Uma a cada três crianças no mundo tem miopia, aponta estudo

A dificuldade para enxergar de longe piorou com a pandemia de covid-19. Estima-se que, em 2050, 40% das crianças e dos jovens serão míopes

Publicado em 11/11/2024 às 15:30 | Atualizado em 11/11/2024 às 15:31

Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein

Uma a cada três crianças no mundo tinha miopia em 2023 e essa proporção deve alcançar 40% dos meninos e meninas em 2050, ultrapassando 740 milhões de casos.

A constatação é de uma ampla revisão sistemática e meta-análise que analisou 276 pesquisas envolvendo cerca de 5,4 milhões de crianças em 50 países dos seis continentes. Os resultados foram publicados em setembro no British Journal of Ophthalmology.

A miopia é um distúrbio visual que geralmente começa na primeira infância — período que contempla do nascimento até os 6 anos de idade — e tende a piorar. É caracterizada pela dificuldade de enxergar objetos distantes: eles ficam embaçados e, quanto mais grave for a miopia, menor é a distância na qual o paciente consegue focar.

O problema ocorre quando o olho forma a imagem antes da retina. Isso significa que ele precisa de uma maior aproximação dos objetos para elaborar adequadamente a imagem que será enviada ao cérebro.

"É impossível aproximarmos todos os objetos para a adequada formação da imagem. Por esse motivo, o tratamento inclui a correção refrativa, que pode ser alcançada pelo uso de óculos, lentes de contato ou de forma definitiva pela cirurgia refrativa", explica o oftalmologista Adriano Biondi, do Hospital Israelita Albert Einstein.

A nova revisão de estudos aponta um aumento significativo na prevalência de miopia entre crianças e adolescentes nos últimos 30 anos — saltou de 24% em 1990 para quase 36% em 2023, especialmente depois do período da pandemia de covid-19.

Entre as possíveis explicações estão o uso excessivo de visão para perto, impulsionada pelo uso de telas, e estar em ambiente confinado, com menos contato com a luz natural.

Na avaliação de Biondi, os altos números de miopia entre jovens surpreendem, mas são notáveis e cada vez mais preocupantes. "Se observarmos os dados históricos, nos últimos 60 anos temos presenciado um aumento significativo da prevalência de miopia, com trajetória contínua de alta."

O oftalmologista ressalta que há razões para duvidar de que se trata apenas de uma alteração explicada pela genética. "As mudanças têm acontecido muito rápido e podem ser melhor explicadas pelas mudanças de hábitos e comportamentos humanos."

O estudo observou que crianças asiáticas têm mais miopia – cerca de 35% das que vivem no Leste Asiático tinham o problema em 2023, mais que o dobro da taxa de outras regiões. Para se ter uma ideia, a prevalência na Ásia é aproximadamente sete vezes maior do que a observada na África.

A América Latina e o Caribe demonstraram a menor prevalência entre os seis continentes.

Para os autores, a escolaridade mais cedo pode explicar essas diferenças. O oftalmologista do Einstein concorda. "Tanto a escolarização quanto o subdiagnóstico em outros países podem contribuir para a explicação. Mas, certamente, o tempo dedicado à leitura e ao estudo, por si só, já é capaz de explicar essa correlação, já que ela foi identificada também em outros países desenvolvidos, tais como Austrália, Israel e Estados Unidos."

Tratamento e prevenção

A partir do diagnóstico, existe tratamento para a miopia. De acordo com o oftalmologista Adriano Biondi, do Hospital Israelita Albert Einstein, para crianças na idade em que a miopia ainda está se desenvolvendo, uma das estratégias é o uso de lentes especiais que podem retardar ou atenuar o problema.

Se ele persistir após o final do desenvolvimento do olho, ao redor dos 20 anos de idade, a cirurgia refrativa por laser pode ser utilizada. Para adultos acima dessa idade ou com miopia muito significativa, uma das indicações de tratamento é o implante de lentes intraoculares.

"Atualmente, usar óculos é praticamente opcional para a maioria dos pacientes", pontua o oftalmologista.

Para prevenir o problema, a principal recomendação é aumentar as atividades das crianças ao ar livre, com maior exposição à luz natural, e restringir o tempo de uso de aparelhos eletrônicos.

"Ter uma vida saudável, com menos uso de celular, menos telas e menos uso do computador, é muito útil para mitigar os riscos de miopia, além de serem hábitos muito bem-vindos para a saúde metabólica e mental", lembra o médico.

Em relação ao tempo de telas, a Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica recomenda:

  • Abaixo de 2 anos: nenhuma exposição às telas;
  • Entre 2 e 5 anos: limitar a, no máximo, 1 hora diária;
  • Entre 6 e 10 anos: entre 1 e 2 horas ao dia;
  • Entre 11 e 18 anos: até 2-3 horas diárias.

Em relação às medidas comportamentais, estão:

  • Preferir a maior tela, na maior distância possível (televisão é preferível ao celular);
  • Controlar a distância de uso (manter os aparelhos a uma distância de um braço adulto);
  • Evitar telas durante as refeições;
  • Evitar telas pelo menos 2 horas antes de dormir;
  • Estabelecer intervalos periódicos, seguindo a regra do “20-20-20”: a cada vinte minutos de atividade de perto, realizar intervalos de pelo menos 20 segundos para fixar objetos a 20 pés (aproximadamente 6 metros) de distância, permitindo o relaxamento do foco de perto (acomodação);
  • Manter uma postura adequada: tablets e computadores devem ficar na altura dos olhos da criança, atentando-se à posição das costas e do pescoço durante o uso;
  • Estimular atividades ao ar livre, sob exposição solar indireta, pelo menos 2 horas por dia;
  • Reduzir o brilho e aumentar o contraste da tela do aparelho eletrônico. Evitar o uso de telas em ambientes mal iluminados.

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