RESENHA

Livro que deu origem à série Modern Love é uma antologia que revela o amor em todas suas formas

Coluna do The New York Times que existe desde 2004, Modern Love, se tornou um cultuado espaço em que pessoas anônimas contam suas histórias de amor. O livro que deu origem à série da Amazon Prime acaba de ser lançado no Brasil pela Rocco

Valentine Herold
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Valentine Herold
Publicado em 30/04/2020 às 16:50 | Atualizado em 20/09/2020 às 14:58
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Anne Hathaway vive a advogada bipolar Lexi - FOTO: Divulgação

A temática do amor não é nova nem original; na verdade já foi exaustivamente abordada em letra de música, filme, série, exposição, livro, peça teatral, novela e todos os produtos culturais imagináveis. Mas ainda assim, há séculos ela continua despertando nossa curiosidade e sendo fonte inesgotável de boas histórias. Quando as narrativas amorosas são reais e contadas por quem as viveu, o encanto e a conexão para quem as lê é ainda maior. Assim são as 42 crônicas reunidas na antologia Modern Love (304 pgs., R$ 54,90), que acaba de ser lançada no Brasil pela editora Rocco.

O título do livro é homônimo à coluna do The New York Times idealizada pelos editores Daniel Jones, Trip Gabriel e Cathi Hanueur em 2004. Desde então, cerca de 8 mil pessoas confiam suas histórias mais loucas e mais banais (se é que há alguma banalidade no ato de amar alguém) a cada ano.

A popularidade da coluna foi crescendo e se desdobrando em outros produtos: em 2007 uma primeira edição do livro é publicada no Estados Unidos, em 2016 o jornal lançou o podcast Modern Love (com narração de atores e atrizes famosos, como Jake Gyllenhaal, Kate Winslet, Sandra Oh) e, em setembro de 2019, um nova edição do livro foi lançada.

Mas até a versão traduzida para o português finalmente chegar ao Brasil, oito das histórias publicadas na agora cultuada coluna ganharam uma releitura cinematográfica pela Amazon Prime. Modern Love - a série - estreou em outubro passado escalando um elenco que nem o indivíduo mais descrente no amor pode colocar defeito: Anne Hathaway, Dev Patel, Catherine Keener, Tina Fey, John Slattery, Julia Garner, Andrew Scott ou ainda Jane Alexander, só para citar alguns, protagonizam oito capítulos emocionantes, de meia hora cada, baseados nas histórias reais publicadas ao longo dos anos. Uma segunda temporada já foi confirmada pelo serviço de streaming e inicialmente seria lançada ainda este ano, mas o avanço da pandemia do coronavírus deixou a data incerta por enquanto.

Livro vs Série

É inevitável comparar as histórias originais com suas adaptações. Leitores mais apegados podem se decepcionar um pouco com as mudanças tomadas pelos roteiristas, mas incrivelmente nem mesmo as maiores delas se afastaram da essência dos relatos reais. A série é também uma declaração de amor à cidade de Nova York que, em sua diversidade, acolhe esses encontros e desencontros amorosos, se tornando também uma protagonista.

O livro é dividido em quatro partes: Em Algum Lugar Lá Fora, Acho que eu Amo Você, Segurando Firme nas Curvas e Assunto de Família. Na primeira parte estão reunidas as histórias de paqueras, dates, frustrações e aprendizados vividos na solteirice; na segunda o amor em seu aspecto talvez mais clichê e atemporal no sentido romântico, entre casais.

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Livro Modern Love acaba de ser lançado no Brasil pela editora Rocco - Divulgação

Já a terceira parte reúne algumas das narrativas que mais têm a ensinar sobre o amor maduro, os momentos difíceis pelos quais todo casamento passa. Alguns continuam após as fases críticas e outros não, mas o importante aqui é como a trajetória é encarada. Por último o leitor vai encontrar o amor em sua forma mais incondicional, histórias emocionantes protagonizadas por pais e filhos.

Capítulos de todas as quatro partes estão presentes na série, alguns foram adaptados até nos mínimos detalhes de uma roupa ou de uma frase, como em Quando o Porteiro É Seu Melhor Homem, Renovando Pra Manter o Jogo Vivo, Quando o Cupido é Uma Jornalista Curiosa ou Me Aceita Como Eu Sou, Quem Quer Que Eu Seja.

Este último é um delicado olhar sobre uma mulher bipolar em busca do amor. Anne Hathaway dá vida de forma muito respeitosa e ponderada à advogada Lexi e suas mudanças de humor. Nos momentos de euforia e enorme confiança em si, sua vida parece um musical da Brodway, mas quando a tristeza profunda chega sem pedir licença, até atender um telefonema para justificar sua falta a um encontro marcado com tanta expectativa fica impossível.

Os episódios No Hospital, Um Interlúdio de Clareza e Então Ele Parecia um Pai, e Era Só Um Jantar, Certo? mantiveram aspectos importantes do livro mas investiram em grandes mudanças que funcionaram bem em certos momentos e em outros resultaram no efeito inverso: a falta de nuances estagnou um pouco os enredos. Um Mundo Só Pra Ela, sétimo e penúltimo, é provavelmente o episódio que mais se afastou da história original mas é também um dos melhores desta temporada.

Se no livro o foco é como o filho adotivo de um casal gay e este próprio casal se relacionam com a mãe biológica, uma jovem sem teto por opção que viaja pelo país levando uma vida livre de amarras, a série preferiu concentrar a narrativa nas semanas finais da gestação, quando os três passam a morar juntos temporariamente.

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Cena do episódio Um Mundo Só Pra Ela, um dos melhores desta temporada - Divulgação

Por último, a bela história de amor de um casal que se conheceu na velhice é trazida com A Corrida Fica Mais Gostosa na Volta Final. Alguma surpresas foram guardadas para este fim em que todas os personagens anteriores voltam a aparecer em momentos e lugares distintos da cidade, em cenas até então não contadas em seus capítulos.

De uma forma geral, se comparada ao livro, a série aborda o amor a partir de um olhar mais brando, exaltando todo o heroísmo que existe nas relações amorosas. O que não é uma mentira, é apenas um dos infinitos recortes possíveis sobre relacionamentos. Mas quando os créditos sobem e as lágrimas secam, as dificuldades e as dúvidas da vida real ainda estão presentes.

E um dos diferenciais do livro é justamente esse: revelar 42 vivências mais cruas sobre as dores e as delícias de amar e ser amado, desmistificando até a noção de certo e errado. Ter se apaixonado e vivido algo valioso com outra pessoa, mesmo que não tenha durado, não é uma história de amor que deu errado, mas sim que deu certo por um determinado período de tempo.

Permanece ao final da leitura de todos os textos umas das poucas certezas que existem no amor: que ele é extraordinário em toda sua banalidade e que a necessidade de vivê-lo intensamente é o que nos faz demasiadamente humano.

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