LEI ÁUREA

Presidente da Fundação Palmares provoca movimento negro ao celebrar a Princesa Isabel

Sérgio Camargo, através da instituição ligada ao Governo Federal, chamou Zumbi dos Palmares de "falso herói" e questionou a consciência negra

Valentine Herold
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Valentine Herold
Publicado em 13/05/2020 às 18:36 | Atualizado em 13/05/2020 às 19:29
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Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares - FOTO: Reprodução

Atualizada às 19h30

Em 1888, neste dia exato de 13 de maio, era assinada pela princesa Isabel a Lei Áurea, que marcou a  abolição da escravatura. Hoje, 132 anos depois, existem muitas críticas por parte do movimento negro a respeito da celebração desta data e do verdadeiro protagonismo do feito. Mesmo ciente destas problematizações, Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares, escolheu não apenas comemorar este dia como realizou uma série de postagens e publicações de artigos no site oficial da instituição, em que critica Zumbi dos Palmares e a própria consciência negra. Vale lembrar que a fundação está ligada à Secretaria Especial da Cultura, pasta do Ministério do Turismo.

Camargo é uma figura polêmica que já chegou a chamar Zumbi de "falso herói". Ao escolher exaltar o 13 de maio ele provoca o movimento que prefere celebrar o 20 de novembro, nascimento de Zumbi e Dia da Consciência Negra. Nas postagens das redes sociais da Fundação Palmares, a postura da instituição foi duramente criticada pelos internautas.

"Triste demais ver o que se tornou essa instituição. Vem sendo demolida em meio às ordens de um lunático, a construção de um povo que lutou e luta pra ter sua história contada da forma certa", escreveu um internauta nos comentários do Twitter.

Em resposta às postagens de homenagem à princesa Isabel, várias pessoas postaram fotos de personalidades negras que já faleceram, como a antropóloga Lélia Gonzalez, o escritor Abdias do Nascimento ou os mestres jongueiros Tio Mané e Tia Maria do Jongo.

Para a militante Bernadete Lopes, que ocupou o cargo de diretora de Patrimônio Histórico da Fundação Palmares durante a gestão de Gilberto Gil no Minc, Camargo não representa a população negra. “A gente passou a a vida inteira tentando desconstruir esse discurso que a abolição só aconteceu por bondade da princesa Isabel, como se antes da assinatura da Lei Áurea não houvesse tido nenhuma luta pela libertação das pessoas escravizadas. Isso é absolutamente mentira", pontua.

"O 13 de maio é uma data para reflexão, que aponta que a abolição é inacabada, e não um motivo para celebrar. Sérgio Camargo acaba negando a história de vida e de luta de muitas negras e muitos negros que inclusive morreram por esta causa. A postura ele é abominável.”

Zezé Motta: "Lei Áurea veio, mas veio sem nenhuma reparação moral ou econômica"

A atriz Zezé Motta também se posicionou contra e explicou de forma muito didática os porquês através de um texto no seu Facebook. "A princesa e seu feito são reverenciados nos livros escolares de história e a data, Dia da Abolição da Escravatura, foi instituída no calendário oficial como algo a ser comemorado. Mas para o movimento negro não há o que festejar", escreveu.

Na sequência, Zezé Motta prosseguiu: "Depois de muita luta das negras e negros do Brasil colônia, como a do Quilombo dos Palmares e a Revolta dos Malês, por exemplo, a Lei Áurea veio, mas veio sem nenhuma reparação moral ou econômica".

"Muitos permaneceram na própria fazenda onde trabalhavam como escravos por não ter para onde ir, outros, largados à própria sorte, passaram a ser marginalizados e discriminados, dando início às mazelas que combatemos até hoje", continuou.

Gestão Camargo

Em março deste ano, Sérgio Camargo extinguiu sete órgãos colegiados da Fundação Palmares além de ter exonerados funcionários. Deixaram de existir o Comitê Gestor do Parque Memorial Quilombo dos Palmares, a Comissão Permanente de Tomada de Contas Especial, o Comitê de Governança, o Comitê de Dados Abertos, a Comissão Gestora do Plano de Gestão de Logística Sustentável, a Comissão Especial de Inventário e de Desfazimento de Bens e o Comitê de Segurança da Informação.

A chegada e permanência de Sérgio Camargo ao posto de presidente da Fundação Palmares foi bastante conturbada. Indicado pelo ex-secretário da Cultura Roberto Alvim em novembro de 2019, sua nomeação chegou a ser suspensa por uma ação cívil pública protocolada pela Justiça do Ceará no mês seguinte devido justamente a seus comentários de cunho racista. Entretanto, em fevereiro deste ano, o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, derrubou a decisão e Camargo voltou ao cargo.

Desde que Regina Duarte assumiu a pasta da cultura do governo Bolsonaro, a secretaria de o presidente da Fundação Palmares vêm tecendo críticas um ao outro. Ela já chegou a chamá-lo de “ativista” de forma pejorativa em uma entrevista ao Fantástico.

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