Simultaneamente na programação do Cinema da Fundação Joaquim Nabuco e no catálogo da Netflix, o filme Alice Júnior é mais uma prova de um cinema teen brasileiro cada vez mais consolidado e diverso. E o premiado longa do paranaense Gil Baroni se insere numa postura de reivindicação de um imaginário de drama juvenil simples e didático. Por mais que esses adjetivos estejam ligados à um panorama de saturação e esgotamento dessa produção específica, Alice Jr. consegue se afastar disso tudo centrar sua narrativa em uma pessoa que teve essas história, por mais banais que possam parecer, negadas dentro do panorama dos longas brasileiros recentes.
Alice Júnior (Anne Mota) é uma adolescente trans que leva sua vida no Recife até o seu pai precisar ser transferido por motivos profissionais para uma cidadezinha no Sul do país, pouco depois de ser finalista de um reality para jovens modelos. Por lá, ela retoma sua vida escolar em um colégio católico e conservador, onde sua presença é motivo de estranhamento e ataques. Mas também há espaço para novas amizades, autodescobertas e conflitos adolescentes, da expectativa pelo primeiro beijo à sensação de pertencimento no mundo, que ganha outra dimensão na figura de Alice.
A direção de Baroni decide então mergulhar em um vórtice de imagens e sons jovens (ou os quais julga jovens) como que em movimento de recuperar um tempo perdido para histórias de adolescentes que nunca contemplaram corpos como os de sua protagonista. Ele se utiliza de um arsenal extenso de estilização. Animações intervêm na imagem, videochamadas ocupam as telas e uma certa estética youtuber frenética também ganha espaço, além de uma presença frenética de música pop brasileira. Há sim um peso na mão na hora de construir toda essa atmosfera vibrante e jovem na produção, o que acaba resvalando na construção de diálogos e eventos.
É um exagero que até deixa a sensação de ser uma tentativa artificial de se aproximar de uma linguagem jovem, mas consegue ser transformado em um certo sentimento de urgência no contar daquela história. Um dos motivos para isso é o trabalho de Anne Motta como protagonista. Ela incorpora muito bem uma certa maneira youtuber de se comunicar para dentro de uma realidade cotidiana. Uma atuação que consegue empurrar frases de efeitos memísticas preservando seu caráter perfomático, mas sem fazê-lo soar deslocado do dia a dia. O que também é capaz de dar vazão aos aspectos mais pedagógicos sobre sua vivência.
E é muito bonito de observar nessas articulações uma autoconsciência em busca de dar essa história simples para diversas Alices Jr. O filme não nega as violências as quais a adolescente trans está sujeita, mas se esforça em logo também injetar uma doçura e inocência que parecem dar muito mais à tônica principal do longa. É bom ver o cinema nacional se esforçando para dar contas das mais diversas juventudes que o país abriga.
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