Recorro aos ensinamentos do poeta irlandês, Oscar Wilde (1854-1900), “Quando os deuses nos querem punir, respondem às nossas preces”, e analiso, não o julgamento relâmpado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que cassou o registro da candidatura do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), mas comento a repercussão da decisão entre os políticos.
Eu não comento a decisão jurídica do TSE porque meus parcos conhecimentos no mundo da toga só viriam a confundir o cenário, mas confesso que dependendo do lado em que estão alguns juristas é de se imaginar que entre a vingança e a advertência, a decisão unânime e ligeira - um minuto e 15 segundos - pode ser um sinal de que a Justiça Eleitoral não está de brincadeira.
Começo dizendo que achei desnecessário o comentário do ministro da Justiça. Ao contrário de Flávio Dino, eu considero que o governo Lula 3.0 tem sintomas de autoritarismo explícito quando se aproveita de algumas fragilidades conjunturais para defender a aprovação, a toque de caixa, o projeto de lei das fake news e impor um “órgão regulador” subordinado ao Executivo, ainda que seja uma agência reguladora. Tão logo soube da decisão “vapt-vupt,” aprovando relatório do ministro Benedito Gonçalves, Dino recorreu ao cobrador de impostos, Mateus Evangelista, para tripudiar no cangote de Dallagnol. “Sobre o julgamento realizado hoje [terça-feira] no TSE, lembrei-me de um texto bíblico que decido ao presidente Lula. “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados! Está em Mateus 5,6”.
Aí eu pergunto: é função de ministro de Estado comandar uma torcida organizada para comemorar essa ou aquela cassação de mandato? Acredito que não, mas como Flávio Dino tem sido, na linguagem popular, arroz de festa da imprensa - ou seria arroz de cuxá, excelente prato da gastronomia maranhense, assim como é o ministro? Ele acha que pode.
Na Câmara, além do próprio Deltan Dallagnol e seu autoflagelo “perdi meu mandato porque combati a corrupção”, os discursos se revezavam entre o incenso ao TSE e o ataque certeiro. “A Operação Lava Jato teve alguns erros, excessos, mas teve muita verdade neste país. E eu tenho falado, senhores deputados: quem cassa mandato de prefeito, governador, presidente e parlamentar é o povo. É nas urnas. Eu vejo essa cassação como uma vingança. A palavra é essa: uma vingança”, disse o deputado José Nelto (PP-GO).
Já o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), um dos integrantes da Mesa Diretora alertou que o poder da Justiça Eleitoral para cassar um mandato vai até a data da diplomação - ou deveria ir somente até aquele período. “Após a posse do parlamentar somente a Casa é que pode tirá-lo do cargo”, afirmou. “O julgamento foi da candidatura. Cassaram a candidatura e, consequentemente, o mandato não acontece, não se legitima. Eu estou propondo uma alteração legislativa: a hora que ela permitiu que o candidato, uma vez eleito, diplomado, tome posse nesta Casa, a Justiça Eleitoral não pode interferir mais no mandato. Já tomou posse, a responsabilidade é desta Casa”, ressaltou.
Voltando a Wilde, um Parlamento não deveria comemorar uma perda de mandato. Bastaria que se pusesse a analisar as regras que escreve e muitas vezes intencionalmente, permitindo múltiplas interpretações. Dependendo do humor de quem as analisa e aplica.