O médico pediatra e infectologista Jailson Correia vive a segunda emergência em saúde pública como secretário de Saúde do Recife desde 2013. A primeira delas foi em 2015, quando a capital pernambucana se tornou o epicentro da epidemia de zika, que levou ao nascimento de pelo menos 473 crianças com microcefalia no Estado. Agora, ele vê a cidade como centro da crise do novo coronavírus, com cerca de metade dos casos de covid-19 de todo o território pernambucano, que acumula 18.488 pessoas que já foram infectadas. Com a imposição de um rígido confinamento à população, que começou a valer ontem em cinco municípios do Grande Recife e vai até o dia 31 deste mês, a expectativa é chegar ao achatamento na curva de adoecimento e de mortes em Pernambuco. Conversei ontem com Jailson sobre cenários possíveis depois dessa quarentena. Como ficamos a partir de 1º de junho? Voltaremos aos nossos hábitos de sempre? Dormir, acordar, tomar café da manhã, sair para trabalhar, passear, ir à praia...
“O retorno à normalidade ou a nova normalidade será um processo progressivo e gradativo, muito bem planejado, com cautela para evitar que esse retorno traga um novo aumento de casos. Para essa definição, precisamos de ciência, de conhecimento profundo sobre mobilidade da cidade e questões urbanas”, diz Jailson. Ele acredita que a nova normalidade precisa estar aliada ao comportamento que criamos desde que os casos de covid-19 despontaram na cidade. “Esses novos hábitos devem permanecer entre nós por um bom período de tempo, por meses ou anos, até que se tenha uma vacina segura. Enquanto isso, continuaremos na linha do distanciamento social. A intensidade disso dependerá da dinâmica da transmissão (após o fim da quarentena)”, frisa o secretário.
O exemplo do Chile nos mostra a importância de se ter cautela para pensar na nova normalidade. Na quarta-feira (13), as autoridades daquele país decretaram quarentena obrigatória em toda a capital, Santiago, após um aumento de 60% dos novos casos de coronavírus nas últimas 24 horas no país, que somam 34.381 infectados desde março. A quarentena abrange locais onde havia sido suspenso o confinamento obrigatório nas últimas semanas. O Chile havia optado por uma estratégia de quarentenas dinâmicas ou seletivas, em vez de fechar as cidades por completo.
Ainda há muitos susceptíveis (à infecção pelo coronavírus) em grande parte da população. Essa nova normalidade precisa ser planejada e acompanhada de perto, pois há um grupo de pessoas grande em risco para adoecer numa nova epidemiaJailson Correia, secretário de Saúde do Recife
Para Jailson, é muito provável vivermos uma segunda onda de covid-19 após a volta às atividades, devido à capacidade que o vírus tem para se alastrar novamente. “A diferença é que estaremos mais preparados para esse segundo momento. Ainda há muitos susceptíveis (à infecção pelo coronavírus) em grande parte da população. Essa nova normalidade precisa ser planejada e acompanhada de perto, pois há um grupo de pessoas grande em risco para adoecer numa nova epidemia”, esclarece. Ele diz isso com base no estudo de soroprevalência, divulgado este mês, que estima que só 5% da população da Espanha (um dos países mais afetados pela pandemia) foram infectados pelo novo coronavírus. Ou seja, a primeira onda de covid-19 deixa as populações longe do nível suficiente de contágio, estimado em 65% a 70% da população, a partir do qual se considera que haja um nível suficiente de imunidade coletiva.
“Passaremos períodos de meses dosando como fazer o distensionamento das medidas de isolamento. Talvez seja preciso voltar com restrições mais duras. Assim será até termos imunidade ou vacina disponível, e esta deve ocorrer primeiro, em meados de 2021”, acrescentou Jailson, com a certeza de que os próximos dias deste mês muito dirão sobre como vamos viver a nossa nova normalidade.
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Ainda há muitos susceptíveis (à infecção pelo coronavírus) em grande parte da população. Essa nova normalidade precisa ser planejada e acompanhada de perto, pois há um grupo de pessoas grande
Jailson Correia, secretário de Saúde do Recife
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