O que estão fazendo com o BRT na Avenida Conde da Boa Vista?

Publicado em 30/07/2017 às 12:00 | Atualizado em 13/07/2018 às 11:52
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Fotos: Roberta Soares   O arquiteto e urbanista curitibano Jaime Lerner, criador, lá atrás, em 1974, do Bus Rapid Transit, já popularizado BRT, seria capaz de enfartar se visse as condições de operação que estão sendo oferecidas à versão recifense de sua criatura na Avenida Conde da Boa Vista, principal eixo central do transporte público de toda a Região Metropolitana do Recife, por onde passam 76 linhas de ônibus, o equivalente a 22% do sistema. As estações provisórias do BRT Leste-Oeste instaladas no corredor desqualificam a imagem de ‘transporte do futuro’, de sistema moderno, confortável e eficiente construída nacional e mundialmente para o modelo, mitificado pelo próprio Lerner como o ‘metrô sobre pneus’. “BRT não é ônibus”, já repetiu em diversas entrevistas. Mas pelo menos na Avenida Conde da Boa Vista, o BRT pernambucano, batizado de Via Livre pelo governo de Pernambuco, passa longe dessas definições. Além de ter uma pseudo faixa exclusiva, os BRTs estão realizando o embarque e desembarque de passageiros em verdadeiras caixas improvisadas, que nem de longe lembram o projeto original. Sem dúvida, aquilo não é um sistema de BRT. É importante que a população entenda isso para não estigmatizar um sistema que, bem estruturado física e operacionalmente, funciona sim.  
  As estações improvisadas da Conde da Boa Vista frustram até as mais péssimas das expectativas. Para o passageiro, não há conforto. E para o sistema, além de comprometer sua imagem, a ausências dos requisitos básicos – como o embarque em nível – atrasam a operação. A única característica do projeto original é o pagamento antecipado da tarifa, uma das premissas básicas do BRT. E, mesmo assim, os bloqueios passam longe da modernidade. Não há embarque em nível nem refrigeração. Não há portas. As estações ficam sempre abertas, facilitando a evasão de receita (passageiros entrando sem pagar). As de embarque e desembarque conseguem ser um pouco melhor porque têm bloqueios dos dois lados. Mas qualquer sinal de conforto passa longe das que fazem apenas desembarque. Muito longe. LEIA TAMBÉM Avenida Conde da Boa Vista vira o gargalo da integração temporal Estações de BRT na Avenida Conde da Boa Vista são puro improviso Mais duas linhas de BRT terão desembarque na Avenida Conde da Boa Vista   O passageiro estranha as condições das estações improvisadas, mas, ao mesmo tempo, comemora o improviso porque, só com ele, foi possível ter acesso à Avenida Conde da Boa Vista utilizando o BRT. Até dois meses atrás, os usuários do Leste-Oeste tinham que descer nas Estações Derby ou Guararapes e caminhar até o destino. Os veículos não paravam na Conde da Boa Vista. Somente depois de muita pressão, inclusive dos empresários de ônibus, foi possível dar uma arrumada nas estações provisórias para permitir os embarques e desembarques. A montagem de cada uma das cinco estações que estão operando provisoriamente custou R$ 70 mil.     Lembrando que as unidades são uma adaptação da estrutura parcialmente construída ainda em 2012/2013 pelo governo do Estado e que ficaram abandonadas nesses anos. Algumas chegaram a virar moradia de mendigos e viciados. O que mais indigna é que essa situação se arrasta há, pelo menos, quatro anos, sem que o poder público resolva da forma correta. Desde 2009, quando o então governador Eduardo Campos (PSB) começou a sonhar com o sistema BRT, num projeto apresentado e bancado pelos empresários de ônibus – que contrataram o escritório de Jaime Lerner para projetar os corredores –, a Avenida Conde da Boa Vista era um gargalo para a continuação do Leste-Oeste. Mas os estudos, análises, e o verdadeiro enfrentamento do problema, foram sendo empurrados com a barriga pelas gestões estadual e municipal. Na verdade, o que se sabe é que não há recursos para implantar as estações definitivas do BRT na Conde da Boa Vista. Números divulgados pelo governo estadual em 2014 indicavam que cada estação improvisada custaria R$ 316 mil. Seis foram parcialmente construídas no corredor. Outro entrave do projeto é que nunca se teve um estudo específico para a localização das unidades. No ano passado, uma pesquisa viabilizada pelo então secretário das Cidades, André de Paula, foi realizada sob coordenação do professor e especialista em transporte Maurício Pina e constatou que o BRT é imprescindível para o corredor, assim como os ônibus convencionais que também circulam na via.     O estudo foi provocado porque o poder público não sabia o que fazer para viabilizar a operação na avenida, que percorria o 1,6 quilômetro da Conde da Boa Vista sem parar para o passageiro. Os estudos defenderam que apenas quatro estações – duas por sentido – são suficientes para o BRT na via. Mas seriam novas estações, no padrão BRT. Não no modelo improvisado. Confira a resposta do governo do Estado (Secretaria das Cidades e Grande Recife Consórcio de Transportes) sobre o assunto. JC – As estações serão, de fato, provisórias? Ou seja, serão substituídas pelas originais como prometido desde 2009 pelo governo? Governo de PE – As estações serão temporárias, conforme anunciado em 2009. JC – Se sim, qual a previsão para isso acontecer? Quantas estações serão e quais os modelos? Governo de PE – A Prefeitura do Recife está desenvolvendo um novo projeto urbanístico para a Conde da Boa Vista e seu entorno, envolvendo os bairros de Santo Amaro, Soledade e Boa Vista. Ao ser implantada, essa nova concepção implicará na remoção de todos os equipamentos urbanos atualmente existentes na avenida. Capitaneados pelo Instituto Pelópidas Silveira, os estudos serão apresentados e discutidos com a sociedade, moradores, comerciantes, ambulantes e empresas de ônibus. Avaliações iniciais do Grande Recife Consórcio de Transporte indicam a possibilidade de serem implantadas duas estações na Conde da Boa Vista, com concepção diferente das já existentes. O objetivo é que elas dialoguem com a nova visão urbanística da avenida, com o corredor e com o entorno.     JC – O que acontece para que, depois de tanto tempo, as estações definitivas não tenham sido implantadas definitivamente na Conde da Boa Vista? O que está impedindo o projeto? Recursos? Governo de PE – Como foi dito, os estudos estão em andamento. Quando for concluído, o projeto será implantado em parceria entre o Governo de Pernambuco e a Prefeitura do Recife. JC – O governo tem noção da péssima qualidade das estações de BRT na Conde da Boa Vista ou avalia que é o melhor possível? Governo de PE – O governo sabe que as estações não são ideais, mas destaca que não faria sentido gastar uma quantia vultosa quando ainda não se tem concepção urbanística definida. O governo entende também que não se pode prejudicar a população, não dando a ela a oportunidade de embarcar e desembarcar na Conde da Boa Vista. JC – Quem está bancando as estações provisórias, a Mobibrasil? Qual o custo de montagem e de manutenção das estações improvisadas? Governo de PE – As estações são custeadas por meio de convênio entre o CTM (Grande Recife Consórcio de Transporte) e a Urbana (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco). R$ 70 mil é custo aproximado da montagem de cada estação. Ainda não temos dados de manutenção, pois as estações estão operando há menos de 30 dias.     JC – Como está sendo a operação? Quantas estações improvisadas existem no total? Governo de PE – Atualmente, existem cinco estações provisórias funcionando ao longo da Av. Conde da Boa Vista. No sentido subúrbio/cidade são duas, que funcionam para desembarque durante todo o dia. São elas Soledade 1 (na esquina da Rua da Soledade) e Gervásio Pires 1 (em frente ao Shopping Boa Vista). Já no sentido cidade/subúrbio, são três estações funcionando, para embarque e desembarque, são elas Gervásio Pires 2 (em frente ao Atacadão), Soledade 2 (em frente à Fafire) e Padre Inglês 2 (na esquina da Rua Padre Inglês). Atualmente, três linhas atendem às estações provisórias da Av. Conde da Boa Vista: 2437 – TI. Caxangá (Cde. da Boa Vista) 2441 – EBRT BR-101 (Cde. da Boa Vista) 2450 – TI. Camaragibe (Cde. da Boa Vista) JC – Já perceberam um aumento de demanda ou não? Governo de PE – O crescimento ou não de demanda ainda está em processo de análise.     JC – Qual a estrutura das estações? Têm ar, acessibilidade, vidros temperados, portas automáticas, como previsto para o sistema de BRT? Governo de PE – As estações instaladas na Av. Conde da Boa Vista, justamente por terem sido instaladas de modo provisório para atender à demanda dos usuários do BRT, possuem um acabamento muito mais simples, com piso e rampas de concreto, fechamento da estação com tela perfurada de ferro e corrimão de tubo galvanizado. Esse modelo foi implementado enquanto estudos estão sendo feitos no corredor para que sejam adotados os mesmos padrões das estações dos Corredores Leste-Oeste e Norte-Sul.
Fotos: Alexandre Lopes
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