizar processos, ter mais segurança e ganhar mais dinheiro com intermediação.

O que eles não estão mais interessados é só cobrar as taxas que antes se cobravam, por exemplo, nos DOC e TEDs.

Agora alguém já pensou o que o banco ganha hoje apenas com a tesouraria do PIX. Imagina o que com o dinheiro que entra na conta de seus correntistas a cada segundo o banco pode oferecer de recursos para empréstimos?

O DREX vai levar isso ao infinito e além, como diz o Buzz Lightyear do Toy Story. Dá para imaginar o nível de negócios, em tempo real, que um banco pode fazer apenas com as operações feitas em segundos?

Pouca gente sabe, mas hoje uma portabilidade de Crédito Consignado leva oito dias para ser finalizada. Imagina isso feito na hora? Imagina o potencial dos grandes bancos com grandes operações?

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Real Digital a nova moeda digital do Brasil - Divulgação


Apesar de tudo isso, os bancos estão interessados de fato é noutra coisa. Os chamados cripto ativos. Fora do meio, pouca gente sabe que o que se chama de Bitcoin é um negócio que transaciona US$1 trilhão ao redor do mundo. Como é uma operação ainda não regulada - embora alguns países estejam trabalhando nisso – estima-se que 220 milhões de pessoas façam alguma operação envolvendo criptomoedas.

O Bitcoin surgiu em 2008 como uma resposta à crise financeira, com a ideia de substituir o dinheiro físico que usamos e, principalmente, tirar a necessidade de intermediação dos bancos nas operações financeiras.

No discurso era uma espécie de revolução contra o sistema bancário global. Atualmente, todo investidor que se aproxima desse mercado e conhece o Bitcoin sabe que ele foi uma invenção de um chinês desconhecido que se identificava na Internet como Satoshi Nakamoto. Foi ele quem ofereceu e vendeu as primeiras criptomoedas Bitcoin. E virou uma lenda digital.

Mas o que se já sabe oficialmente no Brasil é que, apenas no ano passado, 3,2 milhões de brasileiros declaram que fizeram ao menos uma operação com uma dessas moedas.

E a Receita Federal sabe disso porque, em algum momento, essa transformação de dinheiro, seja ela dólar ou real numa criptomoeda, passou pelo sistema bancário. É por isso que se sabe que há 3,2 milhões de contribuintes que, em dezembro, tinham algum investimento que viram essa informação na declaração pré-preenchida do Imposto de Renda.

Mas não devemos ter ilusões. O que os bancos estão interessados é em como isso pode gerar negócios, investimentos e novos mercados. Hoje 60% de todos os negócios com criptomoedas são feitos com frações de Bitcoin. Mas existem 15 mil delas no mercado e, ao menos, outras cinco respondem por 35% do mercado. O que pode ser um bloco de ativos bem interessante.

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Thiago Mello, Group Product Manager do Banco Itaú - Divulgação

Os bancos miram os ativos “reais” criados a partir de contratos inteligentes, os tokens, ativo digital cujo objetivo primário é viabilizar transações ao eliminar a volatilidade inerente ao ambiente cripto. Normalmente via lastro em moedas fiduciárias, moeda soberana emitida em rede blockchain pelos bancos centrais de modo a capturar benefícios da tecnologia em ambiente 100%regulado.

Para Thiago Mello, Group Product Manager do Banco Itaú, é importante considerar que o bitcoin é o primeiro caso de uso a se valer da tecnologia blockchain, introduzindo os conceitos de rastreabilidade e imutabilidade aplicados a transações. Mesmo com aquele discurso de primeira tentativa de se criar uma plataforma de transações monetárias não dependentes de Bancos Centrais.

Teste com os criptos

E mesmo que ainda não tenha sido inserido totalmente no sistema bancário tem gente avançando. Por exemplo, a autoridade monetária de Hong Kong fez, no ano passado, a primeira emissão primária de títulos (Green Bonds), com todas as etapas do ciclo de vida de um título realizadas em uma rede blockchain privada.

Na Argentina, a empresa Agrotoken colocou no mercado uma plataforma de tokenização e comercialização de safras de commodities agrícolas, sendo que os recursos levantados servem de lastro para operações em cartão de crédito emitido pela Visa. Ou seja, enquanto o governo de Alberto Fernández tentava uma solução para sua crise com o FMI, os agricultores desenvolveram uma solução para sobreviver.

Existem ações movimentando ativos imobiliários e, é claro, gente oferecendo tokenização e negociação de ações tokenizadas em mercado secundário, possibilitando redução de custos operacionais, uma coisa que a Bolsa de Valores do Brasil e CVM acompanham com muita atenção.

Aliás, nesse assunto o Brasil está bem na foto digital porque o DREX é um passo importante num processo que começou com a eliminação dos famosos DOC e TED e em 2020 com o PIX. A realização da primeira operação entre o Itaú e o BTG, semana passada, foi uma espécie de pontapé para o que vem por aí.

Thiago Mello vê nisso uma estratégia inteligente porque quando o BC define reconhecer o papel de multiplicador monetário dos bancos, trabalhando como arcabouço legal sobre proteções e liberdades individuais, com programabilidade das transações e a previsão de que rede incorpore outras naturezas de ativos possibilita o mercado pode se organizar.

Até porque a proposta de colocar cripto moedas num sistema regulado vai exigir muito trabalho do Legislativo, do Banco Central, da Comissão de Valores Mobiliários e naturalmente da Receita Federal
Como diz Thiago Mello de fato ainda está no início da jornada, claro que os benefícios para o atacado virão primeiro e ainda será necessário criar sistemas relacionados à eficiência operacional, finaliza o Group Product Manager do Itaú.

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