Após a Polícia Civil de Pernambuco confirmar que o padre Airton Freire de Lima, da Fundação Terra, e três funcionários dele foram indiciados em investigações que apuram crimes sexuais, advogados dos suspeitos divulgaram notas sobre o caso. E todos afirmaram o mesmo: que seus clientes são "inocentes" e que "não há provas".
A defesa de padre Airton Freire declarou que "existem provas técnicas, documentais e testemunhais, no âmbito dos dois inquéritos concluídos, que atestam que o Padre Airton é inocente. As provas, infelizmente, não podem ser ainda reveladas pelo fato de as investigações estarem sob segredo de justiça".
"Lamentavelmente, a Polícia Civil não se pronunciou sobre a tentativa de extorsão praticada por uma das supostas vítimas contra o padre Airton. A prisão preventiva do padre fere a legislação brasileira e o direito internacional pelos fatos já expostos à imprensa: o religioso nunca tentou impedir as investigações, não coagiu testemunhas, nunca representou ameaça de cometimento de crimes e se apresentou espontaneamente à Justiça."
A polícia afirmou, em coletiva de imprensa, que faz buscas para prender o motorista Jailson Leonardo da Silva e Landelino Rodrigues da Costa filho, que realizava filmagens de missas e eventos na Fundação Terra. Ambos são considerados foragidos e foram indiciados criminalmente.
A defesa de Landelino Rodrigues da Costa disse que "os fatos alegados serão, em momento oportuno, devidamente esclarecidos no bojo da instrução processual. Informamos ainda que o caso está sob investigação, sob segredo de justiça, o que impede a divulgação de informações detalhadas".
Também destacou que "o investigado sempre respeitou as normas e leis que regem o País, possui uma conduta íntegra. Qualquer conclusão nesse momento será precipitada e temerária".
"Em que pese não ter se apresentado perante os órgãos competentes, o investigado se resguarda ao direito de se pronunciar posteriormente, quando todos os fatos forem esclarecidos e a verdade demonstrada, preservando dessa maneira sua integridade, bem como da sua família", disse o texto.
Já a defesa de Jailson Leonardo da Silva afirmou que ele "não possui histórico de qualquer conduta criminosa".
"Por isso, a defesa está trabalhando na revogação da decretação de sua prisão preventiva pois entende ser essa totalmente infundada e desproporcional, uma vez que Jaílson jamais agiu para criar obstáculos às investigações", declarou.
"É absurdo esperar que alguém acusado injustamente de um crime gravíssimo e altamente estigmatizante, se entregue espontaneamente ao presídio, onde se sabe o risco, inclusive de vida, que ele pode sofrer, principalmente quando há provas de sua inocência nos autos que estão sendo completamente desconsideradas, Jaílson, está fazendo uso de suas garantias fundamentais em não se render por ora ao decreto que entende ser injusto", disse a defesa.
"Tratando-se de acusação de crime sexual, em respeito ao sigilo processual a defesa não pode expor ao momento informações e provas que dizem respeito ao fato, contudo reitera que Jaílson não cometeu este crime e dentro da instrução processual utilizando-se do contraditório e da ampla defesa isso restara cada vez mais cristalino. O indiciamento não significa culpa ou trata-se de condenação criminal transitada em julgado, bem como, é direito natural do ser humano lutar por sua liberdade, inocência e justiça, e neste caso, tudo está sendo feito conforme a lei", finalizou.
O nome do quarto indiciado - que também é motorista da Fundação Terra - não foi revelado pela polícia sob o argumento de que não houve a decretação da prisão preventiva para ele. O homem foi indiciado por crime de falso testemunho.
O QUE DIZ A POLÍCIA SOBRE O INDICIAMENTO DE PADRE AIRTON FREIRE E FUNCIONÁRIOS?
Os dois inquéritos concluídos são de denúncias feitas por duas vítimas, que acusaram o religioso e funcionários por estupro. Há ainda três inquéritos em andamento, de mais três supostas vítimas. Uma delas é um homem que disse também ter sofrido abuso sexual após supostamente ter sido dopado.
"Os relatos das vítimas merecem credibilidade. Todas essas mulheres e um homem, que não se conhecem, relataram de forma detalhada, segura, de forma emocionada. Demonstraram dor em relembrar os fatos. E não há nenhum indicativo de que estão inventando, fantasiando algo sobre um homem que, por elas, era como um homem santo", afirmou a delegada Andrezza Gregório, nesta quarta-feira (26).
Ela destacou que, além dos depoimentos de vítimas e testemunhas, provas técnicas também foram levadas em consideração no indiciamento.
Padre Airton Freire, que é fundador da Fundação Terra, foi preso preventivamente no dia 14 de julho em Arcoverde, no Sertão de Pernambuco, durante uma operação que também cumpriu mandados de busca e apreensão. Ele estava numa cela isolada do Presídio Advogado Brito Alves.
No último sábado (22), após passar mal, o religioso foi encaminhado para o Hospital Memorial Arcoverde e, no dia seguinte, para o Hospital Português, no Recife. O estado de saúde não é informado, mas a defesa alega que ele teve um princípio de acidente vascular cerebral (AVC) e que está em tratamento na UTI.
Os dois funcionários que tiveram as prisões decretadas também foram procurados no dia 14 de julho, mas não foram encontrados.
POSSÍVEIS VÍTIMAS DE OUTROS ESTADOS
Uma força-tarefa formada por cinco delegadas está investigando o religioso. A polícia confirmou que há informações de outras possíveis vítimas, inclusive de outros estados.
"A gente precisa ainda apurar, realizar oitivas, para poder definir qual o tipo penal que vai se enquadrar o caso dela. (Avaliar) se está prescrito, se não está prescrito, para, realmente, instaurar o procedimento", disse a gestora do Departamento de Polícia da Mulher (DPMul), Fabiana Leandro.
"Havia caravanas de outros estados para Pernambuco (para visitarem a fundação). Por isso, podem ter vítimas de qualquer lugar do País", completou a delegada Morgana Alves.
Por isso, a polícia divulgou um número exclusivo para que as possíveis vítimas ou testemunhas possam entrar em contato e passar informações. O número do Disque-Denúncia do DPMul é o (81) 9.9488.7082.
Fabiana destacou que as vítimas de outros estados podem ir em qualquer delegacia do País e que os policiais vão repassar os casos à Polícia Civil de Pernambuco.
As investigações concluídas e em andamento também estão em análise de outra força-tarefa, formada por promotores designados pela Procuradoria-Geral de Justiça.
VEJA COLETIVA DA POLÍCIA SOBRE PADRE AIRTON FREIRE:
PRIMEIRA DENÚNCIA CONTRA PADRE AIRTON
A polícia começou a investigar padre Airton Freire após registrar uma denúncia de estupro feita pela personal stylist Sílvia Tavares de Souza, de 53 anos, contra o religioso e o motorista Jailson. O crime, segundo a mulher, teria sido praticado durante um retiro espiritual em agosto de 2022.
Ela disse que mantinha uma relação próxima com o padre e o tinha como uma figura paterna e santa. Mas que a admiração deu lugar ao pavor após ser violentada pelo motorista por ordem do padre, que teria presenciado tudo.
Na ocasião, ela teria sido chamada pelo religioso até a casa dele para realizar uma massagem. Durante a atividade, ela teria percebido que Airton estava sem roupa e decidiu interrompê-la.
"Quando pulei da cama, o motorista colocou a faca no meu pescoço, me deu uma gravata e disse 'quieta que ninguém vai morrer'", contou.
Segundo Sílvia, o padre ordenou o estupro enquanto ele se masturbava.
A polícia não deu informações sobre o caso da outra vítima - relacionado ao segundo inquérito concluído.
PADRE AIRTON FOI AFASTADO DAS ATIVIDADES
Desde o final do mês de maio deste ano, padre Airton Freire estava suspenso das atividades religiosas, após publicação de decreto da Diocese de Pesqueira.
O documento assinado pelo bispo que comanda a Diocese, Dom José Luiz Ferreira Salles, determinou a suspensão do "Uso de Ordem", ou seja, a proibição de que o padre Airton presida publicamente ritos religiosos (sacramentos). A exceção é para celebrações eucarísticas privadas com até três fiéis.
O decreto pontuou que a decisão foi tomada "considerando advertências anteriores e a gravidade dos fatos atualmente denunciados com investigação na esfera estatal e eclesiástica em andamento". Além disso, citou o cumprimento do dever, "para o bem da Igreja com a finalidade de prevenir os escândalos e garantir o curso da justiça".
O documento ainda destacou que a medida é válida a partir da publicação e notificação do padre até o término do procedimento penal. E que o não cumprimento das medidas pode significar desobediência e pode implicar em outras medidas canônicas.