Entrevista // Jacques Ribemboim

Em defesa do livro pernambucano

Jacques Ribemboim é o autor homenageado pelo Festival Riomar de Literatura

Fábio Lucas
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Fábio Lucas
Publicado em 25/05/2023 às 0:00
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O homenageado Jacques Ribemboim - FOTO: Divulgação

Esta quinta é dia de festival de literatura no Riomar Recife. Durante todo o dia, atrações locais e nacionais trazem para a cidade uma programação diversificada, que pode ser aproveitada presencialmente com inscrições pelo aplicativo Riomar Superapp. Entre os nomes presentes, Bráulio Bessa, Socorro Acioli e Jessier Quirino.

A nona edição do festival tem como homenageado o escritor e professor Jacques Ribemboim. Atualmente superintendente do IPHAN, Jacques Ribemboim é membro da Academia Pernambucana de Letras (APL) e do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco (IAHGP).

Nesta entrevista ao JC, o escritor, que em breve lança livro novo pela CEPE, fala sobre o cenário da capital pernambucana para a literatura, e a influência judaica em seus escritos.


JC - Como começou o gosto pela literatura?

Jacques Ribemboim - Desde criança, gosto de ler. O ambiente na minha escola, que era o Colégio Israelita Moysés Chvarts, era bem propício à leitura. Havia uma biblioteca muito rica. Em casa, meus pais me incentivavam todo o tempo a ler. Meu primeiro livro, tomei emprestado às escondidas da minha irmã mais velha. Adorei a leitura. Era um romance da norte-americana Laura Ingalls Wilder, intitulado Uma Casa na Campina. Depois disso, li toda a coleção de Monteiro Lobato. Mais adiante, clássicos da literatura juvenil, como A Ilha do Tesouro, de Stevenson, e Chamado Selvagem, de Jack London. E nunca mais parei, foi um livro atrás do outro. Também apreciava me deter em enciclopédias, como Mundo da Criança e Tesouro da Juventude.

JC - E os primeiros escritos?

Jacques Ribemboim - Os primeiros textos publicados foram no Junior, o suplemento infantil do Diário de Pernambuco, ainda na década de 1970, por incentivo dos editores, Fernando Spencer e Loÿde Alves dos Reis, que era conhecida como Titia Lola, por seus leitores mirins. E também havia uns professores de redação no Colégio que eram excelentes. Destaco a professora Leny, da quinta série, e os professores Valentim e Ademir Araújo. Meus livros são de ensaios, resultantes de extensas pesquisas. Não lancei nenhum romance e são raros meus poemas e contos publicados. As temáticas são geralmente relacionadas à história regional, particularmente sobre a presença israelita no Nordeste brasileiro. Mas também tenho livros na área de meio ambiente, política e economia.

JC - O que o Recife representa para o cenário literário nordestino e brasileiro?

Jacques Ribemboim - Pernambuco foi berço da colonização. No passado, nossa extensão territorial e política era muito mais abrangente. A capitania de Pernambuco até a chegada do século 19 fazia divisa com os atuais estados de Minas Gerais e Tocantins, imaginam isso? Mais recentemente, na década de 1960, o Recife ainda mantinha uma forte pujança no cenário nacional, éramos a “terceira capital”. Mas a onipresença econômica de São Paulo passou a eclipsar a produção cultural do Nordeste e Pernambuco sofreu muito com o que chamo de “neocolonialismo interno”. Em 2002, coordenei um grande Movimento em Defesa do Livro e do Autor Pernambucanos, requerendo a obrigatoriedade de as livrarias comercializarem livros editados localmente. Era um absurdo! Os autores pernambucanos simplesmente não conseguiam vender suas obras nas lojas do Recife. A agitação do Movimento obteve certo sucesso e as livrarias passaram a vender livros pernambucanos em nosso estado.

JC - Como a cultura judaica em Pernambuco serve de fonte de inspiração para seus livros?

Jacques Ribemboim - Êita pergunta boa! A cultura judaica está fortemente presente em minhas obras. Meu novo livro se chamará História dos Judeus de Pernambuco e deverá ser lançado pela CEPE em poucas semanas. No livro, mostro que existe uma forte componente semita na etnogênese da população regional. Os cristãos-novos estiveram presentes durante o período de perseguição inquisitorial em Portugal. Vieram para Olinda e se espalharam por todo o Nordeste. De minha parte, meus avós vieram todos do Leste Europeu, de uma região genericamente chamada de Bessarábia, que hoje estaria na Moldávia e, em menor porção, na Ucrânia. Com eles, vieram muitos costumes asquenazes. Entre meus pratos favoritos, estão o bêigale, o varênikes e o kíguel. Na sobremesa, vou de flúden e strudel de maçã. Ah! Mas também sou louco por comidas juninas, caldinho de feijão e bolo de rolo.

JC - Você é membro de duas importantes entidades no estado, a APL e o IAHGP. Como vê o papel das instituições na preservação e propagação da cultura?

Jacques Ribemboim - O IAHGP e a APL são instituições importantíssimas. Costumo dizer que um é o núcleo duro da nossa pernambucanidade e a outra é a guardiã das letras no estado. Guardiã no sentido mais puro, de valorização da literatura local, qual seja a origem. A presidente Margarida Cantarelli do IAHGP – Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, e o presidente Lourival Holanda, da APL - Academia Pernambucana de Letras, fazem um excelente trabalho de abertura das duas instituições ao público em geral, incluindo a produção cultural artesanal e popular, que são de enorme valor.

JC - O que um evento literário pode significar para autores, leitores e editores?

Jacques Ribemboim - Eventos assim despertam a atenção dos jovens e em muitos despertam a paixão pela literatura. Romance, poesia, ensaios, dramaturgia, crônicas, alargam horizontes de uma forma impressionante, complementam a cidadania. Reconhecer nossa cultura – diga-se de passagem, tão diversificada – torna nossos dias mais leves e nossa existência plena. O Festival RioMar de Literatura é um belo exemplo de como envolver a juventude no âmbito da literatura nordestina. Desde a sua origem há mais de uma década, sempre preocupado em valorizar nossas expressões culturais.

JC - Como enxerga o panorama literário em Pernambuco, hoje?

Jacques Ribemboim - O panorama literário em Pernambuco nunca esteve em xeque. Sempre me impressionou a produção local. Há diversas academias e grupos literários. Há também @s que não se interessam em pertencer a essas agremiações e seguem carreiras solo, isoladas e por que não dizer, rebeladas? Não são menos importantes. A produção editorial pernambucana consegue lançar mais de um livro por dia, muitos deles de extremo valor, mas pouco reconhecidos pelo público.

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