O catarinense Reditário Cassol tinha dois sonhos quando criança, “uma porção de empregados” para ajudá-lo nos afazeres doméstico e “a maior quantidade possível” de caminhões “tudo Fenemê”, veículo da FNM (Fábrica Nacional de Motores). Ainda jovem, abandonou parte dos sonhos em Concórdia, no oeste de Santa Catarina, e migrou com a família para Rondônia, deixando para trás dez anos de experiência na Câmara de Vereadores na vizinha Maravilha. Passou da Arena, o PMDB, PTB e atualmente está no PP. “Aquilo era muito pequeno para mim. Pequei mulher e filhos e fui tentar a vida no Norte. Derrubar árvores e plantar comida pros brasileiros se alimentarem”, dizia.
O filho Ivo cuidava da herança paterna no ramo da política. Foi prefeito na pequena Rolim de Moura, governador do estado e senador. No período em que ocupava um das três cadeiras representando Rondônia, no Senado Federal, Ivo Cassol contava que sua eleição foi uma das “maiores vitórias que o PP teve” no cenário nacional. “Tinha dinheiro, prestígio e um zeloso papai sempre ao meu lado”. Reditário Cassol era primeiro suplente do filho. “É o mínimo”, justificava.
Ivo tirou licença e o pai assumiu o mandato. No primeiro discurso, uma tarde de 6 de outubro de 2011, Reditário parou o Senado com seus gritos estridentes e propostas “aterrorizantes”, nas palavras de Paulo Paim (PT-RS), presidente da Comissão de Direitos. Humanos. Durante 22 minutos e 30 segundos fez muito colega prender a respiração.
“Eu venho aqui, criticar esse auxílio aos presos. Auxílio é facilidade para pilantra, vagabundo sem-vergonha, que devia estar atrás da grade de noite. De dia tinha que trabalhar. E quando não trabalhasse de acordo, o chicote, que nem antigamente [deveria] voltar. Não faz sentido o governo federal premiar a família de um criminoso e deixar familiares das vítimas sem nenhuma proteção social ou financeira”, defendeu.
Surpreso com o discurso, Eduardo Suplicy (PT-SP) pediu a palavra para criticar de Reditário Cassol. “Mas do jeito que o senhor está falando, senador, pedindo para a utilização do chicote, seria a volta da Idade Média”. Reditário retrucou: “Senador Suplicy, eu sei que o senhor é um homem letrado, conhece o mundo todo, mas eu queria que o senhor fizesse um passeio pelo interior do Brasil, e visitasse as cadeias. O senhor iria ver que o povo brasileiro honesto e trabalhador está pagando imposto para engordar salafrário atrás da grades”. E completou, “o senhor é bom cantando “Blowin' In The Wind” [música de Bob Dylan], largue disso, homem. Pegue uma mulher e vá fazer dupla caipira que nem eram Cascatinha e Inhana. O senhor ficaria melhor cantando ‘Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal’” risos e constrangimentos. Marta Suplicy (PT-SP) que presidia a sessão, encerrou os trabalhos. Eduardo Suplicy saiu do plenário cantarolando “How many roads must a man walk down. Before you call him a man?” Reditário Cassol espumando de raiva por não ter recebido um apoio sequer ao seu projeto de mudança do Código Penal.
Um parafuso a menos — O paraibano Ney Suassuna (PMDB, PP, PSL e atualmente no Republicanos) tinha duas virtudes devidamente elogiadas pelos colegas de Senado. Era festeiro e não perdia uma piada. “A gente perde um amigo, mas preserva a lorota”, comentava. Seu alvo preferido era o colega Eduardo Suplicy. Certa vez, para desespero dos letrados em código de ética parlamentar, Suplicy vestiu um short de banho vermelho, por cima do terno cinza, depois de ter sido desafiado pela apresentadora Sabrina Sato.
“Ela me perguntou se havia heróis no Parlamento. Depois, perguntou qual era o meu sonho. Eu disse a ela que o meu único sonho, atualmente, é o programa renda mínima. Ai, ela disse que eu era super-herói e me entregou o calção. Vesti. Ela bateu palmas e ninguém, nenhum dos meus colegas reclamou”. Sem mandato, mas convivendo com os colegas no cafezinho, uma minúscula sala, Suassuna gritou la no fundo do plenário, “Esse homem falta uma parafuso.”
Eduardo Suplicy não foi importunado pelos colegas e o assunto não chegou à Comissão de Ética. Por sorte. Em 1949, uma foto de cueca foi o motivo para a primeira cassação de um deputado, “por falta de decoro”. O deputado Barreto Pinto (PTB-RJ) deixou-se fotografar para a revista “O Cruzeiro”. Na foto de Jean Mazon, Barreto Pinto aparece vestido de fraque, sem calças. Apenas de cueca. Perdeu o mandato. “Suplicy é um Barreto Pinto só que mais educado”, disse Ney Suassuna.
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