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"Eu imploro: se puder, permaneça em casa", diz médica após falar sobre proximidade do caos na linha de frente

Pernambuco convocará servidores para iniciar o processo de substituição de outros profissionais que estavam na linha de frente. Médicos relatam sentimentos e vontade de fazer o melhor para salvar vidas

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 23/04/2020 às 0:43 | Atualizado em 23/04/2020 às 11:25
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"Estou sendo testemunha de algo que nunca imaginei viver e que está acontecendo aqui, com nosso sistema de saúde e com os nossos cidadãos: a proximidade do caos", relata a médica dermatologista Lígia Pessoa de Melo - FOTO: REPRODUÇÃO/INSTAGRAM

Profissionais de saúde que habitualmente não trabalham nas alas dos hospitais passaram a se entregar a uma missão de solidariedade neste momento em que o adoecimento por covid-19 é uma realidade para muitos colegas da linha de frente. Dermatologistas, psiquiatras, reumatologistas e endocrinologistas, além de trabalhadores de outras especialidades, deixam seus consultórios e ambulatórios para atuar em salas de triagem, emergências, enfermarias e unidades de terapia intensiva (UTIs) voltadas para pacientes com suspeita ou confirmação da infecção pelo novo coronavírus. Diante dessa necessidade crescente de profissionais para combater a epidemia, Pernambuco convocará servidores para iniciar o processo de substituição de outros profissionais que estavam na linha de frente.

O recrutamento é instituído por meio de portaria, nº 166, publicada no Diário Oficial do Estado de hoje. Serão chamados 1.092 médicos diaristas e 702 profissionais de outras áreas da saúde. "Os profissionais que estavam atuando em ambulatórios, nas situações eletivas, passarão a ser convocados para a linha de frente”, frisou ontem André Longo, em coletiva de imprensa online.

“Assim como eu, alguns médicos dermatologistas e de várias outras especialidades foram deslocados dos seus setores para atender em emergências, enfermarias e UTIs. E o que eu tenho a dizer sobre isso? Apenas que estou sendo testemunha de algo que nunca imaginei viver e que está acontecendo aqui, com nosso sistema de saúde e com os nossos cidadãos: a proximidade do caos”, relata a dermatologista Lígia Pessoa de Melo, 43 anos. Ela percebe que, ainda uma quase desconhecida, a covid-19 já faz muito parte do nosso dia a dia. “Quem está de fora talvez não imagine a real quantidade de profissionais de saúde contaminados, de pessoas doentes; alguns muito graves e outros morrendo.” Ela ainda acrescenta: "Sem heroísmo ou sensacionalismo, mas se eu tenho um mínimo de ligação, de credibilidade e de influência, eu imploro: se puder, permaneça em casa". 

Leia o depoimento completo de Lígia: 

Psiquiatra na UTI de covid-19

O psiquiatra Rodrigo Silva também conta que, há cinco anos sem dar plantão em hospitais, passou a atender esta semana em UTI que recebe os pacientes com suspeita e confirmação de covid-19. “Apesar de tudo, fui trabalhar confiante e feliz por poder ser médico. Que essa tragédia toda sirva para que a gente se una. Sem romantismo, mas com vontade de fazer nosso melhor”, diz Rodrigo.

Leia o depoimento completo de Rodrigo: 

 
 
 
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NÃO SOMOS HERÓIS! • Hoje depois de muito tempo voltei a dar plantão. Lembro que quando saí de meu último plantão na UTI do HR há 5 anos pensei: “agora nunca mais darei plantão na vida”. Hoje acordei em pleno feriado para começar a atender na linha de frente os pacientes com COVID-19. Passei mais de 7 horas todo paramentado, com uma máscara que apertava e me deixava com sensação de falta de ar e outra que comprimia MUITO minha testa. Muito mesmo. Sai hoje do plantão cheio de marcas no rosto. Mas não apenas no rosto. • Cada vez mais de nós profissionais estão sendo convocados para trabalhar nesta pandemia. Não simplesmente por um ato de heroísmo. Quando se fala em herói subentende-se alguém com poderes extraordinários e que não teme diante do perigo. Grande parte de nós está com medo. Medo de adoecer e contaminar aqueles que amamos. Medo de não ter equipamentos necessários para nossa proteção e de não poder fazer o que gostaríamos pelo paciente. Medo de não saber fazer aquilo que é preciso • Queria falar em especial a meus colegas e amigos médicos. Nós escolhemos ajudar quem precisa, juramos isso quando nos formamos. Não temos super poderes, mas devemos consolar sempre, aliviar quase sempre e curar algumas vezes. Hoje apesar de tudo, fui trabalhar confiante e feliz por poder ser médico. Hoje refleti o quanto amo a medicina. Hoje antes de ser Psiquiatra eu fui médico intensivista: era isso que a sociedade precisava no momento. E tantos outros médicos estão tendo que abandonar suas especialidades e chamados a trabalhar onde é necessário! Que essa tragédia toda sirva para que a gente se una. Sem romantismo, mas com vontade de fazer nosso melhor • E que marcou mais que essas que estão na minha cara na foto? Foi ver um colega ter que comunicar a morte de um pai para sua filha pelo telefone. Sem um abraço. Pelo telefone. E isso não me sai da cabeça. E a dor fica maior quando penso que tem gente fazendo pouco e achando que isto é uma gripezinha. Isso sério e pessoas estão morrendo. Como sempre morreram e vão continuar. Só que podemos evitar muitas mortes e estamos querendo deixar de fazer isto. Precisamos nos curar. E não apenas de COVID. Mas ainda resta esperança.

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Aplicativo 

Além dos médicos convocados para a linha de frente, há outros 75 que atuarão pelo aplicativo Atende em Casa, ferramenta desenvolvida em parceria com a Prefeitura do Recife para que médicos ou enfermeiros orientem pessoas com sintomas respiratórios, fazendo chamadas de vídeo quando necessário. A plataforma funciona no Recife, Paulista, Olinda, Jaboatão dos Guararapes e Cabo de Santo Agostinho. Além disso, será expandido para moradores de Camaragibe e São Lourenço da Mata, municípios do Grande Recife.

Os profissionais que estavam atuando em ambulatórios, nas situações eletivas, passarão a ser convocados para a linha de frente. Claro que ficarão de fora aqueles profissionais que têm maior idade (idosos a partir de 70 anos) ou alguma comorbidade. Nesse processo, identificamos mais de mil profissionais que, serão chamados para ajudar na substituição de profissionais que se afastaram por doença, até que eles estejam aptos a voltar para o serviço
André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco

Citação

Os profissionais que estavam atuando em ambulatórios, nas situações eletivas, passarão a ser convocados para a linha de frente. Claro que ficarão de fora aqueles profissionais que têm maior idade (idosos a partir d

André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco

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