Ainda que o “abril vermelho” não tenha tido o sucesso de outros anos, quando os sem terra “pintavam os canecos” nas propriedades privadas - produtivas ou não, este ano a guerra tem sido mais midiática, e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) pareceu mais afiado. Menos analógico. O que pode significar apenas uma tendência de que não pretendem jogar água no chopp das comemorações dos 100 dias do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Fundado em janeiro de 1984 pelo economista João Pedro Stedile, o MST nasceu sob as bênçãos da Teologia da Libertação, uma tendência socioideológica da Igreja Católica, de partidos políticos de esquerda e do movimento sindical capitaneado pela CUT (Central Única dos Trabalhadores). Foi na gestão do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) (1995-2002) que os sem terra mais invadiram propriedades rurais, forçando o governo tucano a desenterrar - com o perdão do trocadilho - marcos legais como o Estatuto da Terra, lançado em novembro de 1964, pelo governo militar do marechal Castello Branco (1897-1967).
Nos governos do PT (2003-2015) o movimento camponês se fortaleceu com a liberação de recursos para atividades que iam além da invasão das propriedades. A agricultura familiar, sem dúvida, foi o feito mais marcante dos movimentos agrários. Com a chegada do governo Bolsonaro (PL)(2019-2022) houve um arrefecimento considerável. A partir de 1º de janeiro deste ano, voltaram a fazer protestos e algumas invasões pontuais.
Foram os agricultores da reforma agrária que mais reclamaram da chegada do “inimigo número 1” ao governo Lula. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro - representante do agronegócio - sempre foi visto com desconfiança pelos sem terra. “O governo do companheiro Lula deveria ser mais cuidadoso. Está mais do que claro que ele [Fávaro] vai sempre puxar a brasa para a sardinha dele. O pequeno produto que se dane”, disse uma liderança rural, ainda durante o período de transição.
A convivência dentro da razoável tolerância estava indo até certo ponto bem, até que o ministro da Agricultura defendeu a aplicação rigorosa da legislação para combater as invasões de propriedades privadas. Ele comparou a invasão agrária aos atos de quebra-quebra de 8 de janeiro, no Congresso Nacional, no Supremo Tribunal Federal e no Palácio do Planalto. “Se fomos intransigentes com aqueles que invadiram o Congresso Nacional, seremos intransigentes e vamos repudiar invasões de terras produtivas”, sustentou.
O líder do MST, João Paulo Cunha, reagiu. Segundo ele, “não há comparação entre os dois movimentos”. O de invasão de terras e os atos antidemocráticos de 8 de janeiro. “A nossa luta é pela democratização das terras do Brasil. Diferentemente da ação do dia 8 de janeiro, que é uma ação contra a democracia”, defendeu.
Se a convivência de sem terra com o agronegócio, no mesmo governo, não tem sido essas mil maravilhas, mas pelo menos nem de longe lembra os atos de invasão de prédios públicos, de acampamentos duradouros, de bloqueios de estradas, em favor da reforma agrária, no passado não muito distante e por vezes violento contra lideranças e aliados da reforma agrária.
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