Contradições de Lula refletem ambiguidade na questão climática a despeito do esforço e prestígio de Marina Silva
Visita do presidente à reunião da COP 28 em Dubai, no Emirados Árabes, mais uma vez expôs a série de contradições do presidente brasileiro em temas internacionais.
Há um enorme equívoco de ambientalistas brasileiros e pesquisadores da questão climática sobre o real compromisso do governo do presidente Lula da Silva em relação ao posicionamento do Brasil como um ator global capaz de liderar, de fato, a luta pela preservação e restauração ambiental e ser, de fato, um exemplo para outras nações.
Não está. E, mais uma vez, Lula se apoia no prestígio internacional da ministra, Marina Silva para se apresentar como líder de um governo inteiramente comprometido em ser o exemplo para o que se convencionou chamar de transição energética de uma economia ancorada no petróleo para um cenário minimamente aceito ancorado no uso de energias renováveis, cuja capacidade o Brasil de fato tem os instrumentos e condições de ser referência.
A visita do presidente à reunião da COP 28 em Dubai, no Emirados Árabes, mais uma vez expôs a série de contradições do presidente brasileiro onde primeiro visitou a Arabia Saudita, liderada pelo príncipe Mohammed bin Salman bin Abdulaziz Al Saud que comanda o país de maneira autocrática.
Depois, ele foi à Alemanha, cujo comportamento em relação à proteção de reservas de energia durante a guerra da Rússia contra a Ucrânia foi de se assegurar de todo o gás de petróleo que pudesse comprar e de não hesitar em voltar a usar carvão para produção de energia.
Salamaleques a bin Salman
Na Arabia Saudita, Lula da Silva se desmanchou em salamaleques ao monarca falando de possíveis parcerias no valor de US$10 bilhões em projetos de cooperação para projetos de energia limpa que o governo de Riad vem prometendo ao Brasil desde o governo Dilma Rousseff .
Embora, efetivamente, o que Mohammed bin Salman tenha feito foi a aquisição através do seu fundo Mubadala, da refinaria Mataripe, na Bahia, dentro do programa de desinvestimento da Petrobras nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Até agora, o negócio mais próximo de energia verde que o Mubadala chegou foi a compra das ações da gigante sucroalcooleira Atvos, antiga Odebrecht Agroindustrial que pertencia ao grupo que agora se chama Novonor que agora controla.
Mas o presidente brasileiro chegou a Dubai com uma das maiores comitivas de países convidados e defendendo o discurso de um compromisso dos países como a produção de energias renováveis.
O constangimento da Opep+
Curiosamente no mesmo dia em que foi comunicada a possível adesão do Brasil ao Opep+, o grupo de países que a mesma Arabia Saudita que fundou a organização em 1960 vem atraindo inclusive a Rússia, num comportamento precursor ao dos Brics que agora terá mais seis integrantes.
Ao constrangimento geral dos ambientalistas que jamais imaginavam o Brasil no cartel que define preços limitando as quantidades de petróleo extraído o presidente construiu um extraordinária narrativa de que no plenário o Brasil vai defender o aproveitamento do dinheiro que eles lucram para fazer investimento, para que os continentes como o africano e a América Latina possam produzir os combustíveis renováveis que eles precisam, sobretudo o hidrogênio verde.
Certamente, além da ministra Marina da Silva, ninguém no governo acredita que um novato “que não apita nada” como disse Lula ao justificar o assento da organização possa convencer aos demais países a trocar o negócio do petróleo por um que nos seus países não existe.
Mas o convite expõe claramente as visões de um governo onde Marina Silva tem prestígio internacional, mas não tem recursos para ampliar as ações do ministério na reconstrução do desastre feito pelo Governo Jair Bolsonaro e o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira (que vazou a informação do convite a jornalistas em Dubai) e que defende uma ampliação das ações da Petrobras em novos projetos focados na ampliação do exploração de petróleo cujo Brasil se tornou o mais produtor da América Latina.
Melhoria da imagem do cartel
Tem mais, os países da Opep não vão ficar calados no debate sobre o aquecimento global. Isso ficou muito claro quando o presidente da COP 28, sultão Ahmed Al Jaber, afirmou que não há base científica que justifique encerrar o uso de combustíveis fósseis como maneira de mantê-lo em 1,5°C.
Ahmed Al Jaber, que abriu o encontro, considerou a saída dos combustíveis fósseis inevitável, mas advertiu, rejeitando provas científicas, que uma transição muito rápida para limitar o aquecimento global a 1,5ºC levaria o mundo à "idade das cavernas". A provocação, naturalmente, irritou os ambientalistas e governantes. Mas demonstra que os produtores de petróleo vão defender o seu negócio agora e no futuro.
Não se deve ter ilusões. A Opep só se interessou pelo Brasil como sócio porque estamos numa jornada de crescimento de exploração de petróleo. Para a Opep, ter um país considerado potência ambiental é muito mais importante do ponto de vista de imagem do que foi quando se associaram México e Rússia.
Não há problema se o Brasil fizer parte dela, mas não é razoável essa conversa de Lula da Silva chorando ao lado de Marina Silva dizendo que quer fazer os países que integram a Opep virarem redutores de carbono. Aí já é demais.
Petróleo como negócio do Brasil
Apesar de todo o discurso, a Petrobras no seu plano 2024-2028 que soma US$ 73 bilhões, destina 67% dos investimentos para o pré-sal, que tem grande diferencial competitivo econômico e ambiental, com produção de óleo de melhor qualidade além de investir US$ 17 bilhões na área de Refino, Transporte e Comercialização.
E programa mais US$7,5 bilhões para projetos de exploração no quinquênio, sendo US$3,1 bilhões para exploração na Margem Equatorial, que Marina Silva não quer nem ouvir falar.
Claro que devido ao cenário global a empresa programa gastos em baixo carbono representa 11% do seu investimento total, mas em ações de mitigação na produção de petróleo.
Uma viagem das Arábias
Por isso é que apesar do discurso de Lula em Dubai, a verdade é que o Brasil vai continuar sendo líder efetivo no setor de petróleo para onde destina mais dinheiro a cada ano.
No fundo, as ideias do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, cuja origem é o setor eólico, ainda são propostas. Como a de transformar a empresa numa grande produtora de energia eólica offshore que só deverá tomar forma em 2025. E de prometer estar presente em projetos de hidrogênio verde que sequer foram relacionados nos programas de investimento aprovados em outubro.
O que não impede de “sonhar” com ideias como de a companhia vir a operar a exploração de petróleo em algum país do mundo árabe algo que até mesmo Lula da Silva considerou “uma viagem”.