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Nem bem começou, Buser poderá ser impedido de funcionar em Pernambuco; entenda os motivos

A Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) já avisou que irá recorrer a todas as esferas legais para impedir a oferta do "Uber do ônibus"

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Roberta Soares

Publicado em 02/09/2021 às 17:40 | Atualizado em 03/09/2021 às 15:22
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Pode vir quente que eu estou fervendo. Essa frase resume o clima pesado diante do retorno do aplicativo de transporte rodoviário interestadual Buser a Pernambuco - no fim de 2019 o serviço foi iniciado no Estado numa parceria com a empresa Astrotur e suspenso por força de uma decisão judicial. Assim como fez em todo o País, a Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) já avisou que irá recorrer a todas as esferas legais para impedir a oferta do “Uber do ônibus” (como o serviço é comparado) no Estado. E que a plataforma não terá vida fácil para se instalar em solo pernambucano. A Buser, no entanto, garante que está de volta, que permanecerá ofertando as viagens via app e que irá ganhar o Nordeste.

App Buser é proibido pela Justiça de operar em Pernambuco

Sendo assim, a confusão está instalada. De novo. E foi retomada depois que a Buser anunciou o início de um plano de expansão para chegar com força em Pernambuco. A plataforma de intermediação rodoviária, que se autodefine como a maior do País, pretende conectar 20 pares de cidades em território pernambucano ainda este mês para ofertar viagens entre os Estados brasileiros. A meta, inclusive, é ousada: transportar mais de 20 mil passageiros em Pernambuco apenas em dezembro, chegando a mais de 260 mil passageiros transportados em 2022.

O retorno da plataforma, no entanto, promete dar muita confusão diante da reação do setor de transporte tradicional. A Buser tem travado várias batalhas judiciais com operadores de ônibus em todo o Brasil - quase sempre sendo o alvo das ações. E sofrido diversas apreensões de ônibus usados como parceiros pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão federal regulador do transporte interestadual brasileiro e que considera o serviço ofertado pela plataforma como ilegal.

Via de regra, as empresas de transporte rodoviário interestadual argumentam que a Buser atua com fretamento, mas a operação se assemelha ao transporte regular, regido por uma legislação diferente. Entre as características do fretamento na legislação federal está o chamado circuito fechado, ou seja, que o ônibus volte pelo mesmo trajeto de onde partiu - o que não acontece na Buser. O retorno a Pernambuco e a chegada ao Nordeste é visto pelo setor como uma corrida da plataforma após sofrer com diversas ações no Sul do País. A Assembleia Legislativa de Minas Gerais, por exemplo, onde o app operava há algum tempo, mas formalizou a operação também no dia 30 de agosto, já aprovou um projeto de lei impedindo o serviço. O PL, no entanto, ainda irá para sanção do governo.

“Não vamos deixar a plataforma chegar a Pernambuco. Não vamos. Ela não terá vida fácil aqui. Entramos contra o serviço em todo o País e vamos seguir acionando a Justiça Federal e os órgãos de controle. Estamos falando de um serviço clandestino, que só opera linhas rentáveis, que não funciona sem a demanda que justifique, que não paga nenhum tributo estadual ou federal, que não oferece as gratuidades garantidas por lei e ainda compromete a segurança dos passageiros por não cumprir as regras rodoviárias, como o intervalo de descanso dos motoristas, e a qualidade dos veículos ofertados. Enquanto as empresas regulares têm que cumprir diversas regras - fundamentais para a segurança dos passageiros, vale ressaltar - e pagar diferentes tributos”, alerta Letícia Pineschi, conselheira da Abrati. A entidade lembra que o Estado já tem problemas demais com o transporte clandestino. São 12.500 veículos piratas e apenas 400 ônibus regulares.

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A estratégia do app é conquistar o novo mercado do Nordeste e, para isso, estão sendo oferecidas até mesmo viagens gratuitas para diversos destinos em setembro - NE10

No Sul do País, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4ª Região) publicou Acordão proibindo a operação da Buser e aplicando multas que podem chegar a R$ 80 mil no caso até mesmo de ofertar a venda de passagens pela plataforma. No pacote, prevê até mesmo multa no valor de R$ 100 mil para ANTT caso não faça a fiscalização do serviço. A decisão inclui a operação no Paraná e em Santa Catarina.

PARA CONQUISTAR O NORDESTE, OFERTA DE VIAGENS GRATUITAS

O Estado não é o único alvo da plataforma, é importante destacar. A estratégia é conquistar o novo mercado do Nordeste e, para isso, estão sendo oferecidas até mesmo viagens gratuitas para diversos destinos em setembro. É o caso das rotas ligando Caruaru, no Agreste pernambucano, a João Pessoa ou Campina Grande, na Paraíba. De Campina Grande para a capital pernambucana a viagem também terá custo zero por enquanto.

Além dessa promoção inicial, a startup distribuirá cupons nas redes sociais, site e aplicativo, com direito à primeira viagem grátis. Vale ressaltar, ainda, que as viagens da Buser custam, em média, 60% do valor da concorrência, chegando a custar até a metade do preço cobrado por empresas regulares. O trecho João Pessoa (PB) - Recife (PE), por exemplo, sai por R$15,90 na Buser, enquanto custa mais de R$ 30,00 nas viações tradicionais.

A aposta da Buser é a retomada do turismo com o avanço da vacinação no País. Por isso a escolha do Nordeste. “Muitos brasileiros vão optar por fazer viagens no Brasil. Apostamos bastante em Pernambuco, não só por suas belezas naturais, mas também pela localização estratégica na região Nordeste”, afirma o diretor de Operações da Buser, Thiago Zanetti.

Thiago Lucas/Artes JC
Rotas da Buser em PE - Thiago Lucas/Artes JC

REAÇÃO

A Buser se mostrou indignada com as acusações e ações da Abrati. Pela assessoria de comunicação, fez diversos questionamentos. Alega que a entidade não tem base para dizer que a plataforma é clandestina. “ Onde ela encontrou essa lei que nem o Judiciário encontrou ainda? A própria Abrati desistiu de ação no STF porque viu que não conseguiria sustentar essa tese”, alega a Buser. E segue: “Como a Abrati prova que só operamos as linhas mais rentáveis? Como ela fez essa aferição? Com base em que dados ela faz essa afirmação? Que tabela ela utilizou para comparar os custos? É muito comum ver as empresas que possuem concessão pública falar em “benefício cruzado”, só que na prática isso não existe. As linhas concedidas são entregues uma a uma, e as próprias concessionárias têm abandonado as linhas menos rentáveis”.

Também questiona o não pagamento de tributos. Diz tratar-se de uma falácia. “De onde veio a informação de que a operação não paga tributos? Falar que o fretamento colaborativo não paga imposto é uma falácia. Existem dois níveis diferentes de tributação (na receita das empresas e na receita da Buser), aumentando a carga tributária. O ICMS, imposto estadual, também incide sobre as empresas de fretamento, que ainda recolhem ISS em função da intermediação da viagem praticada pela empresa de tecnologia. Ou seja, a carga tributária do fretamento colaborativo é, na verdade, maior, especialmente se levarmos em conta que as fretadoras não recebem isenções na compra de ônibus como as empresas concessionárias”, explica.

E ainda questiona o argumento da Abrati de que as regras trabalhistas, que podem comprometer a segurança viária dos trabalhadores, passageiros e até de terceiros, não são cumpridas. Com base em que a Abrati afirma que não consideramos descanso e só trazemos risco aos usuários? A Buser possui um sistema de registro de escalas que não permite que motoristas atuem sem ter realizado o descanso estabelecido pela lei. Além disso, a frota, que é mais nova e mais moderna do que a oferecida pelas empresas das rodoviárias, ainda conta com equipamentos de segurança como telemetria e câmera com sensor de fadiga, que monitora o cansaço dos motoristas durante toda a viagem”, afirma ainda a Buser.

Confira o Acordão do TRF da 4ª Região contra a Buser:

ACORDÃO TRF4 - BUSER by Roberta Soares on Scribd

 E AQUI, o PL aprovado pela Assembleia Legislativa de Ninas Gerais proibindo a operação do serviço no Estado e que ainda irá para sanção do governo do Estado.


Outras respostas da Buser

JC - A Abrati argumenta que o serviço oferecido pela Buser é irregular. Vocês operam sustentados em qual legislação e o que podem dizer sobre esses argumentos da entidade?

Maior plataforma de intermediação de viagens do Brasil, a Buser conecta passageiros a empresas de fretamento para viagens de ônibus. As nossas empresas parceiras possuem todas as licenças necessárias e fazem o recolhimento de tributos.

Na modalidade do fretamento colaborativo, que é o nosso principal modelo de negócio, formamos grupos de viajantes que rateiam entre si o custo da viagem. Não há venda de passagens, e o embarque é realizado em local permitido. Tudo isso amparado pela Constituição, na Lei da Liberdade Econômica e nas regras locais de fretamento.

Operamos dentro da legalidade, e estamos abertos a mostrar ao mercado, entidades de classe e às autoridades (incluindo agências reguladoras) que o nosso modelo é justo e necessário para a moderna cadeia de mobilidade urbana. Esse movimento faz parte da nova economia e só complementa o mercado.

JC - Quais os critérios para escolha da frota?

A primeira coisa que a gente avalia é a empresa de ônibus que vamos escolher para ser nossa parceira - e isso passa por ver se ela tem estrutura, licenças em dia, documentação etc. Resolvida essa etapa, analisamos os ônibus: qualidade da frota, estado de conservação e idade dos veículos. Vale ressaltar que, em operações como essa, fazemos questão de priorizar parceiros locais, que já conhecem a região e ajudam a movimentar a economia dos estados.

JC - Nas viagens da Buser é ofertada a gratuidade como acontece no transporte regular interestadual? Se não, por quê?

Nossas parceiras, que são empresas de transporte coletivo privado, prestam, por meio da Buser, o serviço de fretamento colaborativo. As regras da gratuidade são uma obrigação legal estabelecida para as empresas de ônibus que atuam no regime de linhas. A Buser está à disposição das autoridades para debater a regulamentação de sua atividade, dentro das regras democráticas e princípios republicanos. 

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