Discussões

'Afroficção': oficina virtual discute participações raciais na ficção

Ministrada pela curadora, cineasta e pesquisadora Anti Ribeiro, a oficina Afroficção é realizada desde 2017 e agora ganha versão online; saiba mais

Rostand Tiago
Cadastrado por
Rostand Tiago
Publicado em 19/06/2020 às 16:59 | Atualizado em 19/06/2020 às 17:32
@aluizafotografia/Divulgação
A pesquisadora Anti Ribeiro traz versão digital da oficina Afroficção - FOTO: @aluizafotografia/Divulgação

Pautada em trocas sobre incômodos e novas perspectivas em relação à corpos dissidentes, em especial os racialmente dissidentes, a oficina Afroficção, idealizada pela pesquisadora, cineasta e curadora Anti Ribeiro, é realizada online no fim deste mês. A iniciativa já passou por festivais locais e em diversos estados, buscando observar a ficção, no cinema e em outras linguagens, como arma para combater estereótipos e representações problemáticas em relação a população negra e racializada. O novo ciclo do projeto começa no próximo dia 30 e suas inscrições já estão abertas. Ao todo, serão quatro módulos que se relacionam, mas também funcionam separadamente, permitindo que o público possa optar pelo curso completo ou por ter acesso a um ou mais deles.

A Afroficção começa em 2017 já a partir de uma confluência de incômodos vividos por Anti. Na universidade, não via professores que se colocavam como racializados e a visão eurocêntrica sobre o cinema seguia firme. Já nos festivais, o corpo negro até chegava a ser mote do que passava na tela, entre formas potentes e problemáticas, mas o fazer e a produção não partia de quem vivesse sob uma perspectiva de raça. São apenas alguns pontos que estimularam sua pesquisa.

@theresais/Divulgação
A oficina 'Afroficção' já passou por diversos festivais e estados - @theresais/Divulgação

"Percebendo que essas instituições começavam a abordar essas narrativas de raça, ao mesmo tempo em que ela não abre espaço para que essas pessoas racializadas estejam no pensamento e na prática, sem criar espaços para que elas habitem essa criação. Minha pesquisa começa aí, percebendo isso no âmbito da ficção, algo que tenho afinidade desde sempre. Comecei a pensar que é potente lançar e buscar ideias que não estão disponíveis para a gente, ao mesmo tempo pensar o que as realizadoras racializadas, que não estão ganhando visibilidade, já estão propondo dentro da ficção", explica. A Afroficção já passou por Aracaju, Fortaleza e Natal, além de duas realizações no Recife.

Novo momento

Durante a pandemia, Anti reformulou a oficina para ser oferecida virtualmente. A primeira empreitada virtual foi realizada ainda no mês passado e agora vem o segundo ciclo. Sem modelo atual é dividido em quatro etapas: Memória e diáspora, ficção como arma de guerra, afrofuturismo e afropessimismo. Ela é desenvolvida não apenas com exposição de materiais e bibliografias, mas sobretudo nos diálogos. "A metodologia dela eu vejo como um lugar de constante aglutinação, porque as pessoas que participam acabam contribuindo muito para essa formação. Eu parto dos filmes e das obras para buscar o conteúdo bibliográfico, que vai pensar sobre raça ou outros temas", afirma.

Nessa movimentação, os cânones artísticos e teóricos são utilizados em reflexões que se alimentam deles, mas também podem derrubar seus discursos. A exposição teórica é ligada aos filmes que fazem parte da pesquisa, grande parte deles sendo produzidos por pessoas racializadas. "Eu parto do lugar desses filmes não necessariamente para concordar, discordar ou dar alguma resposta, mas pensar o que está sendo proposto por essas pessoas racializadas como uma base para uma produção própria", elabora a pesquisadora.

São conversas e exposições que vão passar por nomes que vão do psicanalista Carl Gustav Jung ao diretor norte-americano Jordan Peele, contemplando ainda o professores e pesquisadores locais como Mahomed Bamba, João Carlos Rodrigues e Kênia Freitas. "Nesse processo, em especial afrofuturismo e afropessimismo, a gente parte de muitos autores dos Estados Unidos, porque os termos são cunhado lá para depois serem apropriados. Eu acabo tendo que traduzir muitos textos e tendo contato com uma literatura que ao mesmo tempo é questionada justamente por vir de lá. Sempre esse conflito de abordar os autores e não deixar de fazer críticas”, afirma Anti.

E nesse encontro dos incômodos, Anti vê uma postura bastante científica, no sentido de motivar o estudo de uma estrutura a qual considera desumanizadora em relação a artistas racializadas. A obrigação de colocar essas pessoas para estarem sempre colocando a questão da raça unicamente, em especial a dor, em suas expressões é um desses incômodos. Rótulos vindo de pensamentos também provocam outro incômodo. "O afrofuturismo, por exemplo, vem dos Estados Unidos e é facilmente comprado como uma etiqueta. Um filme afrofuturista, um artista afrofuturista. É algo que pode levar a um esvaziamento ao cunhar esses termos para pessoas que estão vindo com ideias além disso. A gente pode beber dele, mas não que não resumam as experiências", discorre Anti.

A solicitação de inscrição para a oficina devem ser enviadas para o e-mail [email protected]. Os valores são: R$ 30 para um módulo, R$ 50 para dois, R$ 75 para três e R$ 100 para o curso inteiro. Os encontros serão realizados por meio da plataforma Zoom nos dias 30/06, 02/07, 07/07 e 09/07, sempre às 16h. As inscrições seguem até acabar as vagas.

@theresais/Divulgação
A oficina Afroficção já passou por diversos festivais e estados - FOTO:@theresais/Divulgação

Comentários

Últimas notícias